Aviso: Esta transmissão tem como objetivo divulgar a minha pesquisa a respeito do sentido da filosofia cristã chamada Monadofilia. Prefiro me dedicar a esta investigação com todas as minhas capacidades, inclusive interagindo com as pessoas interessadas nos temas trabalhados, do que atuar na edição ou divulgação desse material. Deixo esse outro tipo de trabalho àqueles que se achem mais dispostos e capacitados do que eu, de modo que este conteúdo está liberado para edições e reproduções à vontade, desde que seja expressamente mencionada a fonte. Participações na transmissão ao vivo são abertas e bem-vindas.
#00 Preâmbulo aos comentários das leituras bíblicas: De Gênesis 1 a 8 revelam-se: (1) a obra divina de criação da luz e separação das trevas que simboliza a produção da liberdade das criaturas para que estas decidam pelo aceite ou rejeição da Graça; (2) a decisão de Adão de rejeição do Amor de Deus em troca da Gnose para possuir o poder sobre o mundo e trocar a imortalidade com Deus pela descendência através das Obras da Carne; (3) a decisão de Caim de abraçar o outro braço da dialética gnóstica, desconfiando do Criador como Demiurgo, e deste mundo como uma prisão para o decaimento da substância espiritual na matéria; (4) a decadência dos filhos de Adão e Caim até o cúmulo das maldades sobre o mundo, que leva ao momento do Dilúvio e a história de Noé. Toda a interpretação dos mitos narrados nestes livros até o período de Noé parte da revelação que Jesus trouxe a respeito da ação diabólica na história, pois Satanás é acusado como o Pai da Mentira e mentiroso desde o princípio, isto é, desde o Gênesis.
#01 (Gênesis 8:21) “Os desígnios do coração do homem são maus desde a sua infância.” Declaração de Deus feita após o primeiro ritual religioso de sacrifício de sangue feito por Noé ao final do Dilúvio, depois da sua saída da Arca, a nova Aliança, cujo símbolo é o Arco-Íris, afirma a disposição divina de não mais resetar a humanidade ao estado equivalente ao de Adão depois da Queda e antes da geração de sua nova descendência, isto é, com a possibilidade de por si aceitar o encargo do Decreto de Gen 3 sem a interferência de elementos sociais ou culturais. Esta declaração, que poderia ter sido feita desde sempre, e que tem a função de evidenciar a santidade de Jesus, aquele de quem o Pai afirmará que é o seu “filho querido, em quem tenho prazer”, necessitava de corroboração pela ação humana, como sempre, para que a Justiça divina se mostre perfeita. Não fosse o juízo a partir destes fatos, sempre se poderia alegar que outras pessoas mais dispostas poderiam decidir melhor que Adão. Noé andava com Deus, vivia separado do espírito do mundo, e foi obediente. Quando por si pode finalmente viver livre da defesa contra a malícia do mundo, ele a redescobre em no rito de conexão com o Ouroboros, possivelmente motivado pela vontade carnal de multiplicação da sua descendência sobre a Terra. Noé também não consegue aceitar o Decreto de Gen 3. Os desígnios maus do coração humano são naturais, instintivos, e buscam a salvação por seus próprios meios sem a exclusiva busca da Graça divina. O que para Adão foi um ato inaugural da malícia, em seus descendentes se tornou uma inclinação natural derivada do psiquismo contrário à liberdade espiritual. Mesmo homens com relacionamento consciente com Deus, como Noé, são pressionados e submetidos pela tentação espiritual inaugurada pelos ancestrais. É importante lembrar que o Psiquismo é um espírito contrário ao dom do Discernimento. Este foi o dom do qual Noé teria declinado, e de sua decisão decorreu a continuidade da desobediência dos seus próprios descendentes, e a reconstrução da civilização da Usurpação com destino ao Anticristo e ao fim do mundo. Pode-se alegar uma dificuldade pela suposta contradição entre a ideia de limpeza de um mundo, da preservação da natureza como um todo, e do desejo divino da consumação do Decreto de Gen 3. Por que Deus teria determinado o Dilúvio e a restauração do mundo, se isso não fosse para a consecução do plano de multiplicação das Obras da Carne através de Noé e de sua família? A resposta é simples, monadologicamente: o mundo e a natureza não existem por si próprios, mas somente como o cenário da agência moral das mônadas criadas, mutuamente representado pelos intelectos de cada uma delas. O que o Dilúvio e a restauração do mundo significaram foi a mudança do ambiente para que Noé e sua família não precisassem mais se determinar em contraste e separação com a malícia alheia. Todas as coisas poderiam ser refeitas de acordo com um ideal muito superior, se Deus fosse reconhecido na sua autoridade como quem decretou a morte porque planejou a Ressurreição. Assim, este mundo e esta natureza restaurados pelo Dilúvio não foram nem recuperados ao nível preternatural da época de Adão antes da Queda, e muito menos foram elevados ao status da novidade ideal do futuro paradisíaco. Era necessário apenas que Noé se mostrasse filho e imitador de Adão, para que então Jesus Cristo fosse reconhecido como o Filho de Deus, aquele que obedece o Pai porque ama a sua Vontade. Noé sai da Arca como Adão saiu do Éden: livre para aceitar ou rejeitar o Decreto de Gen 3. É viável que o Deus verdadeiro tenha revelado a essência do Pecado Original no contexto desta passagem, e tenha deixado Noé e sua família livres para a conversão e confiança na Salvação que mais tarde nos seria revelada como a Ressurreição. Mas isto custaria a perda da descendência carnal e do domínio do mundo, etc., ou seja, de tudo aquilo que Adão também não soube abrir mão, e que só Jesus rejeitaria perfeitamente no deserto. Não querendo alcançar essa liberdade, Noé se deprime, se embriaga, etc., pois fica triste com a revelação do significado da Religião de Adão na qual ele próprio confiou. E é nessa condição que seu filho Cam o descobre no segredo da desobediência, mais ou menos como aconteceu com Caim, e tanto como ocorreu com o primogênito de Adão, Cam também será amaldiçoado, junto com toda a sua descendência.
#02 (Neemias 9:34) “Nossos reis, chefes, sacerdotes e nossos pais não seguiram tua Lei, nem prestaram atenção aos teus Mandamentos.” O drama da desobediência é revelado na acusação daqueles que teriam a maior obrigação de conhecer e seguir as instruções divinas, não só para si, mas também para aqueles por sobre os quais se tornavam poderosos e responsáveis tutelares. Obrigação esta tão maior quanto for grande a posição de poder que cada um se arroga. Quem se levanta como rei, chefe, sacerdote ou pai tem o dever, diante de Deus, de representar aos seus subordinados a verdade divina sobre a qual eles próprios deveriam se submeter. Mas não fazem isso, e fazem na verdade o contrário, a sua própria vontade à revelia do ordenamento divino. Esse Poder humano usurpa, portanto, a autoridade de Deus. Mas qual é o teor dessa Lei e desses Mandamentos? Não poderia ser de uma Religião que levou ao próprio declínio desse povo. Se fosse boa a Religião de Aarão, ou a Realeza de Davi e de Salomão, como esses seus descendentes teriam caído tanto? Bom era o alerta de Moisés que testemunhava contra a obstinação do povo, bem como a advertência dos profetas, principalmente Samuel, que destacava a autoridade exclusiva de Deus. Neemias identifica o mal da desobediência, mas até onde pode enxergar a raiz do problema? Sem Jesus Cristo como o Novo Adão, a consciência desta época só poderia alcançar até um ponto limitado. Talvez ao tempo das virtudes de Samuel e Davi. Mas o engano do Ouroboros já tinha confundido ancestrais muito mais antigos, como Moisés e Abraão, e mesmo estes talvez jamais atinassem para a natureza da traição do próprio Adão. Neemias não podia imaginar o tamanho do problema, mas já sabia que os poderosos tinham falhado com Deus. Já era suficiente que as leis e mandamentos conhecidos à época fossem obedecidos, isto é, pelo conhecimento daquilo que havia sido trazido por Moisés, que é uma relação sintética do amor a Deus e ao próximo. Ora, o que competiu com essa instrução divina? Foram os mandamentos humanos provindos justamente dessas posições de poder, sob uma fingida relação com Deus. A passagem mostra a perspectiva de alguém que se descobre traído por aqueles que tinham responsabilidade objetiva de obedecer e representar os ordenamentos divinos. Qualquer um de nós pode e deve se identificar com a descoberta de Neemias, ainda mais depois da Revelação cristã, pois o Evangelho foi traído por todas essas autoridades que dependem de mentir e ocultar a verdade da liberdade da Boa Notícia para manter o seu poder. Quem confia indiscriminadamente nas autoridades nominais sem considerar o risco aqui denunciado o faz por sua própria conta e risco.
#03 (Jó 15:15) “Como pode ser puro ou inocente o nascido de mulher? Até em seus Santos Deus não confia, e os Céus não são puros a seus olhos. Quanto menos o homem, detestável e corrompido, que bebe como água a iniquidade! Se até a própria lua não brilha e as estrelas não são puras a seus olhos, quanto menos o homem, essa larva, e o filho do homem, essa abominação?” A natureza das Obras da Carne é má, porque parte de uma vontade má de usurpar a exclusiva autoridade criativa de Deus, e o ser das coisas é determinado na sua essência pelo seu sentido espiritual, isto é, por aquilo que significa diante da santidade divina. Jó sabe que não pode disputar a sua qualidade, e nem a da sua espécie, diante de Deus. A vida e todos os bens da vida são um dom puro de Deus. Assim como a Providência pode ceder a Graça a quem quiser, pode retirá-la também ao seu dispor, sem dever satisfação ao homem. Deus só deve satistação a Si mesmo, isto é, à sua Santidade que o leva a fazer o que é sempre mais perfeito. Diante de amargos sofrimentos, a sabedoria de Jó ilumina o juízo humano sobre a única fonte do Bem, que é a vontade de Deus. O Criador nada deve à Sua Criação. Mas o testemunho de Jó diferencia e qualifica uma humanidade já derivada de uma vontade inferior. Por isso não fala de Adão, como não poderia falar de Jesus Cristo, pois ambos foram produzidos diretamente pela vontade divina, como geração simpliciter, não mediada pela vontade humana. Isto nem mesmo no caso da Virgem Maria na geração de Jesus como Filho do Homem, porque ela disse ao Arcanjo Gabriel que fosse feita nela conforme a vontade de Deus, e não como sua própria. Ele fala dos nascidos de mulher, ou seja, de uma geração secundum quid mediada por uma vontade secundária e inferior à divina, e os compara com criações mais excelentes de Deus. Nessa comparação Jó dá seu testemunho sabendo que mesmo as criações puramente geradas por Deus não podem ser boas diante de Dele o suficiente para se justificarem por si mesmas. Por isso até Jesus com muitíssima razão e justiça afirmou várias vezes que enquanto Filho do Homem ele não fazia a sua própria vontade, mas a do Pai, e que não tinha vindo em seu próprio nome, mas no nome de Deus, etc. Ora, se nem as criações derivadas diretamente da vontade divina podem se justificar por si mesmas, muito menos o podem as gerações provindas da desobediência e da usurpação. Tudo isso serve para a renúncia à tolice das disputas com Deus a respeito do Bem. Jó não sabia que Satanás precisava ser humilhado para o benefício de todos nós, e nem que seria por Jesus Cristo que a verdadeira Salvação seria revelada definitivamente. Mas lhe bastava saber que com Deus não há disputa possível, e que a confiança na bondade divina sempre será a recompensa mais plena e justa pela fidelidade daquele que é Santo por nós. A pequenez e fragilidade do homem convidam a grandeza e a fortaleza de Deus. Nós vemos todos esses temas serem retomados no incentivo de Jesus à Igreja de Filadélfia. Mas no Livro de Jó já havia um testemunho suficiente. Os amigos de Jó presumiam que seria possível, pelas fórmulas religiosas, obter poder sobre Deus na forma de garantias, e que deste modo os sofrimentos de Jó deveriam ter origem em sua conduta, e também poderiam ser remediados pela ação humana. O sentido e a grandeza da Obra de Deus e o Mistério da Cruz escapam a essa mentalidade mercantilista e imediatista que ignora a obra divina. Algo muito maior está sendo produzido como um testemunho para o futuro até o Fim dos Tempos. Jó resistiu ao pensamento religioso dos amigos e à idiotice de sua mulher, e assim nos deu a conhecer uma sabedoria superior que fosse digna da Obra de Deus. E da mesma forma, quando hoje confiamos em Deus por pura gratuidade no uso do dom da fé e da vida na Presença, damos um testemunho válido para o Dia do Juízo para sempre.
#04 (Jó 28:28) “Viver na Presença do Senhor, eis a Sabedoria; fugir do Mal, eis a inteligência.” O que faz a mônada criada? Ela percebe a si própria por reflexo, isto é, experimenta a Glória da Mônada Incriada através da sua própria imagem e semelhança. Isto é tudo o que ela faz, e tudo o que ela deve fazer. Sua vontade mais direta e pura reflete esse desejo. E sua liberdade só serve para escolher este destino. Nós somos como replicadores da felicidade divina. A consciência dessa realidade é o que se chama teologicamente de Temor de Deus, ou de vida na Presença. Não há maior sabedoria à disposição do ser humano do que esta. Ela desfaz as confusões da Idolatria e instala a consciência humana na realidade onde Deus é a matriz de todas as intelecções possíveis. Quem vive para si mesmo ou para o mundo, ou para qualquer coisa mundana, erra o único alvo legítimo do coração. A causa final da vida humana, ou de qualquer substância criada, é o Amor divino que provê a iluminação que garante a intelecção do Ser. É pela vida na Presença que se começa a entender e se aproximar da essência amorosa do Criador. E é através desta relação que aprendemos a fugir do mal, não no que este possa nos acarretar, pois isto é suportado com alegria e fortaleza pela Paixão, mas na participação nele, pois isso significa a traição contra o Amor divino e o afastamento da Presença. Como diria Sócrates, fazer o mal é muito pior do que sofrê-lo, e a razão disso é que a mônada que opta pelas trevas obscurece a si mesma, torna-se opaca perante a luz divina. É melhor sofrer todas as provações implicadas na fidelidade a Deus, do que sofrer a angústia de uma vida sem o brilho e o calor da luz divina. O Livro de Jó, o primeiro de Sabedoria, resume a experiência da vida espiritual e revela o que há de essencial, tornando por contraste todas as outras coisas como secundárias ou mesmo irrelevantes. Antes que se levante qualquer acusação de Solipsismo nesta abordagem, não se questiona a integridade da realidade enquanto manifestação representada perante o intelecto da mônada criada, e muito menos o sentido moral dessa manifestação, que seria o aspecto perigoso da abordagem solipsista. A vida na Presença se trata de integrar a multiplicidade dessas experiências todas à sua fonte ontológica, de modo que saibamos que sempre que experimentamos a bondade do Ser, experimentamos a bondade de Deus, e que afinal de contas tudo o que conhecemos sempre foi e sempre será Deus. Por outro lado, sem a noção da vida na Presença corremos o risco da Idolatria, de desligarmo-nos da Graça, com todas as consequências nefastas acarretadas por esse posicionamento.
#05 (Jó 32:8) “É o Espírito Santo que dá inteligência. Não é a idade avançada que dá sabedoria, nem a velhice a inteligência do que é justo.” O conhecimento da verdade é um dom divino provido pela Graça da participação na iluminação que Deus possui do seu próprio Ser no escopo do limite da Percepção da mônada criada. Toda verdade conhecida é uma revelação divina ao intelecto humano. Desde o Evangelho essa noção é clara, e ela continuou sendo cultivada no período patrístico, principalmente com a gnosiologia da iluminação divina com Agostinho. Mais tarde outras teorias epistemológicas voltaram a afastar o entendimento da origem espiritual da inteligência humana, e isso evoluiu de tal modo que hoje costuma soar estranha a alegação de que é Deus quem nos faz ver e entender a realidade. Ora, não só tudo é mantido no Ser pelo poder divino, mas tudo a ser conhecido é o Ser divino manifestado na Multiplicidade, através da Unidade do intelecto que participa do conhecimento que Deus tem de si mesmo. Isso explica não só o ser de todas as coisas externas à consciência humana, como o mundo e a natureza como um todo, mas também o ser subjetivo que percebe e compreende este seu entorno. Deus mantém no Ser os objetos e os sujeitos do conhecimento, por assim dizer, porque afinal de contas Ele é o percipiente e o percebido nas duas pontas do processo do conhecimento. O movimento do intelecto criado apenas percebe sucessivamente partes diversas do autoconhecimento divino que é eterno. Quem possui a Inteligência por si? Só Deus o pode possuir. Nós possuímos inteligência por participação nesse Logos divino. Esta passagem do livro de Jó foca especificamente no contraste entre a idéia psiquista e humanista a respeito de uma suposta sabedoria aprendida por experiência, contra o reconhecimento de que apenas Deus pode dar o conhecimento da verdade, especialmente a inteligência a respeito do que é a Justiça. A experiência da vida no mundo dá o conhecimento do espírito do mundo, ou seja, da malícia. Isso gera esperteza no sentido mundano, a capacidade de lidar com a Maldição e com o Poder. Mas isto sem a verdadeira liberdade da Justiça que só Deus pode dar a conhecer. É mais importante estar com Deus e aprender Dele o que é o bem, do que querer aprender falsidades com falsos mestres humanos. Não se nega que a experiência e a velhice trazem conhecimento, mas do que se trata este conhecimento? Do mal do mundo, da malícia, da escravidão da Maldição e do Poder, ou seja, no máximo traz a vantagem de uma certa prudência, mas isto é incomparável com os dons derivados da vida na Presença que revelam o Bem, a natureza essencial das coisas e da vida humana, etc. O verdadeiro mestre dos homens livres é Deus. Os sábios e anciãos humanos são mestres de escravos, pois tudo o que sabem ensinar é como se lidar com a Maldição e o Poder. Aquele que dá o testemunho do que é divino não fala por si, mas fala daquilo que recebeu da Graça divina, e sabe que isso não veio de sua experiência nas coisas do mundo. Foi assim que Jesus qualificou o testemunho do Apóstolo Pedro quando este declarou que seu mestre era o Filho de Deus: bendito és, porque não foi a carne e o sangue (isto é, a experiência no mal) que te revelou a verdade, mas o Espírito Santo de Deus.
#06 (Salmos 18:11) “Das trevas ele fez seu véu, sua tenda, de águas escuras e nuvens espessas.” Quem é Aquele que nem o Portador da Luz pôde iluminar e enxergar? A Luz da Luz, infinitamente transcendente, além de qualquer potência dos intelectos criados, de todas as gnoses, acessível apenas pela pureza de um amor confiante num Bem sem garantias. Mas não só é impossível que Deus se manifeste completamente a um intelecto finito, como é também inconveniente. Qualquer manifestação só pode ser parcial e incompleta, fazendo portanto injustiça à majestade e plenitude divinas. Mais, se Deus pudesse ser identificado com qualquer imagem, um produtor de falsidades poderia se apropriar dessa imagem para enganar. Que Deus não se mostre, que se oculte, garante a proteção de todos que aceitam a relação mais pura da confiança na essência divina. Por outro lado, como pode assentir livremente ao Amor divino uma vontade que fosse oprimida por um conhecimento parcial? Como pode ter o mérito de confiar no Bem um ser que não possuísse outra escolha? E como poderia ter escolha quem tivesse uma visão suficiente de Deus? Essa ocultação divina é, portanto, totalmente providencial: protege os amantes legítimos de qualquer engano por efeito de imagens, e garante o direito de liberdade de crer para todos os seres criados. Como a Liberdade da criatura é sagrada para a garantia da sua ligação espontânea e gratuita com o Amor divino, os conhecimentos a respeito da divindade são cada vez mais obscuros quanto mais próximos da sua fonte, mais ou menos como no simbolismo angélico os seres mais próximos da Presença devem se ocultar totalmente debaixo de seus pares de asas (os Serafins). Por outro lado, o conhecimento pleno do Ser divino significaria a aniquilação completa de qualquer criatura, a perda da identidade definida pelo limite determinado por sua forma substancial, como que tendo sua essência formal, ou esseidade, dissolvida em Deus. Que outra alternativa podemos encontrar para as idéias religiosas de “visão beatífica”, ou “união mística”? A questão é simples e clara: a criatura percebe o Criador de modo parcial ou total? Se é de modo parcial, justifica-se o posicionamento dimensional nas funções espaciais e temporais da Percepção, ou seja, a experiência de corpo, matéria, etc., e está justificada a criação divina originária, bem como a Ressurreição na experiência de um Corpo de Glória. Se, por outro lado, a visão de Deus deve ser total, então a forma substancial humana deve ser extinta, isto é, deve ocorrer a negação do Limite como materialidade e corporeidade, em prol de uma experiência intelectual pura análoga à angélica, mas que por ser desqualificada (afinal, perdida a forma humana, qual nos resta?) implica, na prática, no desejo de aniquilação pela absorção no Ser divino. Isto é, quem não aceita o Deus de Salmos 18:11 quer morrer, porque quer ser quem não pode ser: o próprio Deus. Suspeito, por outro lado, é o “deus” que não se esconde, que se pretende revelar de modo suficiente para a psique de uma criatura tão limitada como o ser humano. Confiável é o Deus verdadeiro que só pode ser confiado por uma confiança amorosa, e nunca dominado por nenhuma Gnose. Enfim, o Mistério é sagrado, necessário e conveniente.
#07 (Salmos 25:14) “O segredo do Senhor é para aqueles que vivem na sua Presença, fazendo-os conhecer a sua Aliança.” O segredo do Senhor é o seu Amor, a essência da sua natureza amorosa que só se dá a conhecer para quem não se recusa a confiar num Bem transcendente de forma livre. Não é irracional. Ao contrário, é supraracional, ou metaracional, de modo que jamais pode ser provado, mas é a realidade mais conveniente para quaisquer seres, dadas as suas naturezas amáveis e carentes reveladas pela sua forma substancial. Em outros termos: sendo inegável que a finalidade de todos os seres é o seu bem, e que este não possa ser produzido pela suficiência de nenhum destes desde um limite formal interno, é sumamente conveniente que sua perfeição seja realizada pela atuação de um bem exterior que tenha particularmente a qualidade da infinitude (o poder de doar ser sem perder ser), caso contrário a lógica desses seres seria absurda, gerando as contradições insolúveis do niilismo, da cacolatria, etc. Qual é, afinal, o mistério do Ser? A forma substancial das criaturas não revela a conveniência da sua amabilidade? A satisfação desse estado limitado não depende de um Poder fora da atuação daqueles que dele necessitam? Este segredo não é proibido, assim como as eleições e as predileções divinas não são injustas. A quem se dispõe, por boa fé, a um juízo livre de arrogâncias, através da Humildade, o caminho para acessar o segredo está aberto. A quem se disponha a receber a liberdade contra as mentiras da Idolatria, o segredo está pronto para ser revelado. Mas para quem se recusar a admitir os enganos da Presunção e da rejeição da vida na Presença, o segredo permanece velado. Como pode entender o significado da Aliança espiritual de Deus com seus fiéis aquele que se recusa a confiar no Bem? É apenas disso que se trata. Quem vive na Presença conhece a origem e a finalidade de sua vida, e possui a chave para o ganho ilimitado dos benefícios divinos, pois torna cada um destes num recurso para glorificar o seu provedor. É uma questão de Justiça: o mérito daquele que tomou conhecimento do segredo foi o de confiar na bondade do Mistério. Que outro mérito esse ser livre poderia ter? Que vantagem existe em honrar aquilo que é revelado como honrado, se isto é justo e inescapável? Aliás, que liberdade existe para fazer o que se é obrigado a fazer? O Amor divino tem que ser secreto, pois se fosse revelado Deus não amaria a liberdade de seus amantes. E o mérito do amante é justamente o amor verdadeiro, que é livre, puro, gratuito, e sem garantias. Isto não muda o fato de que o mérito é sempre de Deus em última análise. Mas nós, por assim dizer, participamos desse privilégio com a nossa cota de arbitragem, e é isto o que nos permite ser felizes de fato, e participantes na Glória de Deus, o que máquinas ou animais jamais poderão fazer. O segredo de Deus é o conteúdo do Mistério que é sagrado, e que se revela por justa causa ao coração daquele que não se nega a viver diante do Criador com Humildade e boa-fé. Este descobre o Amor e os frutos da Graça, etc.
#08 (Salmos 50:12) “Se tivesse fome não diria a ti, pois o mundo é meu, e o que nele existe. Acaso comeria eu carne de touros, e beberia sangue de bodes? Oferece a Deus um sacrifício de confissão e cumpre votos ao Altíssimo. Invoca-me na angústia: eu te livrarei, e tu me glorificarás.” Quanta pretensão o ser humano tem que ter para achar que poderia beneficiar a Deus de algum modo? Um Deus verdadeiro, criador de todas as coisas e infinitamente poderoso, jamais teria alguma necessidade por contradição na sua essência, e muito menos dependeria de uma criatura para a satisfação de sua vontade. Por outro lado, um falso deus, usurpador da legitimidade do verdadeiro, este sim se revelaria na sua falsidade através de pedidos absurdos aos seus seguidores, sinais que denunciariam imediatamente a sua real natureza. Quem pediu e continua pedindo sangue como contrapartida de favores é o Pai da Mentira, a Antiga Serpente, o Ouroboros. O Deus verdadeiro, por outro lado, o que pede? Ele só quer a pobreza de espírito, o coração contrito, a rendição da Humildade. Porque ser bom, para Ele, não exige nada da parte dos beneficiários de seu Amor além do mero desejo de aceitar os frutos de seu beneplácito, porque é da natureza divina amar e fazer o bem. A única necessidade da parte dos amados é o sacrifico do orgulho da sua suposição de poderem se realizar e se salvar por si mesmos, porque esta mentira converte o bem divino em mal, o que Deus não pode permitir. O sacrifico da mentira é este sacrifício de confissão, ou de comunhão com o Espírito Santo. Quem, por outro lado, cobra algo em troca de benefícios é um farsante, ladrão e usurpador que se aproveita da legitimidade conferida pela descrença dos infiéis aos quais escraviza.
#09 (Salmos 50:23) “Quem oferece uma confissão me glorifica, e ao homem íntegro mostrarei a salvação.”
#10 (Salmos 51:16) “Tu não queres sacrifício, e um holocausto não te agrada. Sacrifício a Deus é espírito contrito. Coração contrito e esmagado, ó Deus, tu não desprezas.”
#11 (Salmos 62:09) “Somente um sopro são os filhos de Adão, apenas mentira os filhos do homem.”
#12 (Salmos 73:21) “Quando meu coração se azedava e eu me atormentava, é porque eu era um imbecil e não sabia, eu era um animal junto a ti. Estou sempre contigo, tu me agarraste pela mão direita; tu me conduzes com teu conselho, e com tua glória me atrairás.”
#13 (Salmos 147:10) “Ele não se compraz com o vigor do cavalo, nem aprecia os músculos do homem; o Senhor aprecia aqueles que vivem na sua Presença, aqueles que esperam seu Amor.”
#14 (Provérbios 19:21) “Muitos são os projetos do coração humano, mas é o desígnio do Senhor que permanece firme.”
#15 (Provérbios 20:24) “O Senhor dirige os passos do homem: como, pois, poderá o homem compreender o seu caminho?” Vivemos num Mistério no qual cada jornada é a aventura de um eu na descoberta do Eu Supremo, como um filho perdido que percorre o caminho de casa no encontro de seu Pai e de sua herança. Muitos sofrimentos são causados pela arbitragem do excesso de Mistura da parte daqueles que querem ser os guias de seu próprio destino, conquistadores de seu sucesso e felicidade, e salvadores de si mesmos. Todo esse esforço é inútil. Como pode um intelecto tão limitado alcançar o grau de sentido que somente a Providência pode dar a cada vida no ordenamento total que a Obra de Deus produz? Como separar com um cálculo, por exemplo, a RSMM da AEM, ou o valor que uma vida pode ter como testemunho fidedigno perante o Dia do Juízo para qualquer outra mônada, de qualquer mundo ou universo que seja? A alegria do fiel está em repousar no governo divino da santa Providência que determina com infalibilidade cada momento da experiência desta existência, inclusive e especialmente com o amparo dos recursos espirituais que servem para a proteção e para o amparo no decorrer dessa jornada.
#16 (Provérbios 26:4) “Com o insensato não multipliques palavras, não caminhe em direção a um estulto; insensível, ele te cobrirá de desprezo. Guarda-te dele para não teres aborrecimento, e para não te sujares com seu contato. Evita-o, e encontrará repouso, e não te desencorajes com a sua loucura.”
#17 (Eclesiastes 1:14) “Examinei tudo o que se faz debaixo do sol: tudo é vaidade e correr atrás do vento! O que é torto não se pode endireitar, o que está faltando não se pode contar.”
#18 (Eclesiastes 7:29) “Deus fez o homem reto; este, porém, procura complicações sem conta.”
#19 (Sabedoria 12:15) “Justo, governas o universo com justiça e estimas incomparável com o teu poder condenar a quem não merece castigo. Pois a tua força é o princípio da justiça e, por seres o senhor de todos, a todos perdoas.”
#20 (Sabedoria 12:4) “Tu os aborreceste por causa de suas práticas detestáveis, ritos execráveis, atos de magia; esses cruéis infanticídios, banquetes canibalescos de vísceras e sangue humanos, esses iniciados membros de fraternidade e pais assassinos de vidas sem defesa, decidiste eliminá-los.” O autor menciona expressamente a vontade divina de destruir um culto antigo aos demônios que pedem o sangue de vítimas inocentes. Essa referência pode ser alargada até o Pacto Ouroboros com a Serpente e Adão. Afinal, entre a oferta de filhos como vítimas sacrificiais e como escravos de um sistema mentiroso de louvor a um falso deus, o que varia é o grau da abominação praticada, mas não o grau da mentira e da traição contra o Espírito Santo. Atualmente seria ainda fácil, para a maior parte dos seres humanos, condenar esse tipo de prática mencionada na passagem. Mas e a prática de tornar reféns esposa e filhos, dependentes de uma vontade falha e de um poder que requer o emprego da violência, para o suposto bem dessa missão familiar? Que escolha possuem os alvos das melhores intenções desses agentes morais falhos, incapazes de competir com a paternidade celeste? É claro que a Misericórdia divina compensa as pretensões absurdas da vontade humana, quando esta se restringe a um certo limite, como dentro daquilo que funciona de acordo com o Costume. Isto será mantido assim até o Fim dos Tempos, quando o Consolador se retirará e então ficará claro que não era a boa intenção humana que mantinha a paz e a ordem, mas era apenas a Graça de Deus. Enquanto isso, há uma elite que governa os grandes assuntos, políticas e riquezas do mundo, que é ainda participante do mesmo tipo de fraternidade com os mesmos rituais satânicos, e que está por trás do andamento da História em direção ao Reino do Anticristo. Deus sempre fez guerra contra esse lixo humano, e destruirá todos estes no fim, mas por dever de Justiça é mantida a anuência aos poderes mundanos sustentados pela vontade de uma população que recusa o Espírito Santo. Qual é a fonte, afinal, do poder dessas antigas fraternidades? É apenas e exclusivamente o Pecado Original. Se a humanidade, essa raça supostamente boazinha e bem comportada, amarrada na camisa-de-força dos seus costumes ancestrais, decidisse romper com a idolatria da família e com a perpetuação das Obras da Carne, um rápido fim seria determinado para todo o império da maldade sobre este mundo, e o fim de tudo seria antecipado, como disse Agostinho. Daí que é importante conectar as coisas. O Ouroboros e seus seguidores não têm o poder de por si manter o mundo sob o seu controle, a não ser pela escolha deliberada, que é o próprio Annuit Coeptis, da maior parte da humanidade de subscrever a prática do Pecado Original. Essa é a verdadeira fonte do poder infernal sobre o mundo. Deus, de sua parte, já disse aos seus operários: deixe o joio crescer com o trigo, ao fim colheremos e separaremos quem é quem.
#21 (Sabedoria 14:13) “Os ídolos nem existiam desde o princípio e nem existirão eternamente: é por uma ilusão humana que eles entraram no mundo e, por isso, um rápido fim lhes foi decretado. Isso se tornou uma cilada para a vida: homens, escravos ou da maldição ou do poder, impuseram o Nome incomunicável aos ídolos.”
#22 (Sabedoria 3:13) “Feliz a estéril imaculada que desconhece a união pecaminosa: obterá seu fruto na visita das almas. Feliz também o eunuco que não cometeu crimes com suas mãos, que não teve maus desejos contra o Senhor: por sua fidelidade receberá Graça especial e um quinhão apetecível.”
#23 (Sabedoria 6:15) “Meditar a Sabedoria é a perfeição da inteligência; quem vigia por ela logo se isenta de preocupações.” O intelecto humano, criado à imagem do Intelecto divino, possui objetos mais dignos da sua condição. A atenção, porém, é comandada pela livre vontade do sujeito que volta sua intelecção ao que lhe interessa. O testemunho desta passagem nos informa que o uso dessa capacidade para meditar a respeito da Sabedoria constitui a sua perfeição. Ora, o que é a Sabedoria? É a intuição ou visão do conhecimento supremo, da razão de todas as coisas, do que é o princípio, fundamento e destino de tudo o que existe. A Sabedoria é o conhecimento do Amor divino como causa suprema. Identificamos a Sabedoria, na Monadofilia, com um dos Cinco Conceitos Sinóticos, no caso o do Sumo-Bem, ou a Condição do Escolhido. Pois bem, que objeto poderia ser mais excelente de ser contemplado e meditado do que este, da parte dos intelectos criados? Nenhum, pois quaisquer outros objetos são baseados e explicados por esta Sabedoria suprema. E esta Sabedoria é de todas a coisa mais permanente, mais fixa, mais inabalável e mais perfeita, diante da qual todas as demais noções se curvam e submetem. Aquele, portanto, que se dedica intelectualmente à meditação ou contemplação dessa Sabedoria, encontra nesta atividade o refúgio perfeito contra as vicissitudes e percalços da experiência da Mistura. Qual repouso poderia ser superior ao da confiança nessa causa suprema que liga o destino de todas as coisas? Esta é a essência da vida na Presença, uma antecipação da bem-aventurança da vida eterna, ou Coruscância. É a busca voluntária da comunhão com o Espírito Santo ainda durante a experiência da Mistura, e é a razão da eleição para a Primeira Ressurreição.
#24 (Sabedoria 7:22) “Deus só ama quem habita com a Sabedoria. Ela é mais bela que o Sol, supera todas as constelações: comparada à luz do dia, sai ganhando, pois o dia cede lugar à noite, ao passo que sobre a Sabedoria não prevalece o mal.”
#25 (Eclesiástico 1:9) “Viver na Presença do Senhor é glória e honra, alegria e coroa de exultação. Viver na Presença do Senhor é dom que vem do Senhor; com efeito, Ele o estabeleceu sobre os caminhos do Amor.”
#26 (Eclesiástico 1:14) “O Amor do Senhor é sabedoria digna de honra; Ele a concede como partilha àqueles que vivem na sua Presença.” Deus nos honora com a Sabedoria do seu Amor, que é a consciência da causa final de todas as coisas e de nossas próprias vidas. Sendo Deus eterno e infinito, nada lhe impedindo ou limitando, tudo o que Ele faz é realizar sem restrições a sua vontade. Qual é a natureza de Deus? Deus é Bom, Deus é Amor, sua natureza é fazer o bem. Eternamente satisfeito em si mesmo, sua Glória é manifestada analogicamente na criação de seres criados à sua imagem e semelhança, com o único propósito de que estes seres usufruam, dentro do seu limite, da mesma Glória que Deus possui, como filhos chamados à participação em uma herança. Há um Caminho correto para a realização desse destino. É o que chamamos teologicamente de Cruz, ou monadofilicamente de Razão Singular de Mistura Mínima. Deus opera sua obra de compartilhamento da Glória de maneira perfeita, com o condicionamento da Liberdade daqueles feitos para escolherem participar ou não da promessa divina. Nenhuma sabedoria ultrapassa esta que revela a natureza divina do Deus eternamente amante, nenhuma honra maior o ser humano pode possuir do que se conhecer como eternamente amado e destinado à comunhão com o seu Criador, para a eterna bem-aventurança. Com este alvo em vista, todo o resto é conhecido por contraste e por aplicação. Mas é digno de nota, e é citado expressamente na passagem, que esta Sabedoria já faz parte da partilha divina. Não é algo que o homem obtém. Não é uma sabedoria humana. Não é algo produzido pelo psiquismo da criatura. E não é algo reconhecível pelo conhecimento dos contingentes (os elementos do mundo). É algo transcendente e superior, que só pode ser concedido pelo próprio Amor divino. E como é que Deus dispensa o dom da posse dessa Sabedoria? Ele o faz para aqueles que já receberam outro dom anterior, que é o do Temor, ou da Presença. Quem vive diante de Deus se afasta do espírito de Idolatria, e somente este pode receber a revelação da Sabedoria do Amor divino. Mas quem pode receber, então, o dom da Presença? Aquele que é humilde, o “pobre de espírito”, porque a Humildade é a chave do Coração, o Coração é a chave do Amor, e o Amor é a chave da Vida.
#27 (Eclesiástico 25:10) “Como é grande o que encontrou a Sabedoria, mas ninguém ultrapassa o que vive na Presença, que excede tudo. É vivendo na Presença do Senhor que se começa a amá-lo, e pela confiança que se começa a ligar-se a Ele.” O que encontrou a Sabedoria conheceu que Deus é Amor, e que esse Amor é o princípio e o fim de todas as coisas. Mas quem vive na Presença de Deus experimenta essa verdade como realidade. É por esta experiência que podemos amar a Deus de fato, não por ceder a uma idéia, ou por prática de um hábito, mas por reconhecer a realidade de Deus em nossa vida de todos os dias, em todas as nossas experiências. Este é o dom que nos liberta da Idolatria. As coisas do mundo não estão todas submetidas ao império do governo divino? Em teoria podem estar, para um intelecto minimamente esclarecido que reconhece a necessidade dessas coisas, mas é preciso viver isto como realidade. Isto é viver na Presença. É uma antecipação da Eternidade, com o grande mérito de ser uma experiência voluntária de busca da parte do amante de Deus. Confiar em Deus na nossa vida real é receber o dom da Fé que liga e submete tudo ao Criador. Não existe separação, não existe distância, não existe mediação, não existe entrar ou sair da relação com o divino. Nele somos, nos movemos e existimos, como disse o Apóstolo Paulo. Acima de toda a inteligência que compreende a conveniência e até a necessidade do divino, existe essa relação existencial, prática, cotidiana, que nos une por um vínculo básico com a ação divina que sustenta toda a nossa vida. Esta é a vida na Presença.
#28 (Eclesiástico 38:24) “A Sabedoria se adquire nas horas livres, e quem está livre de afazeres se torna sábio. Como se tornará sábio quem maneja o arado, aquele cuja glória consiste em brandir o aguilhão, o que guia bois, que não abandona o trabalho, e cuja conversa é só sobre gado?”
#29 (Isaías 8:12) “Não chamareis conspiração a tudo o que chamam conspiração; não participareis do seu medo, nem vos aterrorizareis.”
#30 (Isaías 8:16) “Conserva fechado o Testemunho, sela a instrução entre os meus discípulos.”
#31 (Isaías 30:15) “Na conversão e na calma estava a vossa salvação, na tranquilidade e na confiança estava a vossa força, mas vós não o quisestes!”
#32 (Isaías 43:18) “Não fiqueis a lembrar coisas passadas, não vos preocupeis com acontecimentos antigos. Eis que farei uma coisa nova, ela já vem despontando: não a percebeis?” Contrariamente à prática do louvor dos costumes e das tradições, e da escravidão ao culto dos antepassados e daquilo que foi aprendido das gerações anteriores, o Espírito Santo de Deus cura os desejosos de Liberdade ao indicar que o bem não faz parte das antiguidades, nem do passado da Humanidade como um todo, e nem mesmo do nosso passado particular no nível biográfico. O bem pleno é uma promessa de futuro. A Salvação não é uma realidade, é um objeto da Esperança, é uma promessa. O que precisamos é de uma coisa nova, uma novidade providenciada pelo desígnio perfeito que só Deus pode prover. O Idealismo Transcendental, que é a forma filosófica desse testemunho de Isaías, nos mostra que o efeito deste mundo e de nossa experiência de vida neste mundo é como o de uma âncora, de uma prisão, de uma força negativa que quer nos escravizar, nos restringir, nos oprimir e nos destruir. É verdade que Deus se revelou em benefícios que podem e devem ser usufruídos como primícias da sua promessa. Mas isso não deve servir para a valorização da condição dessa experiência, tanto quanto uma noiva não deve confundir a alegria que tem quando recebe presentes do noivo com a idéia de que o noivado é melhor que o casamento. Se a estadia na condição da Mistura é boa por ação da Misericórdia divina, isto não muda o status dessa condição como infinitamente inferior ao que é prometido para a Eternidade. O usurpador, ladrão e farsante que fez por crer que este mundo e esta natureza são o ápice da capacidade divina é aquele que lucra com a mentira, colocando-se como falso deus diante de uma humanidade decaída e perdida. Mas isso é uma questão de justiça, pois só crê nisso quem quer, por submissão aos espíritos malignos, especialmente da Sedução, ou Pacto com a Morte, através do qual se desconfia da bondade de Deus e se entrega aos procedimentos tão pequenos e mesquinhos de querer se aproveitar e lucrar numa condição tão inferior. Embora o peso do nosso nascimento nessa condição, e o peso da memória de nossa criação nessa cultura de Cativeiro sejam tremendos, o Espírito Santo de Deus é mais forte, bastando que cada um deseje conhecê-lo e receber a Liberdade da Boa Notícia da Ressurreição.
#33 (Isaías 56:4-5) “Aos Eunucos que viverem na minha Presença, que escolherem o que me é agradável e se afeiçoarem à minha Aliança, eu darei na minha casa e dentro de minhas muralhas um monumento e um nome de maior valor que filhos e filhas; eu lhes darei um nome que jamais perecerá.”
#34 (Isaías 58:6) “Por acaso não consiste nisto o jejum que escolhi: em romper os grilhões da iniquidade, em soltar as ataduras do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e despedaçar todo o jugo?”
#35 (Isaías 66:1) “O Céu é meu trono, e a Terra, o descanso de meus pés. Que casa haveis de fazer, que lugar, para o meu repouso? Tudo isto foi a minha mão que fez, tudo isto me pertence. Eis para quem estão voltados meus olhos: para aquele que treme diante da minha Palavra.”
#36 (Jeremias 5:30) “Coisa horrível e abominável aconteceu nesta Terra: os profetas profetizam mentiras, e os sacerdotes procuram proveitos. E meu povo gosta disso! Mas que fareis quando chegar o fim?”
#37 (Jeremias 7:8) “Vós vos fiais em palavras mentirosas que não podem salvar. Roubam, matam, adulteram, mentem, correm atrás de ídolos, e depois se apresentam a mim, no templo, e dizem “estamos salvos”, para continuar com as mesmas coisas! Este templo será porventura um covil de ladrões?”
#38 (Jeremias 8:8) “Como podem dizer: “Nós somos sábios, e a Lei do Senhor está conosco”?! Sim, eis que a transformou em mentira o trabalho do escriba!” O Profeta contesta diretamente a autoridade religiosa. Faz isso para o benefício de todos nós, e para honrar a verdade e a libertação do Evangelho. Ninguém pode se afirmar sábio diante de Deus e do próximo. Ninguém. Não há sabedoria diante de Deus. Não temos mestres, guias, pais ou líderes humanos que não sejam eles próprios carentes e necessitados de Salvação tanto quanto nós, quando não mais ainda. A Lei do Senhor não pertence a nenhuma autoridade humana. O máximo que o ser humano faz é dar o testemunho a respeito do seu entendimento do que é a Lei de Deus. E de nossa parte seguimos a própria instrução divina e desconfiamos de nós mesmos, pois maldito é o homem que confia no homem. Não, os religiosos, doutores e escribas não são sábios, e a Lei do Senhor não está com eles. Sábio é Deus, e a Lei do Amor pertence a Ele. Porém, a Religião não fez senão perverter um testemunho que originalmente deveria se dirigir para a verdade e para a Salvação. A Religião não é simplesmente um testemunho falso, como o de uma seita qualquer inventada ad hoc, ou por pura inspiração demoníaca. Uma Religião é um trabalho de transformação da verdade em mentira, é um trabalho de traição e de usurpação. O que era um testemunho original destinado ao benefício do ser humano é transformado pelo trabalho religioso numa mentira que terá o efeito contrário ao propósito original da Revelação. Quando falamos de adulterações, omissões, incrementos, etc., e que de modo geral o que chamamos de Bíblia não pode ser considerado a “Palavra de Deus”, é disto que estamos falando. Existe a denúncia explícita de Jesus a um poder usurpador e mentiroso desde o princípio, poder esse que organizou a Religião de tal modo que o próprio Jesus fosse rejeitado por aqueles que deveriam recebê-lo. É disto que se trata. E não é uma novidade. Já Jeremias, entre outros, denunciavam a ação perniciosa dos religiosos que se colocam como os intérpretes da Revelação. Antes disso já vimos enganos de natureza semelhante com outros personagens e suas interpretações equivocadas, como Moisés e Aarão, ou Abraão, ou mesmo Noé. Não há nada de novo sob o Sol. Quem se recusa a reconhecer o trabalho mentiroso da religião na custódia e na distribuição da Revelação está negando o próprio testemunho que essa mesma Revelação produz a nosso favor.
#39 (Jeremias 9:23) “O sábio não se glorie da sabedoria, nem o valente da valentia, nem o rico da riqueza: quem quer se gloriar, se glorie disto: de ter a inteligência e me conhecer, porque Sou Eu quem pratico o Amor, o Direito e a Justiça. É disto que eu gosto!”
#40 (Jeremias 17:5) “Maldito o homem que confia no homem, que faz da carne a sua força, mas afasta seu coração do Senhor! Bendito o homem que se fia no Senhor, cuja confiança está no Senhor.” Esta instrução possui diversos níveis de entendimento. De modo mais imediato, a confiança no ser humano de modo episódico é digna de maldição, já que nenhuma criatura é confiável como só Deus o pode ser. Assim, atrai sobre si a desgraça quem se alia com outros seres humanos com laços de confiança quando estes não são vinculados à vida na Presença de Deus e de comunhão com o Espírito Santo. Portanto, com a exceção das amizades verdadeiras daqueles que caminham juntos pela vida na Presença, todos os demais vínculos de confiança humana são malditos e destinados a frustração. Se isso não ocorre todas as vezes, é por ação da Misericórdia do Consolador que ainda retém a ação desenfreada do mal neste mundo. Aos homens de boa vontade que vivem reconciliados com Deus há sempre a oportunidade da amizade verdadeira entre si, porque esta não é sustentada na confiança naquilo que é humano, mas no que é divino. As outras relações estão fadadas ao fracasso e a frustração em alguma medida, porque então a confiança se deposita sobre o que é meramente humano, isto é, no que é frágil, no que tende à mentira e à corrupção, na fraqueza, na ignorância e na maldade. Isso explica vínculos de família, de negócios, de relações religiosas e políticas, etc. Buscar no homem o que é apenas digno de Deus, ou seja, a fidelidade, lealdade, bondade, força, sabedoria, etc., atrai a maldição decorrente da idolatria. Confiar no homem sem a mediação divina é a prática da idolatria humanista, da antropolatria e do antropocentrismo. Se e quando o ser humano é confiável, é porque Deus o tocou e o transformou, o separou e santificou. Não só cai em cilada em busca no humano o que não é humano, mas divino, mas também cria uma cilada ao próximo quem confia nele, por gerar uma expectativa indevida e absurda que causa opressão psíquica e grandes males. O ser humano deve amar o seu próximo, ter caridade e enxergar o outro como alguém também carente e necessitado, mesmo quando a realidade pareça ser diferente. Mais ainda dignos de misericórdia são aqueles que se acham realmente melhores, superiores ou mais confiáveis, quando isso não lhes foi dado por Deus mas por si mesmo e por outros homens, pois são cegos da sua real condição. Já do ponto de vista mais amplo, a maldição se aplica ao humanismo quando esse se torna histórico, transgeracional, do tipo dos idealismos imanentistas das tradições ou das revoluções, ligados a supostos destinos coletivos e civilizacionais. Isto também atrai todo tipo de desgraça, com o agravante do desprezo direto às profecias que já declararam o destino da espécie humana: um colapso, a escravidão temporária nas mãos do Anticristo, e então a extinção. Que direito tem aquele que já recebeu a profecia, de desconfiar dela e de confiar num futuro coletivo diferente? Nenhum. Neste erro incorrem especialmente os messiânicos, entre os quais se encontram os adeptos do Cristianismo, que ainda acreditam na fundação do Reino de Deus neste mundo. Jesus Cristo já revelou que seu reino não é deste mundo. Ironicamente, se ele fosse obedecido, o homem romperia com o Pecado Original e anteciparia rapidamente, como disse Agostinho, o advento do verdadeiro Reino. Mas isto os humanistas não querem fazer, porque não querem confiar realmente em Deus, mas em si mesmos. Cai sobre eles, portanto, todo o peso da maldição. Por outro lado, quem confia em Deus, mesmo estando cercado de idólatras, de traidores, ou de reticentes e tímidos, é bendito pela Providência e encontra o seu caminho aberto pela ação divina. Este fiel encontra a Graça e dá o seu testemunho para o seu tempo e para o Juízo Final, mostrando como era pouco o necessário, e como era fácil a escolha, desde que se aceitasse o encargo do Amor no lugar da busca do Poder.
#41 (Jeremias 33:3) “Invoca-me e eu te responderei, e te anunciarei coisas grandes e inacessíveis, que tu não conheces.”
#42 (Ezequiel 13:22) “Por terdes intimidado o coração do justo com mentiras, quando eu não o afligi, e ter fortalecido a mão do ímpio, para que ele não tivesse se voltado de seu mau caminho a fim de buscar a vida, por tudo isso libertarei o meu povo das vossas mãos, e sabereis que EU SOU o Senhor.”
#43 (Ezequiel 18:23) “Porventura tenho eu prazer na morte do ímpio? Eu não tenho prazer na morte de quem quer que seja.”
#44 (Ezequiel 34:10) “Ai dos pastores que apascentam a si mesmos! Eis-me contra os pastores. Das suas mãos requererei prestação de contas a respeito do rebanho, e os impedirei de apascentá-lo. Livrarei minhas ovelhas da sua boca, e não continuarão a servir-lhes de presa.”
#45 (Oseias 4:6) “É contigo, sacerdote, que estou em processo! Meu povo será destruído por falta de conhecimento. Porque rejeitastes o conhecimento, eu te rejeitarei do meu sacerdócio; porque esqueceste o ensinamento do teu Deus. Se alimentam dos pecados do meu povo e anseiam por sua falta.”
#46 (Oseias 6:6) “É amor que eu quero, não sacrifício, conhecimento de Deus, não holocaustos.”
#47 (Amós 4:4) “Multiplicai os pecados! Oferecei os vossos sacrifícios, e os vossos dízimos! Queimai sacrifícios, proclamai vossas oferendas voluntárias, anunciai-as, porque é assim que gostais. Prepara-te para o confronto com o teu Deus!”
#48 (Amós 5:21) “Eu odeio, eu desprezo as vossas festas, e não gosto das vossas reuniões. Não me agradam as vossas oferendas e sacrifícios. Afasta de mim o ruído de teus cantos, eu não posso ouvir o som de tuas harpas!” A Revelação é o que Deus afirma sobre si mesmo, enquanto a Religião é aquilo que o homem afirma a respeito de Deus. Falível como é, corrupto, mentiroso e farsante, o ser humano tende a falsificar a experiência espiritual com a produção de uma cultura religiosa que vai substituir a integridade da verdade da condição humana por uma prática de fingimento de piedade e demais virtuosismos. Que isso fosse reconhecido pela própria consciência humana, já seria o suficiente para interromper a adesão à farsa religiosa. Mas mais do que isso, pelo profeta Amós Deus mesmo condenou a Religião. Não foi a primeira vez, e não será a última. Deus declara odiar as festas e as reuniões feitas em seu nome, com o suposto motivo de cultuá-lo. Porque sabe e revela que esse culto é falso. Condena oferendas e sacrifícios, pois é ofendido em sua santidade pela abjeta vontade humana de corrompê-lo, de comprar o seu Amor. E a própria cultura de adoração religiosa, com os cantos e os sons das harpas, que deveria ser algo excelente para glorificar o Criador, é algo detestável e insuportável quando está vazio de conteúdo espiritual legítimo. A Religião, em suma, é uma prática exterior, é a produção de símbolos que representam algo interior que deveria ser bom, mas que é independente do exterior. A Religião, hipócrita o quanto seja, pode enganar a muitos, mas não engana a Deus, que conhece o que há dentro do homem e não se deixa enganar pelas aparências.
#49 (Miquéias 5:6) “O resto dos fiéis será, no meio de numerosos povos, como um orvalho vindo do Senhor, como gotas de chuva sobre a erva, que não espera no homem, e não conta com o filho do homem.”
#50 (Miqueias 6:8) “Foi-te anunciado, ó homem, o que é bom, o que o Senhor exige de ti: nada mais do que praticar a justiça, amar a bondade e te sujeitares a caminhar com teu Deus!”
#51 (Mateus 4:28) “Não vos preocupeis com a vossa vida, quanto ao que haveis de comer, ou vestir, e a saúde do corpo. São os ignorantes que estão à procura de tudo isso. Buscai, primeiro, o Reino e a Justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas.” Desde que a experiência da vida atual é tão temporária, precária e com um propósito tão limitado, isto é, somente com a função da experiência da arbitragem, num ambiente de Mistura, a respeito do aceite do Amor divino, não faz sentido querermos prioritariamente as garantias e benefícios que não são compatíveis com o objeto principal desta experiência presente. Se cuidarmos daquilo que é o mais importante, que é a vida na Presença e o amor a Deus e ao próximo, não é difícil que a Providência divina realize na melhor combinação possível a provisão necessária ao atendimento das nossas maiores necessidades contingentes. Os ignorantes do propósito da vida neste mundo invertem suas prioridades. Buscam primeiro um bem independente de Deus, o que é sempre ilusório, e daí talvez, quem sabe, buscam algo a respeito do sentido maior de suas vidas que os levem a Deus, isso quando muito. Mas no meio do caminho a confusão se estabelece, porque quem procura um bem por si se entende como capaz de se salvar e se beneficiar por si mesmo, e já opera uma lógica contrária à Graça, quando não mesmo de usurpação. Muitas vezes os orgulhosos precisam ser destituídos de seus benefícios, e muitos bens devem lhes permanecer retidos, para que em seus corações não ampliem a sua confusão e não se achem ainda mais afastados de Deus. Quem aceita o governo divino e compreende, mesmo que de modo elementar, o propósito desta vida, sabe que é muito mais difícil para o Poder divino fazer uma criatura livre escolher a confiança sem garantias no seu Amor, do que este Poder prover as necessidades da contingência da vida humana neste mundo. Jesus, com muita Justiça, está dizendo: faça a sua parte, e eu farei a minha. Se você quiser se garantir por si mesmo, estará se afastando do Amor divino e dificultando a própria Obra de Salvação e a da dispensa de benefícios.
#52 (Mateus 6:21) “Onde está teu tesouro, aí estará também teu coração.”
#53 (Mateus 6:22) “A lâmpada do corpo é o olho. Portanto, se teu olho estiver são, todo teu corpo ficará iluminado; mas se teu olho estiver doente, todo teu corpo ficará escuro. Pois se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão as trevas!”
#54 (Mateus 7:6) “Não deis aos cães o que é sagrado, nem atireis vossas pérolas aos porcos, para que não as pisem e, voltando-se contra vós, vos estraçalhem.”
#55 (Mateus 10:21) “O irmão entregará o irmão à morte, e o pai entregará o filho. Os filhos se levantarão contra os pais e os farão morrer. E sereis odiados por todos por causa do meu nome. Aquele, porém, que prevalecer até o fim, esse será salvo. Não penseis que vim trazer paz à Terra. Não vim trazer paz, mas espada. Vim contrapor o homem ao seu pai, a filha à sua mãe, e a nora à sua sogra. Os inimigos do homem serão aqueles de sua própria casa. Quem ama pai ou mãe mais do que a mim não é digno de mim. Quem ama filho ou filha mais do que a mim não é digno de mim. Quem não toma a sua cruz e não me segue não é digno de mim. Aquele que acha a sua vida, a perderá, mas quem perde sua vida por causa de mim, a achará.”
#56 (Mateus 11:25) “Eu te louvo, ó Pai, porque ocultaste estas coisas aos sábios e doutores, e as revelastes aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado.”
#57 (Mateus 11:28) “Vinde a mim os que estão cansados sob o peso do vosso fardo, e vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para vossas almas, pois meu jugo é suave, e meu fardo é leve.”
#58 (Mateus 12:39) “Uma geração má e adúltera busca um sinal, mas nenhum sinal lhe será dado, só o sinal do profeta Jonas. Os ninivitas se converteram pela pregação de Jonas, mas aqui está algo maior que Jonas! A Rainha do Sul veio ouvir Salomão, mas aqui está algo maior do que Salomão!”
#59 (Mateus 13:11) “A vós foi dado conhecer os mistérios do Reino dos Céus, mas a eles não.”
#60 (Mateus 15:7) “Invalidastes a Palavra de Deus por causa da vossa Tradição. Mentirosos! Bem profetizou Isaías a vosso respeito: esse povo me honra com os lábios, mas o coração está longe de mim. Em vão me prestam culto, pois o que ensinam são apenas mandamentos humanos.”
#61 (Mateus 19:10-14) “Seus discípulos disseram-lhe: ‘Se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar!’ Respondeu Jesus: ‘Nem todos são capazes de compreender o sentido dessa palavra, mas somente aqueles a quem foi dado compreender. Porque há Eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há Eunucos tornados tais pelas mãos dos homens, e há Eunucos que a si mesmos se fizeram assim por amor ao Reino dos Céus. Quem puder compreender, compreenda.’ Foram-lhe, então, apresentadas algumas criancinhas para que pusesse as mãos sobre elas e orasse por elas. Os discípulos, porém, as afastavam. Disse-lhes Jesus: ‘Deixei vir a mim estas criancinhas e não as impeçais, porque o Reino dos Céus é para aqueles que se lhes assemelham.’”
#62 (Mateus 20:15) “Não tenho o direito de fazer o que quero com o que é meu? Ou estás com ciúme porque sou bom? Os últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos.”
#63 (Mateus 23:1) “Ai de vós, doutores e religiosos, mentirosos, porque bloqueais o Reino dos Céus diante dos homens! Pois vós mesmos não entrais, nem deixais entrar os que querem!” O que é pior do que recusar o chamado divino para a vida na Presença? É recusar o chamado e interferir no chamado dos outros. O que faz a Religião, senão exatamente isto? O Reino dos Céus é revelado pelas palavras de Deus trazida pelos profetas, pelos apóstolos, e pelo próprio Jesus Cristo em pessoa. A interpretação dessas revelações, porém, passa pelo filtro cheio de glosas, interpretações e escolhas da parte da Religião. Que fique claro: todos nós somos responsáveis por escolhas e interpretações. O problema é a arrogação de autoridade em violação ao dom de Soberania, o que é sempre uma farsa, desde que os seguidores de uma Religião são todos eles, um por um, responsáveis individualmente pela sua escolha de confiar nas autoridades que decidiu seguir, endossar e subscrever. O motivo pelo qual a Religião opera como um contrabandista ou atravessador da Salvação é muito claro: o que pode dar mais poder de uns seres humanos sobre outros, senão a capacidade de conceder ou reter o acesso ao maior bem possível que uma criatura poderia usufruir, seja isto a dispensa de uma punição eterna (o Inferno) ou a garantia de participação numa satisfação eterna (o Paraíso)? Isto só funciona, por sua vez, porque todos os seres humanos que vivem distantes da Presença e em rejeição ao Espírito Santo vivem sob o peso da culpa da sua omissão espiritual. Essa dívida é “cobrada” pelos usurpadores que usam a Religião como balcão de negócios em nome de Deus. A legalidade é garantida pela temeridade e falta de Humildade das vítimas. Antes que se pense que esses procedimentos sejam feitos de qualquer modo, bem ao contrário disto a Religião ergue-se vestida de artes e belezas, ritos e tradições, festas, calendários, enfim, por toda uma vasta cultura de Legitimação. A Religião é a coisa mais antiga que o homem fez desde que foi expulso do Paraíso perdido do Éden. Essa prática ancestral impõe seu encargo pesadíssimo sobre cada nova geração de nascidos como escravos no Cativeiro deste mundo. Somente Deus mesmo, com a força do seu testemunho, pode libertar de cada uma das novas gerações aquelas pessoas que rejeitam a opressão das mentiras religiosas. Por outro lado, grande parte das vítimas mantém-se refém da Dialética do Ouroboros, que faz o colapso moral da Libertinagem servir de recomendação do costume e da tradição. Jesus veio trazer a Liberdade total, esta é a essência da Boa Notícia: a liberdade contra o Pecado e contra a Lei do Pecado, para que todos possam viver pela Graça.
#64 (Mateus 23:8) “Não permitais que vos chamem Mestre, pois um só é o vosso Mestre e todos vós sois irmãos. A ninguém na Terra chameis Pai, pois só tendes o Pai Celeste. Não permitais que vos chamem Guias, pois um só é vosso guia, Cristo. Antes, o maior será aquele que vos serve. Aquele que se exaltar será humilhado, e aquele que se humilhar será exaltado.” O maior é o que mais se humilhou para fazer a maior obra de todas, o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo, que nos revelou o Pai. Ele revela a si mesmo e desfaz as confusões das relações humanas de poder que só atrapalham o relacionamento entre o humano e o divino. Quem é Mestre, Pai, ou Guia, além de Deus? Ninguém. Aquele que é servidor do Amor divino se coloca como testemunha fidedigna da ação da Providência, e não como preposto, representante, ou vigário. Assim, o direito divino de reis e sacerdotes lhes constitui na verdade uma armadilha, pois caso não tenham sido colocados lá pela própria decisão de Deus, provavelmente ocupam um lugar indevido, como usurpadores. Há um grande perigo na busca pelo poder sobre os homens, bem como na obediência aos poderes humanos como se estes representassem a autoridade divina. Jesus Cristo nos traz aqui a segurança do relacionamento direto com ele mesmo, às custas das glórias humanas representadas por instituições falsas e por personalidades soberbas. Vivemos cada qual uma vida única voltada para Deus, nascemos, morremos e ressuscitamos para Ele, e somos destinados à vida eterna na sua Presença. Quanto antes nos incumbirmos dessa realidade e anteciparmos essa experiência de modo voluntário, melhor para nós. Que vivam para si mesmos, na mentira, aqueles que trocam glórias humanas entre si. O cristão não deve se misturar. Não vive para nenhum rei ou sacerdote humano, e presta contas apenas ao Altíssimo. Quanto ao próximo, só lhe cabe o amor de sua justiça.
#65 (Lucas 5:31) “Eu não vim chamar justos, mas pecadores.”
#66 (Lucas 10:41) “Tu te inquietas e te agitas por muitas coisas; no entanto, pouca coisa é necessária, até mesmo uma só.”
#67 (Lucas 14:26) “Se alguém vem a mim e não odeia seu próprio pai e mãe, mulher, filhos, irmãos e irmãs, e até a própria vida, não pode ser meu discípulo. Quem não carrega sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo.”
#68 (Lucas 20:34) “Os filhos deste mundo casam e dão-se em casamento; mas os que forem julgados dignos de ter parte no outro mundo e na ressurreição dos mortos não tomam nem mulher nem marido; como também não podem morrer: são semelhantes aos anjos e são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição.”
#69 (João 5:44) “Como podeis crer, vós que recebeis glória uns dos outros, mas que não procurais a glória que vem do Deus único?”
#70 (João 6:28) “Disseram a Jesus: ‘Que faremos para trabalhar nas obras de Deus?”‘ e ele respondeu: ‘A obra de Deus é que creiais naquele que ele enviou’.”
#71 (João 11:25) “EU SOU a Ressurreição. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá. E quem vive e crê em mim, jamais morrerá.”
#72 (João 12:24) “Se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanecerá só; mas se morrer, produzirá muito fruto. Quem ama sua vida a perde, e quem odeia sua vida neste mundo guarda-la-á para a vida eterna.”
#73 (João 14:27) “Deixo-vos a paz, minha paz vos dou. Não vo-la dou como o mundo a dá. Não se perturbe, nem se intimide o vosso coração.”
#74 (João 15:16) “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi e vos designei para irdes e produzir fruto. Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro, odiou a mim. Se fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; mas, porque não sois do mundo, e minha escolha vos separou do mundo, o mundo, por isso, vos odeia.” Sem que Deus nos concedesse os seus dons, nós jamais poderíamos entendê-lo e viver em sua Presença. Quando somos portadores do Testemunho da Boa Notícia, nós o somos por escolha divina que dignou-se a nos partilhar de dons que são restritos. Duas pessoas igualmente humildes diante de Deus podem ser escolhidas para o uso de dons diversos. O que nos separa e nos afasta do espírito do mundo, e nos torna capazes de dar um Testemunho divergente a favor da Obra divina de santificação, é uma escolha divina e não humana. Quando Jesus nos faz produzir frutos, ele nos liberta da vaidade de uma falsa crença de que fomos nós mesmos que nos colocamos nesta posição. Ao contrário de uma fatuidade, sentimo-nos frágeis e precários por nós mesmos. E então ele nos encoraja. Se já nos separou, não conseguimos mais nos misturar. Se já nos esclareceu, não conseguimos mais confundir. E nos dói ser odiados por um mundo que não quer receber os mesmos dons. Jesus nos esclarece: esse mundo que vos odeia porque eu lhes abençoei, ele me odiou primeiro. E é bom sinal que não sejam amados pelo mundo, bem recebidos e celebrados, porque estão espiritualmente afastados das suas mentiras e enganos. Vejam como ser cristão não tem nada a ver com amor num sentido sentimental ou incondicional, ou humanista. Amamos a Deus e isto nos faz odiar o que odeia a Deus, e a sermos odiados pelos que odeiam a Deus. Estar no mundo é a experiência contingente da Cruz que nos expõe a variados graus de Mistura entre Luz e Trevas, e a conviver com as diversas representações das outras mônadas que possuem o poder de arbitrar excessos em medidas totalmente diferentes das ideais de acordo com a Obra divina.
#75 (João 16:12) “Tenho muito que vos dizer, mas não podeis agora suportar. Quando vier o Espírito da verdade, ele vos guiará na verdade plena.” A Revelação da verdade é caridosa e sempre benigna, alheia ao espírito de escândalo e atenciosa à caminhada de cada indivíduo na direção da libertação. Jesus Cristo tinha, como tem hoje e terá sempre, a condição máxima de iluminação de qualquer intelecto criado, mas se cada qual se realiza no dimensão temporal da sucessividade, não convém que o Espírito Santo eduque os seus seguidores, cada qual na relatividade da sua jornada? A velocidade, a profundidade, a largueza e o alcance do guiamento são variáveis conforme a condição de cada um. A verdade em si é Eterna, e pertence a Deus para sempre. O compartilhamento dessa Sabedoria é uma dispensação ela própria sábia e adequada para as diferenças das épocas, dos povos, e principalmente dos indivíduos. O que Jesus disse resguarda o seu direito divino de iluminar quem quiser da maneira que quiser, bem como nos dá o amparo para a rejeição de qualquer formulação temporal institucionalizada e fossilizada que se presuma ser definitiva. A plenitude da verdade é uma promessa dada por Deus a cada um no tempo que Ele entende ser próprio. Isto quer dizer que o grau do nosso compartilhamento do entendimento das coisas divinas é sempre variável e incerto, o que só deveria estimular a cada um a buscar a expansão dos limites de sua própria consciência, com espírito de aprendizado, além de interditar qualquer presunção de domínio terminativo do sentido do divino. Como o Espírito poderá guiar na verdade plena senão a cada um, do modo próprio que é o mais adequado a cada jornada individual, a cada competência individual? Nascemos e vivemos para Deus, cada qual em sua jornada, e não vivemos em busca de Sabedoria para restringir a busca do próximo, mas para estimulá-lo. Temos a segurança de que quem se desviar será corrigido pelo cajado e pela vara do Pastor, e que as obras dos corações dos homens estão destinadas à dissolução. Não é preciso fazer guerra contra o vazio e as mentiras tanto quanto é preciso fazer guerra contra o Poder e todo tipo de opressão. Quem se desvia, por si merece a correção divina ou o destino que revele o sentido de sua disposição. Quem ousa liderar, este é temerário e se coloca em posição de risco, inclusive quando quer corrigir o erro que pretende encontrar na ação alheia. Tanto na instrução doutrinal quanto na corretiva, quem se coloca como Guia desobedece a Deus. Antes o Testemunho do que a Presunção.
#76 (João 17:3) “A vida eterna é esta: que eles conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo.”
#77 (Romanos 4:4) “O homem é justificado pela fé, sem a prática da Lei. A quem faz um trabalho, o salário não é considerado como gratificação, mas como uma dívida; a quem, ao invés, não trabalha, mas crê naquele que justifica o ímpio, é sua fé que é levada em conta de justiça.” O Apóstolo Paulo traz o ápice da Teologia da Graça. A fé é a confiança amorosa no Amor divino sem garantias, e no governo da Providência divina sobre todas as coisas. Se é justo que a ação humana produza consequências que afetem o agente, é mais justo ainda que a Graça divina seja reconhecida no seu mérito separado e próprio, pois Deus não divide a sua Glória com ninguém, e mais ainda, não existe criatura com agência moral suficiente para se justificar sem a Graça. Ora, se todo o trabalho, esforço, sacrifício e diligência não atinge a suficiência necessária para a justificação do ser humano diante de Deus, e por outro lado a Graça é sempre suficiente independente dos méritos dos amados, somente sob a condição do aceite, a Graça divina é infinitamente superior às virtudes e obras humanas. O caminho espiritual é este, o da diminuição da criatura em face da grandeza divina. Isto é viver na Presença, isto é a Vida de Oração. Esta é a comunhão com o Espírito Santo. Este é o sentido do testemunho do João Batista que, diante de Jesus, é como a Lua diante do Sol: “é preciso que eu diminua, para que Ele cresça“. Esta é a felicidade humana, viver com Deus. Esta é a fonte daquelas intuições do Padre Caussade, a respeito do Abandono à Divina Providência, do Sacramento do Momento Presente, e da Alegria da Total Rendição. Deus deve ser apropriadamente glorificado, e Seu Nome santificado. Isto é o que torna o homem feliz, porque o ser humano foi feito para isto. E disto é que se conclui, também, que “os últimos serão os primeiros“, porque aqueles que menos se arrogam mérito na própria salvação estão mais próximos do aceite da Graça plena, enquanto aqueles que carregam maiores obras estão mais distantes do aceite da pureza do Amor divino. É justo que a fé justifique aquele que não pratica a Lei, porque esta Lei mencionada por Paulo está submetida à Lei Suprema que é a Lei do Amor divino, e aquela primeira só serve para o conhecimento da fraqueza e da limitação do amado, enquanto a segunda serve para o conhecimento da magnificência da Misericórdia divina. Aqueles que pretendem comprar a Salvação com suas ações se acham capazes de cobrar de Deus uma dívida, como se Deus pudesse ser diminuído no Seu Amor. Quem faz o que é bom, o que é virtuoso e o que aproxima de Deus, o faz em primeiro lugar apenas porque recebeu o dom divino que permitisse sua virtude, e além disso faz também na qualidade de criatura carente de uma Justiça que não se pode dar. Quem faz o que é bom deveria entregar a sua ação como ato gratuito de ação de graças, e jamais cobrar de Deus um reconhecimento, uma salvaguarda ou uma compensação. É a Religião que ensina a fazer comércio com Deus, corrompendo o ser humano e substituindo a pureza do Amor pela corrupção do Poder. Não há Poder diante de Deus, senão o poder de amá-Lo gratuitamente. E o fraco e incapaz é tão potente para amar a Deus quanto o forte e capaz, então não há diferença, a Graça é necessária para todos. Se há diferença, é que o fraco e incapaz está justamente mais próximo do reconhecimento da necessidade da Graça, enquanto o forte e capaz tem maior chance de ser tentado e de se confundir a respeito da sua carência. Não há razão possível entre o finito e o infinito, e apenas a Graça infinita é suficiente para justificar e garantir a salvação, que é a Coruscância. As diferenças entre os finitos são igualmente desprezíveis diante do infinito, como medidas infinitesimais e que não produzem diferença na dimensão que importa, que é a da bem-aventurança pela Eternidade. Que diferença haverá, no Paraíso, entre o que fez mais e o que fez menos, se é Deus quem os torna felizes pela virtude de Sua santidade e de Seu Amor?
#78 (Romanos 8:33) “Se Deus está conosco, quem está contra nós? É Deus quem justifica, quem condenará? Quem nos separará do Amor de Cristo? Nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem os poderes, nem a altura, nem a profundeza, nem qualquer criatura poderá nos separar do Amor de Deus, manifestado em Jesus, nosso Senhor.”
#79 (Romanos 11:32) “Deus encerrou a todos na desobediência, para a todos fazer misericórdia. Ó abismo de riqueza, de sabedoria, e da ciência de Deus!”
#80 (Romanos 14:14) “Nada é impuro em si. Alguma coisa é impura para quem a considera impura. Entretanto, se por causa de algo teu irmão fica contristado, já não procedes com amor. A fé esclarecida que tens, guarda-a para ti diante de Deus. Feliz aquele que não se condena na decisão que toma.”
#81 (1 Coríntios 1:21) “Visto que o mundo por meio da sabedoria não reconheceu a Deus, aprouve a Deus, pela loucura da pregação, salvar os que crêem. O que é loucura de Deus é mais sábio do que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte do que os homens. O que é loucura no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte; e o que é vil e desprezado, o que não o é. Deus escolheu para reduzir a nada o que parece ser bom, a fim de que nenhuma criatura possa vangloriar-se diante de Deus.”
#82 (1 Coríntios 2:13) “O homem psíquico não aceita o que vem do Espírito de Deus. É loucura para ele; não pode compreender, pois isso deve ser julgado espiritualmente. O homem espiritual, ao contrário, julga a respeito de tudo e por ninguém é julgado.”
#83 (1 Coríntios 6:12) “Tudo me é permitido, mas nem tudo me convém. Tudo me é permitido, mas não me deixarei escravizar por coisa alguma.” Cai o modelo da Lei que mata o Espírito, e se ergue o modelo do império da Consciência. Separa-se o amor ao próximo, que é matéria de Justiça, daquilo que é a moralidade como campo da experiência espiritual de crescimento da vida espiritual de cada um. Deus não é um delegado de polícia, mas é o bem-aventurado que queremos imitar, e o bem não é uma ordem, mas um alvo do desejo livre. A vontade de se assemelhar ao divino é a vontade pela Liberdade que rejeita igualmente a escravidão do desejo e do costume. O que é conveniente não é a obediência a uma regra exterior, mas ao mandamento testemunhado interiormente, pela consciência do amante da verdade e do bem. Não é mais viável, portanto, o juízo do homem sobre o homem a respeito da moralidade, e muito menos a respeito da satisfação de um relacionamento com Deus, pois o resguardo das leis humanas dizem respeito apenas à equidade da Justiça e à manutenção da ordem social e das liberdades civis. O Evangelho destruiu toda a idolatria humanista em geral, e especialmente a idolatria religiosa em particular. Caem as autoridades humanas, que são governantes de escravos, em face da autoridade divina que governa as consciências dos homens livres.
#84 (1 Coríntios 7:8) “Aos não casados e aos viúvos eu digo que é bom que permaneçam solteiros, como eu faço.” Quem conhece a Deus recebe a liberdade contra o Costume, pois já recebeu antes a liberdade contra a Libertinagem, por reconhecer a bondade de um ordenamento transcendente. Quem não teme a própria submissão aos instintos animalescos também não teme a liberdade de viver sem o fardo do controle artificial desses instintos. A provisão do Costume é como um caminho de segurança contra os maiores males possíveis da vida, quando os elementos caóticos, perversos e malignos influenciam e levam o ser humano a arbitrar os maiores excessos de mistura possíveis. Há, portanto, a possibilidade de experimentar um excesso artificialmente controlado, que restringe a liberdade e impõe obrigações e compensações para limitar os males oriundos do desejo humano. Esse controle artificial é o Costume, que é o sentido tradicional ou religioso daquilo que se chama de “Lei”. A verdadeira Lei, porém, é a divina, que é a Lei do Amor e que não restringe, mas liberta. Assim como a Libertinagem escraviza ao seu modo, o Costume também o faz, trocando alguma satisfação sem Deus pelas salvaguardas da respeitabilidade humana e dos sinais de virtude e valor representados pelas restrições e sacrifícios impostos para a permissão dessa pouca satisfação. Deus não escraviza. Ele não quer escravos, quer filhos livres. Livres do pecado e da Lei do Pecado, livres da autodestruição da Libertinagem e da falsa piedade do Costume. Quem está livre de sua própria irracionalidade animal, por a submeter ao seu próprio controle pessoal com a ajuda direta de Deus, está também livre das rédeas criadas como controles artificiais dessa irracionalidade. E, no caso específico da instituição do Matrimônio, há a grande liberdade de se dispensar qualquer participação na virtude fingida da perpetuação do Pacto Ouroboros, podendo cada um ligar-se a Deus o mais diretamente possível num serviço sem mentiras e sem compromissos com os poderes e os espíritos do mundo. Afinal, se quem quer fazer somente do seu desejo imediato o sentido de sua vida é escravo desse desejo, também quem quer fazer do seu desejo controlado, mediado e autorizado pelo Costume o objetivo de sua vida também é escravo do desejo, porque o único desejo libertador é o do amor a Deus e ao próximo, a filiação e a fraternidade, nunca o matrimônio que só ajuda quem se compara ao inferior, como uma besta que requer a escravidão das rédeas e das disciplinas de um dono para não se autodestruir. O Apóstolo Paulo vê a grande vantagem de viver somente para Deus, tendo o próximo como seu irmão de viagem em direção à Eternidade, sem a necessidade de se pretender realizar uma felicidade que nunca foi destinada a este mundo. Sua recomendação é um ato de caridade.
#85 (2 Coríntios 11:20) “De boa vontade suportais os insensatos, vós que são tão sensatos! Suportai que vos escravizem, que vos tratem com soberba. Digo-o para vergonha vossa: poder-se-ia crer que nós é que somos fracos…” A lógica do psiquismo humano atribui sensatez e força à valorização dos elementos do mundo que governam a condição amaldiçoada e decaída do ser humano. Quem vive na Presença, porém, conhece a natureza da verdadeira sensatez e da verdadeira força, que residem na confiança em Deus. O Apóstolo Paulo denuncia aqui a boa vontade de pessoas que fingem que o mundo está bem governado por lideranças decentes e ordeiras. Ele sabe melhor, e deveriam saber também essas vítimas voluntárias da insanidade do mundo. São espíritos demoníacos que governam este mundo. E a insensatez daqueles que fazem pactos com esses poderes infernais é travestida e maquiada para que os seus súditos não se escandalizem. A história deste mundo é, portanto, uma farsa grotesca, um teatro sórdido. O Apóstolo, ele mesmo perseguido junto com Cristo por dar o testemunho do Evangelho da Liberdade, não precisa obedecer ao pacto de respeitabilidade da insanidade do mundo. E, tratado ele como fraco por não disputar poder e autoridade com demônios, o Apóstolo ainda esclarece: vocês é que são fracos por se deixarem governar por pessoas insanas que as escravizam e sobre as quais vocês não querem perder as aparências de jeito nenhum, porque admitir que foram dominadas por espíritos inferiores lhes seria a maior vergonha possível. Aqueles escravizados pelas doutrinas, idéias políticas e cultos religiosos dos dois lados da Dialética do Ouroboros tratarão os cristãos verdadeiros com empáfia e desprezo, mas eles é que vivem na vergonha da sua submissão a um teatro mentiroso.
#86 (2 Coríntios 12:9) “Basta-te a minha Graça, pois é na fraqueza que a força manifesta todo o seu poder.” Quem é como Deus? Que poder ou força é comparável à potência divina? Diante do Altíssimo só resta fraqueza, carência e dependência. O conhecimento disto, porém, depende da relação que cada criatura tem com os elementos intermediários que podem constituir alguma força ou poder ilusórios como independentes de Deus. O relacionamento saudável é o da submissão de todas as coisas à Graça divina. Como a Idolatria impera sobre a Terra, graças à cultura de Cativeiro que domina cada nova geração de escravos nascidos sob a Maldição, o caminho mais fácil para o reconhecimento da majestade divina e da necessidade da Graça é justamente a fraqueza da criatura. A força confunde. Qual foi o ser mais decaído de todos, senão a criatura que se exaltava acima de todas as demais, justamente o Portador da Luz? Ninguém foi mais tentado do que aquele que se julgava capaz de medir-se em seu brilhantismo sobrepujando a qualquer ser, pois este buscou medir-se com o Inefável e Abscôndito. Colocando a sua potência entre si mesmo e Deus, a criatura afastou-se e caiu. A força afasta de Deus. A fraqueza aproxima, como um recipiente vazio que se deixa preencher pois não presume ter por si a qualidade suficiente que lhe justifique o ser. O orgulho se acha forte mas termina fraco, enquanto a Humildade se apresenta como fraca, mas é a verdadeira força, porque clama por uma potência que é divina e invencível.
#87 (2 Coríntios 12:9) “Prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que pouse sobre mim a força de Cristo. Me comprazo nas fraquezas, pois quando sou fraco, então é que sou forte.” No que o homem se considera forte por si o que existe na alma é a cegueira, ingratidão e desconsideração com a ação da Graça divina, e de todos os subsídios amorosos do Criador que permitiram todas as capacidades e condições de qualquer vida, para não falar do próprio dom da vida em si, que é a manutenção no Ser provida pela concessão de Deus. Sendo assim, a lógica do Apóstolo Paulo é impecável, como costuma ser da parte deste que é o maior teólogo de todos os tempos, ao reconhecer que na nossa fraqueza fica muito mais fácil apropriar-se do Amor divino como criatura carente e necessitada, coisa que o “forte” também é, mas que se confunde pela mistura de causas intermediárias e próximas com as primeiras e mais distantes. Todos são fracos e dependentes de Deus. Mas a experiência consciente e assumida da fraqueza facilita o reconhecimento dessa realidade. O Orgulho, ou Presunção, é assim uma estupidez, derivada da Idolatria, que usa parte da própria Graça obtida para rejeitar a sua fonte, atribuindo valores e méritos à ação humana que está totalmente fundada como depositária do bem concedido pelo Amor divino. O orgulhoso põe o bem entre si e Deus, tomando posse do que não lhe pertence, como um ladrão, usurpador, mentiroso e traidor do Amor divino. O humilde, por outro lado, aproveita da sua fraqueza para aproximar-se de Deus com muito mais facilidade. Por isso a Humildade é tão crucial no relacionamento com Deus, pois esta converte os bens da vida em méritos divinos, o que abre espaço para a recepção amistosa de novos bens. Enquanto isso o espírito de Presunção faz o contrário e coloca Deus na condição injusta de reter benefícios para que a situação espiritual do beneficiário não fique pior ainda, porque o orgulhoso tem o poder malicioso de transformar o bem em mal no seu coração. Monadofilicamente a solução se dá com facilidade no reconhecimento da não substancialidade de nada fora das mônadas, de modo que fica evidente a exclusividade do relacionamento entre a mônada criada e a Incriada como fonte de todo o bem, uma aplicação filosófica da exata relação de unidade amorosa entre o Pai e o Filho.
#88 (2 Coríntios 6:14) “Não formeis parelha incoerente com os incrédulos. Que afinidade pode haver entre a justiça e a impiedade? Que comunhão pode haver entre a luz e as trevas? Que há de comum entre o templo de Deus e os ídolos?”
#89 (Gálatas 5:1) “É para a liberdade que Cristo nos libertou. Permanecei firmes e não vos deixeis prender de novo ao jugo da escravidão. Rompestes com Cristo, vós que buscais a justiça da Lei: caístes fora da Graça.” O Evangelho é a Revelação da Boa Notícia da Liberdade contra toda a escravidão: tanto a do pecado quanto a da Lei. Ambos escravizam, mas a Lei é pior, porque se o pecador é ignorante ou fraco, o legalista é soberbo e arrogante, e pretende comprar o Amor de Deus. As putas e os ladrões precedem aos legalistas na entrada do Paraíso. A Lei só é boa para o conhecimento do pecado, ou seja, para a ciência da necessidade de uma Salvação divina, porque diante de Deus ninguém é santo ou justo, e todos precisam da Misericórdia. O fraco pecador que é humilde e contrito está muito mais próximo do Espírito Santo de Deus do que o mentiroso legalista e religioso que acha que está em boas condições para receber a Salvação por méritos, virtudes e boas obras. Ora, há algum mérito, virtude ou boa obra que não tenha sido inspirado por Deus mesmo? Há alguma glória ao lado da divina? Não existe, e ao fim todos restam insuficientes e carentes diante de Deus. O legalismo é uma farsa e pior, uma ofensa contra a santidade divina, pela suposição de que a bondade do Altíssimo tem um preço de compra. A Lei, por si, só produz escravos. A Graça é quem produz filhos para o Deus vivo.
#90 (Gálatas 6:7) “Não vos iludais: de Deus não se zomba. O que o homem semear, isso ele colherá: quem semear na sua carne, da carne colherá corrupção; quem semear no espírito, do espírito colherá a vida eterna.” O engano do Pecado Original não é um detalhe menor, um vício entre outros, ou um mal-entendido qualquer. Há toda uma falsa teologia que quer fazer crer que este é o caso. E desta mentira se produz toda uma visão de mundo enganosa que confunde profundamente os seres humanos, pois impede o acesso à verdade mais simples e clara que qualquer um de nós pode reconhecer bastando que tenhamos coragem. E depois que vemos as coisas com o olhar simples, honesto, verdadeiro e sincero, não é possível deixar de enxergar o óbvio. O significado do Pecado Original é o verdadeiro esoterismo cristão que foi perdido, soterrado, escondido e camuflado. Mas a verdade triunfa na alma de seus amantes, e ao fim triunfará sobre todos. De Deus, afinal, não se zomba. Por mais forte que seja essa Idolatria das Obras da Carne, e da Família, quem pode disputar com Deus? Por mais que o ser humano decaído e amaldiçoado, essa humanidade zelosa das suas conquistas, méritos e proezas, construa impérios e culturas inteiras baseadas na sua usurpação da exclusiva autoridade divina de criar, como pode fazer frente ao Poder do Altíssimo e escapar da Sua Vontade? Os decretos divinos já determinam inescapavelmente o destino do homem: o que for semeado determinará o que será colhido. Da semeadura na carne só se colhe corrupção: foi alterado o dispositivo original em que a Natureza servia ao homem, e foi instalado um processo de limitação da maldade humana, pelo princípio que ordena a geração e a corrupção das criaturas. Mas Deus não abandona a sua Obra: ele colherá para a Eternidade os frutos daquilo que foi semeado no Espírito. Não há o que se confundir em termos da bondade da criação divina, sobre a qualidade do que é material, ou mesmo carnal, porque não é isso o que está em disputa. Tudo que se submete à bondade do Espírito Santo de Deus é bom, e foi assim que Jesus Cristo não só encarnou como Filho do Homem, mas ressuscitou em seu Corpo de Glória. Os dois Gnosticismos estão vencidos pela Liberdade do Evangelho: o da Legitimação da Mistura pela Cruz que destrói as Obras da Carne, e o da Rejeição do Limite pela Ressurreição que reafirma a bondade da criação divina. A pureza, afinal, é espiritual, e o carnal é apenas o fenômeno que se submete ou se rebela contra essa essência espiritual.
#91 (Efésios 1:18) “Que Ele ilumine os olhos dos vossos corações, para saberdes qual é a esperança que o seu chamado encerra, qual é a riqueza da glória da sua herança.” O coração é a sede, ou o símbolo, da Vontade, que gera em nós a Apetição por aquilo que é bom. Ora, o que é o bom? O bom é Deus, e a Graça de Deus para nós que é a parte de Sua Glória a qual somos destinados por participação em sua herança. O chamado do Apóstolo Paulo nos tira da mesquinharia e pequenez deste mundo, e nos leva à consumação dos bens dos quais experimentamos aqui apenas as primeiras primícias. Esta oração é cheia do testemunho do Dom do Louvor. Quanto mais nos entendermos como futuros usufrutuários da imensidão da Glória de Deus pela Eternidade, menos estaremos ligados às obsessões a respeito da vida presente, principalmente os bens tão passageiros e instáveis pelos quais muitos perdem a paz e a serenidade da vida na Presença: principalmente dinheiro, saúde, reputação, fama, poder, etc. De que adianta, como diria Jesus, ganhar o mundo cheio dessas coisas, mas perder a sua vida, isto é, a sua Eternidade com Deus onde estão os verdadeiros bens imortais destinados a nós? É a pior relação de troca possível, um engano feito por um inimigo invejoso e maligno para trapacear e afastar os filhos de seu Deus. Nem seria necessário que o Apóstolo dissesse isso depois que Jesus mesmo já declarou que não se deveria se preocupar com nada além de buscar o seu Reino (a Eternidade) e a sua Justiça (o Amor a Ele e ao próximo). Mas a oração paulina quer que Deus nos mostre a razão de tudo isso. Sim, ter fé é crer no que não ainda não se vê, mas que se espera, mas isto não é um segredo obscuro, e a nossa fé não é cega. Como num noivado, recebemos presentes suficientes de um Noivo que nos atrai com sua Glória para um destino perfeito. É assim, através do Dom do Louvor, que se converte espiritualmente os desejos da vida presente, que tão frequentemente atormentam e escravizam os seres humanos, em deleitosas promessas experimentadas como primícias dessa Eternidade com Deus. A quem sabe aproveitar a sabedoria da Cruz, a vida neste mundo já pode ser uma caminhada muito mais tranquila, cheia de consolações e agrados do Senhor aos seus amantes. Mas isto é só para quem pode se incluir na oração de Paulo, nesse desejo no espírito do Louvor.
#92 (Efésios 2:8) “Pela Graça fostes salvos, por meio da fé, e isso não vem de vós, é dom de Deus; não vem das obras, para que ninguém se encha de orgulho.”
#93 (Efésios 4:17) “Não andeis mais como andam os demais ignorantes, na futilidade dos seus pensamentos, com entendimento entenebrecido, alienados da vida na Presença de Deus pela sua ignorância e pela dureza de seus corações. Tendo-se tornado insensíveis, entregaram-se à dissolução.”
#94 (Filipenses 1:21) “Para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro. Se o viver aqui me dá ocasião de trabalho frutífero, não sei bem o que escolher. Meu desejo é partir e ir estar com Deus, pois isso me é muito melhor, mas o permanecer aqui é mais necessário por vossa causa.”
#95 (Colossenses 2:8) “Tomai cuidado para que ninguém vos escravize por vãs e enganosas especulações da filosofia, segundo a tradição dos homens, segundo os elementos do mundo, e não segundo Cristo.” A razão humana repercute as potências de um intelecto limitado. Esta razão, que por sinal só opera com a concessão da iluminação divina, pode voltar-se para a sua fonte transcendente que foge ao seu controle, ou se dispersar pelos elementos inferiores que se submetem mais docilmente às suas próprias operações. A primeira medida, centrípeta, vai do nominável, que é o logos humano, ao cognoscível, e do cognoscível ao possível, e então encontra o que Kant chamaria de “O Incondicionado”, o próprio Logos divino. Já a segunda medida, centrífuga, se afasta cada vez mais do Mistério do Ser que incomoda o espírito de Pretensão da soberba da razão humana, e busca o domínio do ser dentro do patético esforço dentro dos limites do logos humano. Este tipo de filosofia, idólatra do homem e da natureza, só escraviza o homem ao próprio homem e à sua razão, posiciona-o como um prisioneiro do mundo no qual vive (daí que é tão comum a Filosofia se tornar uma prática gnóstica), e obstrui o caminho contrário que seria a chave para reconhecer as razões e finalidades maiores do Ser. O alerta do Apóstolo Paulo não é antifilosófico, porém, como alguns poderiam interpretar. Ele é claro: o que escraviza é a filosofia segundo a tradição dos homens e os elementos do mundo, tradições e elementos que contrariam a liberdade trazida por Cristo. Como que o amor pela sabedoria poderia ser contrário a Cristo por essência, se Jesus mesmo é o Logos divino, a própria sabedoria divina? O problema é o amor pela falsa sabedoria representada por essas tradições humanas que negam a Cristo, e que negam a transcendência de Deus diante da natureza e dos seus elementos. Uma filosofia cristã não só é viável como é até necessária justamente para se fazer combate contra as pretensões da razão humana que quer trair o seu próprio fundamento. Que nenhuma boca se abra para alegar a irracionalidade da Fé, e que para isso os filósofos cristãos se prontifiquem, em cada geração, para dar o seu melhor testemunho. Este, sendo fiel à liberdade do Evangelho, fará guerra contra as filosofias dos escravos.
#96 (Tiago 2:12) “Falai e agi como os que hão de ser julgados pela Lei de Liberdade, porque o julgamento será sem misericórdia para quem não pratica a misericórdia. A Misericórdia desdenha o Julgamento.” Quem quer receber a Graça deve permitir que a mesma alcance todos os outros irmãos e irmãs que se encontram igualmente carentes. Nossas palavras e nossas ações devem ter em vista essa magnanimidade do Amor divino em favor de todos nós. Se começarmos a distinguir, falsamente, entre aqueles que merecem mais ou menos, nos colocaremos a nós mesmos de volta naquela antiga condenação gerada pelo espírito de Acusação da Religião, o Culto do Diabo. O Juízo de Deus é sagrado porque Deus a tudo pode remediar e compensar, exceto a obstinação contra o seu Amor da parte de um arbítrio decidido. Ninguém pode ser excluído da Salvação senão por sua própria decisão. Esse é o tamanho da Misericórdia de Deus. O que é a Lei de Liberdade? É o ordenamento que Deus mesmo instituiu para que todas as mônadas criadas experimentem a sua própria decisão de escolher entre o bem e o mal. Quem somos nós para interferir nessa arbitragem instituída por Deus? Somos apenas árbitros de nossas próprias escolhas. O que podemos fazer é ordenar nossas vidas em particular e em sociedade de modo a que a mutualidade das liberdades sejam garantidas. Se o próximo quiser se destruir e ignorar qualquer instrução ou conselho, ele vive a sua liberdade de fazê-lo, e isto foi provisionado pela Providência desde a Eternidade. De qualquer modo nenhum de nós ficaremos arrestados para sempre na atual condição, nem em nossos erros, e nem na presença dos erros alheios. Não é tão difícil, tendo isso em conta, fazer mais o bem do que dar testemunho de uma condenação que nos pertence. Consolar, remediar, perdoar, colaborar, apoiar, tudo isto se assemelha muito mais à ação do Espírito Santo do que a maldita acusação religiosa, moralista, velhaca e apodrecida. Em pior condição se encontram aqueles que desejaram posições de poder sobre o próximo, pois isso os condiciona aos seus respectivos deveres de estado, como pais, chefes, mestres, governantes, juízes, etc. É muito mais fácil, assim, ter misericórdia e praticar a Lei da Liberdade desde uma posição desarmada, sem a disputa de poder e autoridade. Em qualquer caso, quem se coloca na posição de juiz sem ter o correspondente poder de perdoar, usurpa o lugar do Trono do Altíssimo.
#97 (2 Pedro 3:11) “Se este mundo está fadado a se desfazer, qual não deve ser a separação do vosso viver? O que nós esperamos, conforme sua promessa, são novos céus e nova terra, onde habitará a Justiça.”
#98 (1 João 2:22) “Quem é o mentiroso, senão o que nega que Jesus é o Cristo? Eis o Anticristo, o que nega o Pai e o Filho. Todo aquele que nega o Filho também nega o Pai. O que confessa o Filho, também possui o Pai. Nisto reconhecereis o espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio na carne é de Deus. Todo espírito que não confessa Jesus não é de Deus, este é o espírito do Anticristo.” O Apóstolo João presta um serviço excepcional dando um testemunho que vale para duas situações críticas na vida do cristão: como separar quem é cristão de quem não é, e como reconhecer a atuação do espírito do Anticristo. O critério de reconhecimento do cristão pelo ponto de vista religioso é confuso e inviável, porque um prosélito acusará o outro por não pertencer ao seu clube, etc. João resolve isso: cristão é quem reconhece que Jesus Cristo é o Filho de Deus. Pessoas que desconhecem a Revelação cristã ou que receberam um Evangelho desqualificado pela operação religiosa estão isentos, incluindo ateus e agnósticos que se omitam de um juízo peremptório a respeito. Por outro lado, o espírito do Anticristo é aquele que sem recurso à própria ignorância produz a afirmação, direta ou indiretamente, de que Jesus não é o Filho de Deus. A base da aplicação deste critério é a própria essência da Revelação cristã: Deus é revelado como Pai pelo próprio Filho, de modo que quem não recebe o Filho rejeita também o Pai, e recusa portanto a relação filial com Deus que só se pode dar através do Amor divino. Apenas Jesus revelou de modo pleno e através de seus atos que Deus é Pai e que nos ama. Quem não quiser se relacionar com Deus como Pai não pode receber o Amor divino na sua plenitude, e assim resta frustrado o propósito da vida humana. Mas como pode alguém se relacionar com o Pai se rejeitar o Filho que O revelou? Isto é impossível, já ressalvados os casos de ignorância invencível.
#99 (1 João 4:10) “Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi Deus quem nos amou primeiro.” Amar a Deus, o Primeiro Mandamento, não é um ato criativo ou uma iniciativa humana, mas sim um ato de Justiça. É a contrapartida como reconhecimento da atuação gratuita e amorosa de Deus que em primeiro lugar concedeu a vida, e além disso também todos os bens da vida, de maneira independente de qualquer ato humano. A consciência da criatura começa a reconhecer a qualidade da ação divina aos poucos, tomando das coisas e dos elementos as causas mais imediatas até chegar às mais remotas, e finalmente encontra a necessidade de uma bondade pura, não provocada e não justificada fora da sua própria qualidade, ou seja, sem outra motivação fora de si mesma. Até mesmo o ser que se encontra aparentemente desprovido de qualquer benefício atual é capaz de assumir o valor da bondade que lhe falta e exaltar, assim, o Criador que criou ao menos a sua condição de possível beneficiário de quaisquer bens.
#100 (Apocalipse 3:8) “Tens pouca força, mas guardastes minha Palavra, e não renegastes o meu Nome. Forçarei os da Sinagoga de Satanás, que parecem fiéis mas não o são, que prostrem-se a teus pés e reconheçam que te amo. Visto que guardaste minha palavra de perseverança, também eu te guardarei da hora da provação que virá sobre o mundo inteiro, para submeter à prova os habitantes da Terra. Venho logo! Segura firme o que tens, para que ninguém tome a tua coroa!”
#101 (Apocalipse 12:10) “Agora realizou-se a Salvação, o poder e a realeza do nosso Deus, e a autoridade do Cristo: porque foi expulso o Acusador dos nossos irmãos, aquele que os acusava dia e noite diante do nosso Deus.”
#102 (Apocalipse 21:5) “Eis que eu faço novas todas as coisas. As palavras são fiéis e verdadeiras, se realizaram! EU SOU o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim. A quem tem sede eu darei gratuitamente da fonte de água viva. O fiel receberá esta herança, e eu serei seu Deus, e ele será meu filho. Quanto aos covardes, aos infiéis, aos corruptos, aos assassinos, aos impudicos, aos magos, aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua porção se encontra no lago ardente de fogo e enxofre, que é a segunda morte.”
#103 Definição de Monadofilia: é uma filosofia cristã que propõe o Amor pela Unidade, que é a forma e a bondade do Ser. Sendo a Singularidade inefável senão para um Intelecto infinito (divino), a única relação possível entre o ser finito e o infinito é o de amor como contemplação, confiança e repouso, atos antes volitivos do que intelectuais. O Uno, que transcende infinitamente, na sua completude, a capacidade de um intelecto finito, só pode ser objeto de Amor e não de Gnose. Seu conhecimento sempre se expande, da parte do intelecto finito, mas nunca alcança aquilo que a vontade completa por sua crença voluntária sobre a essência da Unidade. Daí o moto da Monadofilia ser: Coram Uno Amor Tantum (Diante do Uno, apenas o Amor). Uma Unidade cognoscível ao ser contingente perderia sua essência e integridade, e se reduziria apenas a uma imagem do Ser da Unidade, como ocorre com as idolatrias da Natureza e do próprio Homem. O Uno só pode ser conhecido, assim, através do amor que completa por desejo voluntário aquilo que o intelecto finito alcançou no seu limite. Essa é uma aplicação direta das súmulas do Evangelho: “Ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11:27), “Ninguém vem ao Pai a não ser por mim” (Jo 14:6), “A vida eterna é esta: que eles te conheçam, a ti, o único Deus verdadeiro, e àquele que enviaste, Jesus Cristo” (17:3), “Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: Eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim” (Jo 17:22) e “Eu lhes dei a conhecer o teu nome e lhes darei a conhecê-lo, a fim de que o amor com que me amaste esteja neles e eu neles” (Jo 17:26). A Monadofilia se realiza concretamente antes de mais nada na forma de amor-próprio (M. Primeira) que descobre a amabilidade do eu e o limite contingenciado da sua capacidade de alcançar um bem, o amor a Deus (M. Maior, ou Primeiro Mandamento) que soluciona o limite interno do amor-próprio, e amor ao próximo (M. Menor, ou Segundo Mandamento) que reconhece no outro um eu tão amável e destinável ao amor a Deus quanto a do nosso eu próprio. Todo amor é amor à Deus. Os objetos contingentes do amor são apenas veículos da Bondade divina que contém exclusivamente toda a amabilidade possível. Assim, no amor próprio da Monadofilia Primeira descobrimos o amor a Deus na forma do amor pela própria integridade e amabilidade do eu. A integridade é percebida pela continuidade do sujeito diante da simultaneidade e da sucessividade das Percepções, e a amabilidade pela Apetição das Percepções. Amando em si a imagem e a semelhança a Deus, iniciamos a descoberta do amor a Deus. No caso do amor ao próximo, a idéia de que João ama Maria significa, elipticamente, que João ama a Deus na forma de Maria como reflexo de João.
#104 Liberdade Primeira (Contra a Libertinagem e o Costume): O Costume, que protege contra o mal maior da escravidão da Libertinagem (o desejo da Liberdade sem a busca do Bem), se torna ele próprio uma forma de escravidão que aliena a verdadeira Liberdade que é a de não agir senão voluntariamente e de forma consciente e responsável. Livre não é quem faz tudo o que quer, e nem quem aliena sua vontade à uma vontade exterior, mas quem domina a própria vontade sem se deixar escravizar por nada, nem pelo desejo e nem pelo Costume. Livre é quem vive pela Graça, sem ser escravo nem do Pecado e nem da Lei. A prática do Costume gera a falsa segurança da autoimagem de um papel social em substituição à verdadeira liberdade, explorando a insegurança psicológica derivada da indeterminação da singularidade monádica, enquanto a alma ainda não possui a firmeza da confiança no Amor divino. O aceite voluntário dos pesos autoimpostos pela crença no valor benéfico dos costumes oprime a alma e a impede de considerar a verdade do Amor, já que a mentira dos falsos bens foi comprada ao caro preço de muitos sofrimentos e sacrifícios. Quem deseja contemplar as proposições da Monadofilia deve possuir tempo livre para estar desocupado em paz, para ser nutrido na liberdade e no ócio, o que não é possível sem o Realismo Responsável que aceita apenas a determinação dos Deveres de Estado, sem a invenção de ficções. A Filosofia não é um privilégio, mas uma responsabilidade. Exige a dispensa, pela liberdade anterior, às várias ambições que são contraditórias com a busca da verdade e o amor pela sabedoria divina. Requer a paciência de suportar a separação e, portanto a indiferença, o desprezo, etc. A nutrição a partir do Intelecto divino requer a abertura interessada que se baseia numa integridade moral que se reflete na honestidade, na entrega, na renúncia às glórias do mundo, etc. A liberdade primeira é interior, e depois exterior: liberdade contra as ilusões do mundo. Esta é uma experiência da guerra do Amor contra o Poder: a vitória do desejo de contemplar o Ser sobre o desejo de dominá-lo. Esse conflito já antecipa a superação da Dialética do Ouroboros que captura os instintos de obediência e rebelião para impedir a verdadeira Liberdade através, respectivamente, da escravidão da Libertinagem e do Costume.
#105 Liberdade Segunda Contra o Culto do Nada (Niilismo): A crença no não-ser, ou no Nada, é impossível desde que a sua consideração sempre parte de algo que tem alguma participação no Ser. Além disso, é necessário afirmar preliminarmente a bondade do Ser pelo corolário da razão de qualquer condenação possível do Ser: se seria melhor o não-ser, é porque algum ser possível seria mais conveniente, portanto o desejo pelo não-ser é o desejo pelo ser.
#106 Liberdade Segunda Contra o Culto do Caos (Cacolatria): Requer-se admitir a impossibilidade de se validar a primazia do Caos desde um intelecto que só compreende o que é ordenado, além da improbabilidade de que de um plano superior menos ordenado, ou não ordenado, possa ter saído um plano inferior que tenha relativamente maior ordem interna, pela tendência decadencial de qualquer sistema (entropia). O Caos é um conceito derivado da recusa da Humildade diante da ignorância, gerando sobre o Ignorado, na perspectiva antropocêntrica, a projeção de um suposto elemento caótico que se define deste modo por estar além do campo da nossa inteligibilidade. O mesmo ocorre, também psiquicamente, na projeção psicologista do chamado Inconsciente. A abordagem espiritualmente humilde (teocêntrica) do Ignorado é aquela que o trata não como Caos ou Inconsciente, mas como Mistério. A Cacolatria é permissível enquanto crença, desde que o agente moral que adere a esta concepção a assuma como escolha por sua própria conta e risco, o que no contraste entre a limitação de um intelecto finito e criado diante da Onisciência de um intelecto infinito e perfeito não faz sentido algum.
#107 Liberdade Segunda Contra o Culto da Natureza (Naturalismo): Submissão de qualquer ordenamento de uma Lei Natural à uma instância transcendente que produza essa ordem sem ser limitada ou definida por ela. Inclui a escravidão aos psiquismos fatalistas de esquemas simbólicos como os da Astrologia, Psicologia, etc. As categorias aprendidas pela experiência das Causas Eficientes devem ser repensadas como modos contingentes de produção de seus efeitos, especialmente as categorias de Causalidade, Irreversibilidade e Escassez. As únicas Causas Eficientes necessárias devem ser aquelas imediatamente vinculadas à produção de efeitos que contenham bondade inerente nos objetos da Percepção, ou seja, à serviço exclusivo das Causas Finais. Evita-se, assim, a grande tentação da Idolatria naturalista que atribui falsamente bondade a qualquer manifestação que não seja inerentemente boa enquanto objeto de Percepção, e separa-se os meios contingentes das finalidades que se justificam eternamente, por exemplo: separação da propriedade nutritiva dos alimentos da satisfação do paladar, ou a separação da capacidade reprodutiva do uso dos órgãos sexuais para a satisfação do tato, etc. As Liberdades Segundas afastam os falsos objetos de adoração que impedem a adoção do princípio do Sumo-Bem, ou Condição do Escolhido, para a contemplação dos objetos de estudo da Monadofilia. Quem trata a Natureza como Deus ou como divina produz um limite artificial e indevido à essência divina que, por ser infinita, transcende completamente tudo o que é criado. A Natureza é apenas uma criação de Deus, uma amostra de Seu Poder, uma fração de sua majestade, de sua potência divina. A criação só serve para a adoração do Criador que a ultrapassa infinitamente. Sobretudo os processos causais e as leis internas da Natureza criada são gerados por conveniência, e não por necessidade. O que é necessário e imutável é o propósito benéfico que flui da essência amorosa do Criador. Quem toma as leis naturais como reflexos das leis divinas faz uma interpretação absurda, desejando medir o maior pelo menor, ou pior ainda, tentando medir o imensurável pelo mensurável. Só é possível compreender a bondade das leis naturais e da própria Natureza como um todo ao se observar a mera conveniência dessa criação para propósitos superiores que usam desses recursos como um artesão usa de ferramentas que não constituem, por si, a finalidade de sua arte. Sobretudo, com o dom da Presença, e com a consciência da realidade exclusiva da Mônada, ou Substância Simples, compreende-se que a Natureza é um mero reflexo do intelecto da verdadeira criatura, e que Deus criou o mundo para o homem, e não este como parte daquele.
#108 Liberdade Segunda Contra o Culto do Homem (Humanismo, Antropolatria): Sendo o homem presente necessariamente ignorante, fraco e mau, em qualquer escala ou medida que seja, a sua forma substancial possui uma definição que é incompatível com qualquer ideal de passado ou de futuro que viole esse limite.
#109 (M. Indiferenciada) Substância Simples: Unidade ontológica ou metafísica sem partes, necessária para qualquer composição possível de ser ou manifestação. Também chamada de Mônada. Por não ter partes, não pode ser nem composta nem decomposta, não pode ser gerada nem corrompida, só pode ser criada ou aniquilada. A substância verdadeira é a sede da experiência consciente do Ser de ambos os lados do processo: é o que conhece e o que é conhecido, visão (nous) e visão da visão (noesis noeseos). As diferenças infinitas entre as escalas das mônadas, entre a Incriada e a criada, são tratadas de acordo com suas particularidades. A Unidade é viva, com suas propriedades intelectuais e volitivas, e experimenta a si mesma como Multiplicidade. Qualquer outra configuração do Ser que não se basear na simplicidade da Mônada requer explicações posteriores que alcancem a redução à uma simplicidade equivalente à da Mônada. Por outro lado, a atribuição de quaisquer propriedades além da simplicidade e das capacidades intelectual e volitiva, como extensão, quantidade, ou qualquer qualidade formal além da forma da Unidade, também exigem novas explicações e reduções que alcancem o nível da simplicidade mais perfeita. Agora, porque se deveria atribuir qualquer qualidade ou quantidade que compõe o Múltiplo ao Uno, senão por um desejo de Idolatria, isto é, de atribuição de substancialidade ao que não convém? O desafio de reconhecimento da Substância Simples é o de que ela jamais poderá ser experimentada na sua integralidade à não ser pelo Intelecto divino que, por ser infinito em ato, é capaz do conhecimento total. Logo, cabe à monada criada aceitar que o seu conhecimento da Unidade se dará pelo reflexo na Multiplicidade, e que não poderia ser de outra maneira, dado o limite do seu intelecto criado. Não é porque só conhecemos partes do Ser que o Ser não é íntegro, ou que nossa experiência não tem valor. Na verdade, com Humildade, aprendemos a apreciar o valor de nossa experiência de Deus. Mas, para o soberbo, a Humildade é uma humilhação.
#110 (M. Indiferenciada) Relação entre o Uno e o Múltiplo, Reflexividade Monádica: A Unidade, sendo a forma do Ser, possui como matriz, em sua singularidade, a potência infinita de qualquer ser derivado de sua substância, ou seja, de todas as formas da Multiplicidade. Assim como o Um, na matemática, é a matriz de todos os múltiplos e de todas as frações possíveis, ou o Ponto, na geometria, é a matriz de todas as linhas e superfícies possíveis, ou ainda o Princípio de Identidade, na lógica, é a matriz de todas as proposições possíveis, a Unidade é, na metafísica, a forma de todo ser possível como derivação parcial e desdobrada de sua essência. Isto quer dizer que sendo a mônada, ou a substância simples, o único ser real, ela produz a partir de si mesma toda a manifestação de seres possíveis que serão conhecidos por seu próprio Intelecto como imagens vistas em reflexo. Nenhuma experiência da realidade pode ser explicada sem contradição interna a não ser através do fenômeno da relação entre o Uno e o Múltiplo, pois a unidade entre o conhecedor e o conhecido permanece terminantemente obscura e inexplicável, a não ser que se aplique a idéia da reflexividade monádica. E mesmo nenhuma teoria ontológica sobre a consistência do que é real poderia ser íntegra sem relacionar cada parte do ser a uma unidade integradora que explique o ser das coisas desde uma perspectiva unificante, donde derivaram inclusive os conceitos supremos das melhores filosofias antigas, como Sumo-Bem platônico ou o Primeiro Motor Imóvel aristotélico, até alcançarmos a sofisticação e clareza do Uno plotiniano. Teologicamente, o Apóstolo Paulo dá o testemunho da unidade de todas as coisas em Deus: “nele somos, nos movemos e existimos“. E mais ainda, Jesus mesmo testemunha: “Eu lhes dei a glória que me deste para que sejam um, como nós somos um: Eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como amaste a mim“. Em outra parte, e aqui encontramos talvez o testemunho bíblico mais claro a respeito da mônada, Jesus também afirma: “O Reino de Deus está dentro de vós“. Poder-se-ia interpretar isto num sentido espiritualista, do ponto de vista da explicação a respeito dos estados de ânimo da psique humana, mas é perfeitamente viável a aplicação de uma visão metafisicamente mais profunda.
#111 (M. Indiferenciada) Intelecto-Percepção: A Mônada intelige, à partir da sua Unidade, a si própria como objeto de Percepção. Seu Intelecto produz a sua Percepção. Gnosiologicamente, ou processualmente, todo conhecimento pode ser entendido como holográfico, isto é, um conteúdo de consciência para um observador, sem a necessidade da multiplicação dos supostos seres que compõe a Percepção.
#112 (M. Indiferenciada) Vontade-Apetição: Sendo o Bem a forma do Ser, A Mônada deseja perceber a si mesma. Sua Vontade produz a sua Apetição, que é o amor pelo que é bom.
#113 (M. Incriada) Infinitude: Possui a infinita capacidade de realizar seu Intelecto e, portanto, também a sua Vontade. O Ser Infinito é necessário desde que qualquer ser seja evidenciado na sua contingência, desde que se o Limite que determina qualquer ser particular não pode fazer parte da sua Forma, deve haver uma Substância Primeira infinitamente em Ato que determina todos os demais possíveis, ou nenhum ser jamais seria atual.
#114 (M. Incriada) Suficiência: Realiza a Percepção e a Apetição em si mesma de forma total, e assim conhece e é conhecida em si mesma, e ama e é amada em si mesma (possui luz própria). Como tanto sujeito quanto objeto dos atos de conhecimento e de amor precisam ser reais, a suficiência da Mônada Incriada implica na constituição do Deus Triuno, Pai, Filho e Espírito Santo.
#115 (M. Incriada) Imobilidade: Realizando-se em si mesma plenamente, não se move da potência ao ato. O Ser divino como Ato Puro não tem potência, apenas atualidade. É capaz disso pela qualidade de sua infinitude. Do mesmo modo, não se define e não se restringe por nenhuma dimensão compreensível pelos intelectos criados, porque não há dimensão capaz de conter a infinitude, sendo toda dimensão um tipo de limite com a função de determinar a Percepção dos intelectos criados, como o tempo para a sucessividade, o espaço para a simultaneidade, etc. Deus não muda porque não pode e nem precisa mudar, de modo que toda atuação “fora” de si mesma é por total gratuidade (amor puro). O que é potencial “fora” de Deus não é realmente exterior ao Ser divino, mas é separado e mantido analogicamente. Assim, Deus não amplia o seu Ser com a sua Criação, apenas gerando analogias limitadas em imagem e semelhança a Si. Essa é a sua relação com a mônada criada. Toda criação é absolutamente analógica, em nada modificando o Ser da Mônada Incriada, por existir cada qual em sua própria Singularidade exclusiva e separada. Deus como Criador e governador de sua Criação através da Providência age pelos movimentos das mônadas criadas que exploram suas potências próprias. A influência divina é contínua e total, sendo Deus a Luz da luz, e sem alterar a sua qualidade e efetividade. A aparente alternância do fenômeno divino decorre dos movimentos da mônada criada, especialmente na variação pela Nitidez dos objetos e pela Cristalinidade dos sujeitos. É uma derivação da relatividade das criaturas em face da absolutez do Criador. Deste tipo de relação é que parece que se experimenta o suposto “movimento” divino. Quando se afirma que Deus abençoa ou interfere, essa influência sempre foi Presente, cabendo a alternância ao ente criado que varia e se move por sua ação própria. Já os limites que condicionam e limitam a forma substancial das mônadas criadas e de suas dimensões são eternamente definidos e inalteráveis. Quando uma mônada é criada? Tecnicamente, desde a Eternidade, pois se sua forma substancial com todos os seus limites não fossem definidos desde sempre, Deus seria movente em sentido impróprio, como agente que não era feitor e que se tornou por seu ato. Todas as mônadas possíveis já foram eternamente criadas como potências acabadas, com sua estrutura formal, ou forma substancial, levada ao limite de sua perfeição. E todas as suas atualizações estão compreendidas pelo Intelecto divino, porque são derivações limitadas da própria atualidade de Deus. Aquilo que observamos na dimensão do tempo é a atualização dessa potência particular desde o ponto de vista de quem experimenta o mesmo limite dessa dimensão. Daí é que temos a impressão de que Deus faz isto ou aquilo, como se se movesse, mas o que se move é a mônada criada em relação às suas potências, e inclusive na sua relação com o Criador. A criação de Adão, por exemplo, não implica na entrada de Deus na dimensão do tempo. Adão foi criado desde sempre, e toda a sua vida, inclusive na Eternidade, está intuída pela Mônada Incriada. Foi o próprio ser de Adão que só percebeu sua criação e existência na dimensão da sucessividade quando isto convinha ao seu próprio intelecto, e desde este ponto de vista pareceu-lhe que Deus agiu, movendo-se desde uma potência de Criador para a atualidade de Criador num dado momento. Tudo o que Deus fez ou disse, Ele o fez ou disse desde a Eternidade. Nós é que conhecemos essas realidades desde nossas posições dimensionalmente limitadas. Quando se afirma que Deus é a “Rocha”, em última análise é a este grau de Permanência e também de Totalidade que se refere. Por outro lado, quando se afirma que Deus está vivo, esta vida contém todas as atualizações eternamente realizadas no Ser divino e que experimentaremos como movimentos parciais na nossa própria posição relativa à infinitude de Deus.
#116 (M. Criada) Finitude: Possui Intelecto limitado, capaz de realizar uma Percepção limitada, tanto quanto uma Vontade limitada, capaz de produzir uma Apetição também limitada. Enquanto pela forma substancial da mônada tanto o Criador quanto a criatura possuem igualmente a mesma potência, sua atualidade diverge radicalmente, pois a Mônada Incriada possui plena atualidade da sua forma, enquanto a Mônada Criada não é capaz de atualizar-se por si, recebendo o movimento pelo ato da Mônada Incriada na medida do limite suportável e conveniente para a criatura. A limitação intelectual se refere a um termo que restringe os compossíveis, isto é, as atualizações que podem produzir percepções simultâneas num dado momento, e que permite a expansão ilimitada da experiência da criatura através da sucessividade: assim, por força desse termo, a Mônada Criada experimenta o Ser desde uma posição nas dimensões funcionais da sua Percepção no espaço e no tempo. E a limitação volitiva produz uma Apetição que fará a eleição de algumas entre todas as potências de Percepção, o que torna o escopo limitado dos produtos intelectuais conveniente para a Mônada Criada. Como não é possível o Ato Puro fora de Deus, nenhuma criatura poderia participar totalmente da intelecção e da volição divinas, pois a comunicação da infinitude do Criador significaria sempre a dissolução, ou extermínio, da forma substancial de qualquer criatura que se define pela finitude das suas propriedades atuariais. Assim, a potência monádica é a mesma para quaisquer mônadas, mas a atualidade é diferenciada justamente para que seja possível a Deus produzir uma criatura que participe da sua bem-aventurança, explorando a mesma potência de Ser desde uma perspectiva limitada que permita essa vida própria.
#117 (M. Criada) Insuficiência: Não atualiza sua potência por si mesma, dependendo do movimento criativo da Mônada Incriada que realize sua Percepção e Apetição. Precisa ser criada e mantida em operação pela substância divina (não possui luz própria).
#118 (M. Criada) Mobilidade: Por perceber e apetecer dentro de seu limite, move-se da potência ao ato de seu Intelecto e Vontade, produzindo sucessivas percepções que são também sucessivamente apetecidas. Gera em seu Intelecto as dimensões necessárias para a função da sucessividade, como tempo, espaço, etc. A diferença entre Unidade e Multiplicidade, entre o Ser e o Vir-a-Ser, se realiza na experiência do Limite do intelecto da mônada criada. A sua Percepção intui a totalidade e a experimenta parcialmente, nas dimensões da simultaneidade espacial e da sucessividade temporal, como jornadas de descoberta para dentro da Glória divina. Ter vida, para a mônada criada, é conhecer continuamente a Deus: descobrir e redescobrir, maravilhar-se reiteradamente, mover-se desde uma Percepção apetecível até a próxima. Embora na Mônada Incriada a Percepção seja total, correspondente à infinitude do Intelecto divino, o desejo pelo mesmo grau de experiência da parte da mônada criada constitui apenas um desejo de morrer, de não-ser. Mas este desejo é antinatural no sentido mais sagrado do termo: ilógico, irracional. Quando foi, afinal, que uma mônada criada possuiu realmente a Apetição pelo conhecimento supremo, se nenhuma experiência análoga poderia jamais ter se realizado em seu intelecto finito e limitado? Essa busca é a projeção de uma soberba desmedida, um ato moral sem relação nenhuma com a experiência da vida real. Eis que o gnosticismo da Rejeição do Limite se mostra como um desejo irracional de morte e autodestruição, afirmando que não-ser Deus constitui um mal, ainda que a realidade mostre que, ao contrário disso, nenhum outro bem seria viável a uma criatura senão o de não-ser Deus. Se um intelecto limitado contempla a possível bondade do Ser e a deseja, como poderia se relacionar com este alvo senão desde a sua posição concreta de finitude? Não teria sequer a primeira coerência de sua própria agência moral como sua mesma, individuada, se não fosse o conforto e a segurança da sua permanência dentro de seu Limite. A realidade da mônada criada é a da sua Mobilidade, a relação amorosa de Percepção e Apetição que a Unidade realiza no conhecimento contínuo de seu próprio reflexo.
#119 Mútua Representação: Conceito ontológico da reciprocidade da intelecção das Mônadas criadas produzida pela Iluminação divina. É a mutualidade das mônadas “sem janelas”. Como a mônada não percebe nada fora do seu próprio reflexo, a iluminação divina garante, através de um equivalente à Harmonia Pré-estabelecida de um sistema mecanicista (como o leibniziano), a correspondência das percepções equivalentes para as mônadas criadas que participam de uma mesma realidade. Essa condição garante a veracidade da experiência moral das mônadas. Um sistema de pura Simulação poderia ser mais simples, por também ser holográfico, mas seria inconveniente sob o aspecto do valor das decisões dos agentes livres. Não pode haver farsa na realização da Liberdade das mônadas. Por isso a Mútua Representação resolve a questão do plano moral das agências dos seres livres, sem violar a integridade da inviolabilidade das mônadas em si mesmas. Isto tem efeito em vários planos, mas especialmente na validade dos testemunhos para o Dia do Juízo, ou Segunda Ressurreição: cada vida trazida ao momento da última revelação terá o efeito de uma declaração válida e inegável sob qualquer aspecto.
#120 Teleologia Metaracional do Sumo Bem (TMSB): Admissão da conveniência intelectual do Bem como forma e causa final do Ser cuja demonstração é impossível desde que a Mônada Incriada não pode ter sua essência conhecida pela mônada criada, sendo portanto objeto de Vontade, antes do que do Intelecto, objeto de contemplação amorosa, e não de conhecimento. Dado, porém, que a forma substancial da própria mônada criada possui a Vontade que produz a Apetição, convém que o Ser corresponda a esta propriedade. Pelo autoconhecimento o ser criado reconhece no Incriado o que convém que dele seja postulado, ainda que jamais possa ser dominado, isto é, o seu amor criativo. Desse conceito derivamos o do Idealismo Transcendental que exige, pela combinação da TMSB com a Monadofilia Primeira, o imediato reconhecimento da tremenda limitação, corrupção e decadência da presente condição humana em face do ideal inspirado em nós pelo Espírito Santo.
#121 Coruscância: A plenitude da realização da mônada criada, e o seu destino, é a perfeita adequação da sua Percepção à sua Apetição, e da sua Apetição ao que lhe convém (“querer o que de deve e ter o que se quer”), o que requer que a Mônada Incriada lhe propicie essa realização por comunhão com a sua infalibilidade. Isso é a vida eterna, ou paradisíaca, também chamada de Salvação: a sucessão ilimitada das percepções adequadas às apetições da mônada num estado de perfeição.
#122 Eleuteriodiceia: Como o estado paradisíaco da Coruscância requer a perfeição absoluta, sem defeito, é necessário que a mônada criada, por ter Vontade livre, queira realizar esse estado. Mas não é possível escolher livremente a Coruscância na própria experiência da mesma, que por ser sem defeito não poderia ser rejeitada livremente. Isso significa que a realização da Coruscância requer uma experiência prévia de um estado anterior de Mistura entre o Bem divino e a sua ausência, a imperfeição que chamamos de Mal (também chamada de Mistura de Luz e Trevas), na medida necessária para que a mônada criada conheça o seu próprio arbítrio de escolher o Bem divino como seu destino particular. A liberdade da mônada criada se completa na aceitação das realidades do Limite da sua forma substancial, da Mistura como condição da sua liberdade, e do Amor divino como causa final da sua existência.
#123 Razão Singular de Mistura Mínima (RSMM): A medida necessária para que seja possível a uma mônada criada escolher o Bem divino é a sua Razão Singular de Mistura Mínima, que na teologia cristã equivale ao significado da Cruz. Esse é o peso mínimo de sofrimentos que a mônada criada precisa experimentar para que o autoconhecimento de seu arbítrio na escolha do Bem se complete. Conhecemos a Deus como o nosso amante desde que nascemos, embora isso principie de modo muito intuitivo e cresça aos poucos, às vezes com muitas dificuldades. Mas conhecemos a nós próprios como amados também de modo gradativo e progressivo. Leva um tempo, até a nossa maturidade, para entendermos como é necessário experimentar algum grau de dificuldade para conhecermos a nossa própria liberdade de confiar ou não em Deus. Se tudo fosse ótimo, como poderíamos escolher confiar em quem jamais poderia ser desconfiado? Este é o tema da Eleuteriodiceia. Mas aqui nos deparamos com essa necessidade de uma restrição à satisfação de nossas Apetições sob um certo limite ou medida. Se este grau de insatisfação não for experimentado, não conheceremos nossa própria liberdade ao ponto mínimo necessário para arbitrar o aceite do Amor divino o suficiente para receber a Coruscância. Nós mesmos, desde que nascemos, mal temos uma noção de qual seja a medida que se aplica ao nosso caso, e muito menos ainda sabemos a medida que se aplica aos demais casos das outras mônadas com as quais convivemos em Mútua Representação. É a Obra divina, através de sua Providência, que organiza e estipula os limites e as medidas da experiência necessária. Por isso se diz que é Deus quem dirige os passos do homem, etc., e é por isso que ser Humilde é tão importante. Mais ainda, por vivermos na dimensão da sucessividade, ou tempo, e por Deus conhecer todo o nosso processo próprio de progresso espiritual, e os nossos potenciais, a RSMM deve ser vista como intravariável no percurso de uma vida neste mundo: alguns precisam de uma dose maior de restrição e insatisfação antes, outros talvez precisem dessa experiência mais tarde. O que mais importa é o aceite da experiência da Cruz como condição para o propósito final (da Eleuteriodiceia à Coruscância), e o entendimento de que existe uma medida mínima além da qual não precisaríamos experimentar maiores males, não fosse a nossa obstinação, e a de outros, em obter a nossa própria felicidade e salvação por nossos meios humanos e mundanos. Se pudermos compreender a natureza processual, ordenada e eficaz da Cruz, ou RSMM, nos será muito mais fácil descomplicar a experiência desta vida para nós e para os outros.
#124 Arbitragem de Excesso de Mistura (AEM): Para além da RSMM determinada pela Providência divina, é permitido que a mônada criada determine sua própria Arbitragem de Mistura Excessiva no autoconhecimento de sua Vontade. Se essa liberdade for retirada, a Coruscância não é possível. Assim como o excesso de Mistura não é conveniente, também não convém o julgamento do outro que está no uso dessa liberdade de acordo com a vontade divina. Aqui é que o valor do perdão se mostra em todo o seu poder: não é por qualquer permissividade ou anuência que se perdoa ao próximo as suas arbitragens excessivas, mas é porque ele precisou se conhecer na experiência do mal para conhecer a Deus como seu salvador. E que medida pode haver entre quaisquer males temporários e contingentes, e a bem-aventurança pela Eternidade? Cada mônada, cada uma singularmente, é incalculavelmente valiosa para o Altíssimo. O preço de resgate a ser pago para a salvação de cada uma é a liberdade da experiência do que não convém, graus excessivos de Mistura com repercussões que podem ser muito negativas e em direções diversas, mas tudo isto é compreendido pela Providência divina que visa ao maior bem final possível. Sobretudo, e em linha com o que Jesus ensinou, se simplifica muito a experiência moral humana atual com a concentração de nossos recursos limitados na prevenção das nossas próprias arbitragens de excesso, afinal temos muito mais poder sobre estas do que sobre as alheias.
#125 Humildade contra a Pretensão: Reconhecimento do limite e da falibilidade que libera da mentira das falsas qualidades da mônada, especialmente força, bondade e sabedoria. Também chamado de Sacrifício de Comunhão. Deus não é bom porque Ele faz o que eu quero, mas porque Ele faz o que Ele quer.
#126 Presença contra a Idolatria: Consciência da experiência total da vida diante da Mônada Incriada, voltada para a satisfação desse relacionamento em primeiro lugar e acima de tudo, libertando da mentira da subsistência de qualquer outra realidade fora dessa relação.
#127 Louvor contra a Sedução-Pacto com a Morte: Conversão do desejo de todos os bens particulares à adoração da sua fonte eterna na Beleza da Mônada Incriada, libertando de qualquer necessidade de experiência na contingência atual pela garantia do perpétuo usufruto da Beleza divina na Eternidade. Qualquer possível bem imediato se converte sempre na satisfação com a promessa da Herança divina. E não há bem apetecível que não possua sua essência preservada na Eternidade do Ser divino (Idealismo Transcendental).
#128 Paixão contra o Terror-Pacto com o Inferno: Capacidade de suportar as consequências da experiência da Mistura pela confiança na bondade do decreto da sua finitude, o que é a liberdade da ilusão de subsistência do Mal. Este dom torna cada experiência contrária à Apetição um passo a mais a ser dado até o fim do processo de experiência da Mistura. A confiança na Providência torna tudo suportável, e o que parece trair o ordenamento divino não passa de ilusão e fantasia. A transitoriedade da contingência se certifica com a manutenção da consciência no que é permanente: passam os tormentos violentos das rebeldias e das revoluções, mas mantém-se a ordem suprema que deriva da vontade divina. Em grau máximo, o dom da Paixão torna até apreciáveis os desafios que normalmente aterrorizariam os ânimos desamparados, porque toda audácia maligna chama pela vingança do Senhor, garantida e inevitável, e a Ira divina é sagrada e cultuada pelos portadores do dom da Paixão. A Paixão não é, portanto, apenas a capacidade de tolerar os danos e pressões causadas pela experiência da Mistura, mas além disso concede o poder de atuar com efetividade na defesa e no testemunho do Bem em meio às opressões diversas. Por mais que os medos e as ameaças dos males temporários do espírito de Terror possam perturbar os ânimos, identificados os ataques inimigos pelo dom do Discernimento, o dom da Paixão fornece a defesa mais formidável contra esse tipo de assalto: o que há de mais terrível do que a Ira de Deus?
#129 Soberania contra o Gnosticismo: Consciência da supremacia da Vontade com a finalidade da escolha de um Bem inefável, libertando da mentira de que por quaisquer conhecimentos contingentes se torne obrigatória qualquer crença sobre a qual a Vontade não possa arbitrar. O Livre-Arbítrio das mônadas criadas é tão importante para a pureza da escolha do seu destino eterno que toda a complexidade das causas materiais e eficientes foi produzida apenas para a sua arbitragem da crença na Presença ou na Idolatria. Essa é uma das “loucuras” de Deus que confunde os “sábios” e orienta os humildes, um tipo de segredo espiritual compartilhado apenas pelos amantes verdadeiros.
#130 Vigilância contra a Ingenuidade: Astúcia de separar a experiência da Mistura do seu significado espiritual, libertando das mentiras da legitimação da mesma; da adoração de qualquer “deus” que não possua a suficiência do Deus Triuno, que só pode ser falso por depender de uma criação para realizar sua forma por relacionamento, para conhecer e ser conhecido, e para amar e ser amado; é a libertação do Pacto Ouroboros, que é o Pecado Original (a Tradição Primordial da humanidade, ou Religião de Adão); é a libertação também da Dialética do Ouroboros, que leva desde os extremos da escravidão ao Costume ou à Libertinagem, até as formulações mais sofisticadas do exoterismo de Legitimação da Mistura e do esoterismo de Rejeição do Limite; e é também a libertação da tentação de participação no Sistema da Besta. A Vigilância é um dom que situa o ser humano na realidade do seu cenário espiritual real: nascido como escravo da Maldição e do Poder, vendido aos governantes do mundo pelos seus ancestrais, criado na cultura de Cativeiro e tentado a participar no Sistema da Besta para se exaltar às custas do sofrimento de seus irmãos, cada um é chamado por Deus a se separar do Reino da Usurpação e a carregar a Cruz contra a rebelião de Lúcifer e Adão, pelo conhecimento da Liberdade do Evangelho de Jesus Cristo.
#131 Discernimento contra o Psiquismo: Distinção da natureza espiritual das influências e sugestões que são acolhidas ou rejeitadas pelo arbítrio da mônada criada, libertando da mentira da causalidade psíquica sobre os movimentos da Vontade.
#132 Metareflexividade, o Sacramento do Momento Presente: Consciência gerada pela posse mais plena e contínua do dom da Presença que permite a apreciação da criatividade divina na determinação da qualidade dos objetos da Percepção (Nitidez), bem como da qualidade subjetiva do Intelecto percipiente (Cristalinidade). É a plenitude da Presença e da Soberania e a liberdade contra toda a mentira, respectivamente, da Idolatria e do Gnosticismo: vivemos apenas por Deus, que nos dá o bem percebido e a boa percepção. Deus está “nas duas pontas” da Percepção, no objeto e no sujeito. A Metareflexividade é a consciência disto. Esta consciência nos permite nos relacionar com a origem e o fim da experiência da vida, sem confusão e distração com os elementos da experiência em si. O mundo e as coisas do mundo são parte de um cenário da nossa experiência espiritual com Deus. O que há, realmente? Há apenas a Mônada Incriada, e a mônada criada diante do seu Criador. Tudo o que é experimentado é a atualização, por força da iluminação divina, de uma potência intelectiva da criatura. A Metareflexividade é a atenção à causa fundamental da experiência por trás dos fenômenos percebidos em primeiro plano, durante o processo mesmo dessa Percepção. Neste sentido, não se trata de uma Apercepção, como uma reflexão ou meditação ex post facto. É uma consciência imediata e simultânea à Percepção. Lembra aquilo que Plotino declarava a respeito da contemplação do Uno na experiência do Múltiplo, muito embora no neoplatonismo houvesse uma certa restrição entre o fazer uma coisa ou outra, algo que não ocorre no caso da Metareflexividade. Estamos com Deus o tempo todo, e Ele está por trás de toda a experiência de Percepção, como provedor da qualidade do objeto e da capacidade do sujeito.
#133 Adão: Decidiu trair o amor à Deus e usurpar a Criação através do Pacto Ouroboros (Pecado Original), ofertando a adoração da Serpente por toda descendência (Tradição Primordial) em troca da Gnose (conhecimento da Mistura). Se Adão tivesse somente se arrependido, o seu destino e o da sua descendência poderia ter sido diverso. Ele não apenas se enganou, mas cometeu uma traição tão real e tão profunda que repercutiu na Terra aquilo que Lúcifer havia feito no Céu. Se tivesse recebido o espírito de arrependimento, Adão poderia ter contestado a tentação que lhe foi oferecida por Eva. E mesmo depois de condenados, se ainda assim Adão tivesse recebido o arrependimento do Espírito Santo, ele poderia ter aceito o Decreto de Gênesis 3 e confiado na Ressurreição com a mesma gratuidade que qualquer cristão tem o dever de fazer até hoje. Mas não. Ele persistiu no seu culto do diabo no lugar de Deus, no qual ofertou toda a sua descendência em troca do governo do mundo. Quando Satanás afirma a Jesus que ele recebeu o governo de toda a Terra e que pode dá-lo a quem quiser, de quem teria recebido tamanho domínio, senão em primeiro lugar do próprio pai da humanidade? É verdade que o pacto foi depois reiterado por Set, Noé e outros, mas cabia a Adão fazer o que só mesmo Jesus Cristo pôde fazer, sem ter a culpa, que era aceitar o Decreto divino e a verdadeira Salvação pela destruição das Obras da Carne e pela Ressurreição.
#134 Caim: Decidiu trair o amor ao próximo (Abel), vingando-se contra a predileção do irmão que foi enganado pela Tradição Primordial. Abaixo de Adão, Caim foi o fundador do Gnosticismo esotérico da mão esquerda do diabo: o outro lado do Pacto Ouroboros, o componente da rebelião, da revolução, da malícia e da desconfiança. Por boas razões Caim poderia aceitar o chamado divino legítimo para romper com o Pecado Original produzido por seus pais. Mas então, decidindo rejeitar a participação na farsa que enganou seu irmão mais novo, por qual razão ele ficaria irado? É exatamente o que Deus lhe questiona. Se decidiu bem, porque anda taciturno, furioso e prestes a ceder à tentação da ira? É porque caiu na primeiro na tentação do orgulho de se sentir superior aos pais e ao irmão, e diante da exaltação de sua família diante do Ouroboros e da sua rejeição, e principalmente diante do sucesso de seu irmão na mentira, seu orgulho se sentiu traído. Faltou-lhe a virtude que Jesus mostra mais tarde, aceitando a rejeição humana por todos os lados e de todas as formas, ele que tinha muito mais méritos do que Caim jamais poderia ter. Caim não viveu diante de Deus, não buscou a sua Presença. Ele queria ser vitorioso em seu orgulho diante de sua família, e esta vontade causou a sua queda. Caim é o pai dos revolucionários gnósticos que denunciam o Deus verdadeiro como Demiurgo que aprisionou as substâncias espirituais no decaimento da matéria.
#135 Set: Decidiu confiar na Tradição Primordial e reiterar indefinidamente o Pecado Original.
#136 Enoque: Decidiu viver na Presença, dispensando eventualmente a necessidade da experiência da Mistura e da morte.
#137 Noé: Decidiu reiniciar o Pacto Ouroboros por sua livre e espontânea vontade, sem necessidade espiritual senão a sua pulsão em repetir o ideal adâmico. É um símbolo da tara humana, mostrando que a escolha de Adão, de desconfiar do puro amor divino, não foi tão acidental, mas uma tendência natural do ser humano. Noé, filho de Lameque, neto de Matusalém e bisneto de Enoque, andava com Deus e separado da corrupção da humanidade. Recebia e retinha, portanto, dons espirituais cedidos por Deus. Sua participação da Salvação divina advinha da sua vontade de ser santificado, separado, daquela corrupção derivada do Pecado Original, isto é, do Pacto Ouroboros. Deus não poderia desprezar essa escolha de Noé, nem deixar de mostrar a sua Misericórdia. A Providência realiza então o Dilúvio (um espécie de great reset da Antiguidade), e conduz Noé a construção da Arca para a família deste e para os animais, representando a Salvação. Esta não é a Salvação perfeita, é apenas um símbolo. Por isso não faz sentido, por exemplo, questionar a literalidade do conjunto das espécies embarcadas na Arca. O que a Arca de Noé representava era a Salvação que só se realizaria por Jesus Cristo. Era necessário, todas as vezes que algum ser humano se levantasse, no período do Antigo Testamento, para viver na Presença de Deus, que este tivesse da parte da Providência todos os meios para realizar o limite da sua ação de modo que Jesus Cristo fosse reconhecido como o único Santo diante do Pai, e o único realizador perfeito da vontade divina. Por isto Noé não poderia ser destruído no Dilúvio, e a Arca teve que ser construída, etc. Quando Noé sai da Arca, ele e sua família estão em situação espiritual análoga à de Adão depois que este foi expulso do Paraíso. Se quisesse obedecer ao Decreto de Gen 3 que nunca foi abolido e permanece válido até o Fim dos Tempos, Noé o teria podido realizar seguindo a mesma comunhão com o Espírito Santo que ele já vivia. Isto era necessário, como Jesus finalmente mostrou mais tarde. Afinal, nem Noé e nem ninguém teve acesso de volta ao Jardim do Éden, só Jesus através da Ressurreição, e isto porque ele aceitou o Decreto de Gen 3 como condenação sobre si, mesmo sendo inocente do Pecado Original. Noé, assim como Adão, não quis para si e para sua família o benefício do Decreto, mas recuperar aquele acordo com a Serpente. Isto é mostrado no culto de sacrifício de sangue que Noé faz ao sair da Arca, onde Deus respira o odor do sacrifício e afirma que “os desígnios do coração do homem são maus desde sua infância“, de modo que a Aliança com Noé, representada pelo símbolo do Arco-Íris, representa a Misericórdia divina apesar da desobediência humana. O mundo continuará produzindo suas gerações más, para que de cada geração Deus possa colher os seus santos da Primeira Ressurreição, testemunhas com Jesus Cristo para o Dia do Juízo Final. Noé termina deprimido e bêbado por ser o novo Adão da humanidade, o novo subscritor do Pecado Original, e é descoberto na sua nudez espiritual, isto é, na sua traição à imagem e semelhança de Adão, por seu filho Cam, que imediatamente é amaldiçoado e condenado a ter sua descendência escravizada pelos seus irmãos Sem e Jafé.
#138 Abraão: Decidiu confiar na Aliança como promessa para a descendência carnal, misturando as Obras da Carne com as Obras do Espírito.
#139 Moisés-Aarão: Decidiu desconfiar do ordenamento divino, da obra de Separação, e reiterou a crença na salvação para a descendência carnal. Abriu o caminho para a tradição sacerdotal e religiosa pela interferência do irmão.
#140 Esaú-Saul: Decidiu confiar na unção humana e não na divina, como se pudesse ser virtuoso pela eleição do povo e trocar as Obras do Espírito pelas da Carne.
#141 Davi: Decidiu ser humilde, apesar de todos seus pecados. O jovem pastor aceitou o chamado temerário que Deus permitiu ao seu povo fazer, e foi corajoso ao receber todos os encargos desde a deposição de Saul até o fim de seu reinado. O que o Rei Davi aprende, porém, é que ele nunca é bom o quanto deveria para receber as suas graças. Seus salmos relatam a preciosidade do seu relacionamento direto e pessoal com Deus, e de como a missão temporal de governo dos homens, mesmo sob a investidura da unção divina, termina por se constituir como um caminho arruinado, cheio de sofrimentos e angústias, e por fim com o triunfo do mal. Davi precisa ser salvo ele mesmo, precisa também ver a morte das Obras da Carne, e precisa ser ressuscitado pelo seu descendente, Jesus Cristo. Um dos melhores entre todos aqueles que deram o testemunho de Deus no Antigo Testamento, Davi mostrou-se distante o suficiente para que fosse glorificado o verdadeiro Filho de Deus. Criminoso e pecador, sempre encontrou redenção por aceitar o santo arrependimento, e por ter o coração humilde diante do Pai, ao ponto de conseguir alguma misericórdia até mesmo para o seu filho, aquele grande traidor ao qual deu o terrível encargo da construção do Templo de Jerusalém.
#142 Salomão: Decidiu ser soberbo, apesar de toda sua sabedoria.
#143 Profetas: Decidiram testemunhar a verdade e denunciar a traição das Obras da Carne.
#144 Jesus: Deus decidiu tomar a forma humana para ensinar aos homens a amar. Encarnação: Humilhou-se como homem para mostrar a bondade de sua Criação e revelar a verdade definitivamente, isto é, a bondade da sua criação, e a pureza da vontade o Espírito Santo contra a impureza da vontade seminal do homem. Sua Encarnação é ao mesmo tempo a denúncia e a redenção do Pecado Original. Fé e Milagres: Confirmou e deu o testemunho da maldade humana da maioria que duvidou de sua bondade e só confiou no seu poder, e revelou a pureza da Fé do Filho em contraste com a impureza da fé dos escravos e dos mercenários. Cruz: Rasgou o véu do templo das mentiras dos homens, mostrou que Deus é bom, capaz de salvar até os que o assassinaram injustamente, e que o Acusador é apenas um espírito mentiroso e assassino, o falso deus dos templos oriundos da Tradição Primordial. Ressurreição: Mostrou novamente a bondade da sua Criação, e o sentido final da Salvação para todos os que crêem. O caminho é a Cruz, a verdade é a Morte das Obras da Carne (o Decreto divino de Gênesis 3), e a vida é a Ressurreição.
#145 Era Cristã: Mistura da Revelação com a corrupção religiosa, especialmente dos quatro grandes erros do Cristianismo institucional: a) defesa da Tradição Oral contra a Soberania da consciência livre (Gnosticismo); b) defesa do Pecado Original como costume derivado de um mandamento divino; c) defesa do sacrifício de sangue como ritual instituído pelo Deus verdadeiro; d) defesa da doutrina da ameaça do Inferno para a opressão das consciências e fortalecimento da obra do Acusador. Particularmente o Cristianismo parece ser o Culto do Mashiach ben Yosef, servindo de preparação histórica para a conversão das massas à mentira do Falso Profeta e à sua Religião das Leis de Noé.
#146 Síntese Filosófico-Teológica: A Operação de Deus, ou Obra de Deus, chamada de Separação ou Santificação, é a colheita das almas que livremente aceitem seu Amor, e a aniquilação misericordiosa daquelas que o recusam. Esta Operação atual, na condição da Mistura, serve para essa colheita: é necessário que as mônadas criadas conheçam a sua própria vontade de aceitar ou rejeitar o Amor divino. Base: Deus triuno, pleno em Si, cria por pura gratuidade amorosa seres destinados à sua experiência singular da felicidade divina. Exercício da Liberdade: As criaturas, para tomar posse da sua herança, que é a sua participação na Glória dos bens divinos, precisam conhecer sua própria vontade de viver pelo Amor divino, para realizar sua parte na perfeição. Não entra na perfeição quem não escolhe a perfeição, e não escolhe livremente a perfeição quem não a deseja antes de experimentá-la. Duas Soluções: A aceitação do Amor divino pode se dar por bem ou por mal, pelo amor ou pela dor: quem aceita por bem se torna humilde por si mesmo, e quem só aceita por mal tem que ser humilhado. Primeira Ressurreição: Quem aceita por bem ama a Deus acima de tudo e ama o próximo como a si mesmo, nos limites de sua condição, e participa da Primeira Ressurreição. Assim, este é o que imita a Jesus Cristo e o segue: carrega a Cruz, aceita a Morte e espera na Ressurreição. Segunda Ressurreição: Quem só aceita por mal recusa o Espírito Santo, imita seus pais, rejeita e luta contra a Cruz, faz Pacto com a Morte e desacredita da Ressurreição. Este só pode ser salvo na Segunda Ressurreição, onde aprenderá a verdade sobre a maldade da sua escolha, e sobre a bondade da Misericórdia de Deus, no Dia do Juízo. Colaboração na Operação: O papel de colaboração de quem ouve, acredita, confia e obedece ao Espírito Santo, mesmo com todas as falhas derivadas de sua condição, é o de: a) persistir na sua escolha de Amar a Deus e ao próximo, b) dar o Testemunho para que outros possam escolher o mesmo, e c) perdoar os que não o fazem, produzindo assim um Testemunho válido e particular para o Dia do Juízo.
#147 Sakura Tsuna — Cinco Conceitos Sinóticos da Monadofilia: De modo sintético é possível compreender a Monadofilia como uma filosofia que requer apenas cinco princípios basilares para se justificar. Os entendimentos mais detalhados e sutis se desdobram em diversas explicações mais minuciosas, úteis conforme a necessidade intelectual de cada pessoa. Porém, àquele que desejar uma compreensão mais simples e unificada, com base na economia intelectual sugerida pela Navalha de Ockham, os Cinco Conceitos Sinóticos da Monadofilia podem ser suficientes. O primeiro e mais fundamental conceito, ou princípio, é o do Paraíso-Escolhido: é a forma universal de todas as Apetições humanas, a realização da Causa Final do nosso ser, e o bem mais inegável ao qual temos acesso imediato até mais fácil e direto do que ao próprio Deus Criador de todas as coisas, pois partimos da nossa natureza mais simples e atual. Em segundo lugar, há o conceito do Sumo Bem-Condição do Escolhido: reconhecemos aquilo que é iminentemente necessário como condição para que o Paraíso-Escolhido seja possível, já que a forma daquele primeiro princípio nos revelou claramente que os limites internos das nossas capacidades nos impedem de realizar até mesmo a ínfima parte daquela potência reconhecida como conveniente. Ora, se a criatura livre e inteligente reconhece que foi criada com a potência para a experiência de um bem que atinge determinados patamares sempre acima de suas próprias condições de realização por si mesma, é sumamente racional (ou, como dizemos, metaracional) que haja no fundamento desse ser criado uma vontade boa da parte de um Ser com potência infinita, capaz de realizar aquilo que o ser criado reconhece como bem possível e apetecível. O conveniente, porém, não obriga que o Ser seja assim. Apenas indica que deve sê-lo, sendo essa observação completada idealmente pelo desejo livre de crer que assim o seja, que é a contrapartida da parte do ser criado ao amor gratuito que já gerou o seu ser sem nenhuma necessidade (pois, como disse o Apóstolo João, não fomos nós que amamos a Deus, mas foi Deus quem nos amou primeiro). Em terceiro lugar, há o conceito do Limite-Forma do Escolhido: não podendo possuir o Infinito em Ato em sua forma substancial, a criatura reconhece que o seu Limite determina a forma do Paraíso-Escolhido, de modo que materialidade, corporalidade, espacialidade, temporalidade, etc., não são restrições à sua experiência do bem, mas ao contrário, são as dimensões necessárias para a sua experiência da Glória divina, de modo que o Limite não só não impede a realização do bem da criatura, como ele permite, por determinar a sua forma substancial, o modo de usufruto de qualquer bem que lhe seja possível. Em quarto lugar, há o conceito da Mistura-Condição da Escolha: sendo a perfeição do Escolhido incompatível com a ausência da liberdade de escolher o bem, é preciso que essa liberdade se realize em qualquer estado abaixo do mais perfeito, que é o que chamamos de condição da Mistura de Luz e Trevas. Sem essa Condição da Escolha, a Liberdade não se atualiza realmente, e o Paraíso-Escolhido não pode ser efetivamente realizado, pois ele requer na sua perfeição uma verdadeira Escolha. Por fim, em quinto lugar, temos o conceito da Arbitragem-Operação da Escolha: é a operação própria da mônada criada que terá de escolher entre a arbitragem próxima do desígnio da Providência que determinou com sabedoria a medida mínima de Mistura necessária para a efetiva Escolha do bem (que é o que chamamos de Razão Singular de Mistura Mínima), que é o que equivale, na teologia cristã, ao carregar a Cruz e seguir Jesus, e a opção da Arbitragem do Excesso de Mistura (AEM) que deve ser permitida igualmente, embora seja sempre inconveniente para a criatura.
#148 Kiku (“O Crisântemo”): Amor perfeito, Vida na Presença, consciência metareflexiva.
#149 Arayashiki (“Consciência Profunda”): Fé perfeita.
#150 Tenbu Horin (“Tesouro do Céu”): Esperança perfeita.
#151 Sete idéias monadofílicas: Entre o escopo completo da Monadofilia, com as Liberdades Iniciais, os entendimentos básicos e avançados sobre a Mônada, a compreensão dos melhores dons espirituais e a revisão teológica dos relatos bíblicos, e o escopo sintético dos Cinco Conceitos Sinóticos da Monadofilia, há um esquema intermediário com sete idéias que pode ajudar a compreender o sentido desta filosofia de um modo menos conceitual e mais orgânico, como um raciocínio que parte de poucas premissas e se resume em poucas conclusões. São estas as sete idéias: (1) Deus, infinito na sua perfeição, sempre foi suficiente em si mesmo; (2) Os seres criados por Deus à sua imagem e semelhança, finitos e definidos por seu Limite, são feitos por pura gratuidade amorosa; (3) O objetivo de Deus com sua criação é a reprodução da sua felicidade na vida das suas criaturas, um estado paradisíaco sustentado pelo Amor divino; (4) A possibilidade do Paraíso requer da parte de qualquer ser livre a realização prévia da sua liberdade de escolher a vida neste estado, numa condição menos perfeita (Mistura); (5) Os seres livres devem fazer a sua escolha de aceitação ou rejeição das realidades do Limite, da Mistura, e do Amor divino; (6) As rejeições arbitram um excesso da experiência da Mistura (mais sofrimento), mas não alteram o melhor destino possível de acordo com a Providência; (7) As aceitações diminuem o excesso da experiência da Mistura (menos sofrimento). Com isto um ser humano poderia compreender a essência da Monadofilia, sem precisar nem estudar todos os detalhes se não se sentir intelectualmente necessitado disso, e nem meditar nos conceitos sinóticos que são mais profundos e difíceis. É uma alternativa mais prática, quase como uma formulação dogmática exotérica.
#152 Discurso unificado das proposições sintéticas: A realização da perfeição possível aos seres criados à imagem e semelhança de Deus, o melhor objeto de escolha, requer a livre aceitação da necessidade do Limite como a forma do escolhido, da experiência da Mistura como condição da escolha, e do Amor divino como condição do escolhido e da libertação da Mistura.
#153 Dialética do Ouroboros: Sistema de usurpação espiritual da autoridade divina pela ação mentirosa do chefe dos anjos caídos, o Ouroboros. Operando a mente humana de modo dialógico, porque a razão compara e mede uma coisa pela a outra, pela qual obtém sua ratio, é sempre inconveniente para a mentira operar sozinha contra a verdade, pois na sua comparação sairá sempre perdendo. A verdade, por outro lado, sendo una, sai sempre ganhando pois é suficiente que seja comparada com qualquer alternativa que lhe seja inferior. Desta maneira convém ao propósito de quem quer mentir e dominar pela mentira que o faça produzindo não apenas um, mas dois discursos, e que sejam dialeticamente opostos na sua aparência, de maneira que a verdade não surja como alternativa viável. Esse esquema falacioso tem o nome de tertium non datur, ou “terceiro excluso”. O controle dialético das oposições produz a falsa aparência de liberdade de escolha que confunde o árbitro na sua decisão, dando-lhe a impressão de que é livre para escolher entre o verdadeiro e o falso quando não é, pois se lhe apresentaram duas mentiras opostas uma à outra. Esse dispositivo engana a maior parte das mentes humanas, pois estas não estão habituadas a raciocinar sobre premissas, o que é uma disciplina filosófica do pensamento crítico, mas se acomodam com o pensamento a respeito das conclusões, principalmente quando é a sua suposta sabedoria que é evidenciada na decisão, e não sua ignorância, como no caso do investigador crítico ou cético. Em qualquer processo dialético quem controla tese e antítese controla a síntese, como num ambiente comercial quem controla os supostos concorrentes domina o mercado, ou como num ambiente político quem controla os candidatos possuirá o domínio do eleito, seja quem for, etc. A dialética do Ouroboros funciona do mesmo modo, mas num ambiente espiritual das alternativas entre a obediência a um deus bom e a rebelião contra um deus mau. Não podendo ser como Deus, o Ouroboros deseja ocupar o lugar de Deus diante do homem (lado direito da dialética), e quando isso não for possível deseja gerar no homem a mesma energia de rebelião contra o Deus verdadeiro, tornando-se o seu “libertador” (lado esquerdo da dialética). Operação dialética: quando as energias sociais se acumulam em excesso em um dos lados e a mentira desse lado fica evidente pelo acúmulo das crenças frustradas nessa direção, a solução é apresentada pela alternativa do lado exatamente oposto do mesmo sistema dialético. Solução espiritual: ativação do dom da Vigilância. Solução filosófica: aceitação do Limite e rejeição da Mistura.
| ASPECTO SIMBÓLICO | ESQUERDA | DIREITA |
| ASPECTO POLÍTICO | REVOLUÇÃO, LIBERTARIANISMO | TRADIÇÃO, CONSERVADORISMO |
| ASPECTO RELIGIOSO | ESOTERISMO | EXOTERISMO |
| ASPECTO FILOSÓFICO | O LIMITE É MAU | A MISTURA É BOA |
| POSIÇÃO DO OUROBOROS | LIBERTADOR DA FALSA AUTORIDADE | AUTORIDADE DIVINA VERDADEIRA |
#154 Teoria da Ação: Ação livre que tende ao bem: Aquela que sou incentivado a fazer porque se não fizer, ninguém mais fará em meu lugar; renúncia ao mal que me foi feito, perdão, liberdade contra o mal. Ação alienada que tende ao mal: Aquela que sou tentado a fazer porque se não fizer, outro fará em meu lugar; imitação ao mal que me foi feito, escravidão ao mal.
#155 Analogia ontológica trinitária: Sendo a Mônada, a substância simples, o único ser real, possuidor de Intelecto e Vontade e capaz, assim, de Percepção e de Apetição, tudo o que a Mônada conhece e deseja é a satisfação da plenitude no reflexo de si mesma, o que constitui a totalidade do Ser. Encontramos essa perfeição ao contemplarmos a suficiência do ser divino, a Mônada Incriada. Por sua infinitude, esta se diferencia das mônadas criadas pela sua atualidade plena, de modo que nada falta, nada requer a experiência numa condição de função dimensional (como com a simultaneidade espacial ou com a sucessividade temporal). Quando Deus se revela como Aquele que É (asher hu), ou como Visão da Visão (noesis noeseos), ele já antecipa a sua trinitariedade, que é a única forma compatível com a plenitude monádica. Ora, se a mônada deve Perceber e Apetecer, isto é, conhecer e amar, o Deus verdadeiro, o Único, só pode ser Uno por ser Trino, conhecendo e amando em Si mesmo sem a necessidade de nenhuma criação, nenhuma emanação, nenhuma manifestação, nenhuma processão hipostática, etc. Corrige-se, assim, tanto o culto do falso deus que precisa criar para conhecer e ser conhecido e para amar e ser amado, como o deus dos cultos judaico e islâmico por exemplo, quanto o culto gnóstico do falso deus que conhece a si mesmo por quaisquer movimentos que violam a necessidade metafísica do Ato Puro e criam o paradoxo do maior e mais perfeito revelar-se como o menor e menos perfeito. Se o Uno não for Trino, ele não pode ser Uno por não ser suficiente, mas carente, o que é absurdo em Deus. A substancialidade divina no seu ato de conhecer e ser conhecido, e de amar e ser amado em si mesmo, produz a realidade das Pessoas divinas necessárias para que o Único seja o Único. Por paradoxal que isto possa parecer, e é realmente um Mistério, o paradoxo realmente insolúvel é o de um deus não Trino que realiza sua plenitude em si mesmo sem ser conhecedor e conhecido, nem amante e amado, o que requereria a substancialidade das Pessoas divinas, caso contrário seria a farsa como a de se atribuir realidade a uma imagem, ou a um reflexo num espelho. Ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo correspondem, assim, respectivamente, o Ser, o Conhecer e o Amar, e a Substância, o Intelecto e a Vontade, e a Mônada, o Intelecto-Percepção e a Vontade-Apetição.
| Pai | Filho | Espírito Santo |
| Ser | Conhecer | Amar |
| Substância | Intelecto | Vontade |
| Mônada | Percepção | Apetição |
#156 C.O.P.A. (as quatro mentiras do Cristianismo): “Carteirada”, ou a Autoridade da Tradição Oral, é a imposição de uma competência religiosa para a interpretação dos textos sagrados e do significado da Revelação. O indivíduo é totalmente desqualificado para a compreensão do significado das coisas divinas e espirituais. A consciência humana deve se submeter ao império dos especialistas na literatura sagrada e nas etimologias, porque estes foram capacitados de modo exclusivo por outros seres humanos das gerações anteriores que foram, por sua vez, herdeiros de um mandato ancestral de interpretação e significação das coisas religiosas. Existe uma transmissão não escrita de conteúdos essenciais a respeito do que é divino, e esta só pode ser compreendida pela confiabilidade daqueles que receberam essa herança oral. Toda a interpretação individual desligada desse entendimento autorizado, supostamente fundado pela própria autoridade divina, é considerado temerário ou mesmo herético. Supostamente Deus não poderia amar indivíduos com o esclarecimento de suas consciências; “Oferta”, ou a Teologia Pagã do Sacrifício de Sangue, é o oferecimento da participação numa prática que alia o ser humano à divindade. Isto de modo que o convidado possa ser integrado na comunidade dos “salvos” (ou “eleitos”) por ser membro do grupo que produz o sacrifício ritualístico necessário para apaziguar ou agradar a divindade. Quem, por outro lado, estiver de fora do grupo que realiza os rituais de religação e reconciliação com o divino será excluído das beneficências que só os membros do grupo têm o direito de reclamar. Nisto não importa os meios pelos quais se faz a oferta, embora há uma predileção tradicional pelo uso do sangue ou daquilo que representa o sangue, inclusive na teologia do Cristianismo que segue, por exemplo, o que consta no Capítulo 9 do livro de Hebreus. Supostamente Deus não poderia amar e beneficiar quem não participasse desse tipo de prática religiosa; “Pedido”, a Perpetuação das Obras da Carne, o Pacto Ouroboros, ou Pecado Original, é a contrapartida principal no acordo religioso que obriga os fiéis a (1) procriarem ou (2) elogiarem e legitimarem a procriação, já que os instintos animalescos ligados à reprodução são interpretados como o efeito de um desígnio divino. A alternativa do autocontrole para a abstinência voluntária do ato de procriar é considerada uma violação da lei natural e do ordenamento divino, ou então é relegada como uma atividade marginal dispensada a alguns indivíduos, mas nunca competindo com a suposta vocação do matrimônio e da paternidade/maternidade. Supostamente Deus não poderia amar e criar seus filhos sem depender da atividade carnal da reprodução humana ; “Ameaça”, ou a Tortura eterna no Inferno, é a intimidação dos relutantes na participação da Religião pela apresentação do máximo risco a qualquer alma que não acate a autoridade e não participe das práticas religiosas, que é de um sofrimento sem fim por toda a eternidade. Supostamente Deus não poderia amar e ter misericórdia suficiente para aniquilar aqueles que rejeitaram o seu Amor, mas teria que se satisfazer com a tortura dessas almas em nome de alguma noção confusa de Justiça.
#157 Comunicações Demoníacas: Sugestão, Influência e Possessão, Yoga, Meditação, Drogas Alucinógenas, Sexo Tântrico, Ataque de Ira, Sacrifícios de Sangue, Bruxaria, Feitiçaria, Assentimento ao Sobrenatural.
#158 Criação livre, gratuita e não vinculante: Produção de seres por uma vontade primária não movida por outra mas apenas por si mesma (livre), sem a intenção de causar nada que seja necessário ou benéfico de modo a alterar a bondade da vontade primária (gratuita), e sem efeito de implicação na restrição da possibilidade de criar de modo diverso desde que não impossível (não vinculante).
#159 Cristianismo: Messianismo, a Religião do culto do Mashiach ben Yosef, Jesus Cristo tomado não como Filho de Deus, mas como oferta de sangue para a conversão do mundo à Torá em preparação para a restauração do mundo (tikkun olan), prática iniciada e permitida pela venda de Jesus pelo Apóstolo Judas com trinta moedas de prata, comprado assim pelo Sinédrio para a justificação do messianismo cabalista como um sacrifício de sangue, o que se tornou o centro da teologia soteriológica da religião cristã.
#160 Dúvida Total: Dada a condição inescapável de ignorância que constitui o âmbito de qualquer intelecto finito em face da Possibilidade Total que constitui a infinitude imperscrutável de Deus, cabe à vontade da mônada criada aceitar ou rejeitar a sua condição. A rejeição é sempre viável psiquicamente justamente pela condição terminal da ignorância dos intelectos limitados, e em última linha gera o estado da Dúvida Total. Psiquicamente isso implica numa tensão enorme, pois a criatura decide voltar-se contra a sua própria natureza, já que a causa final do seu ser é o Amor divino. No sentido filosófico serve de metodologia, como no caso de Descartes, para a recomposição de intuições primárias. No sentido espiritual ou teológico serve de tentação, abrindo espaço para os espíritos de Pretensão, Idolatria, Terror e Psiquismo. A Dúvida Total gera paralisia da alma, a perda da mobilidade natural de crença. A queda de Lúcifer se deu em decorrência da Dúvida Total, pelo desespero infernal e pela grande arrogância rebelde em consequência, como se Deus tivesse o ônus impossível de se tornar apreensível para uma criatura para que ela o pudesse amar, ou como se a criatura pudesse se colocar na posição absurda de se tornar capaz de apreender a totalidade do Ser divino. Simbolicamente, a Dúvida Total é representada pela dissolução da psique pela falta de um elemento estabilizante, que é derivado do poder de crer por estimativa naquilo que transcende o intelecto finito, como o excesso de mercúrio e a falta de enxofre na alquimia (ou a tomada da pílula vermelha sem o uso da pílula azul na sequência).
#161 Evangelho da Liberdade: CAPÍTULO UM: A ENCARNAÇÃO — Na chegada dos tempos adequados o Filho de Deus, Jesus Cristo, decide encarnar como Filho do Homem, o Novo Adão pela responsabilidade e o Anti-Adão pelo efeito, através da obediência de uma mulher obediente a Deus, Maria, a Nova Eva pela responsabilidade e a Anti-Eva pelo efeito, que aceita o rompimento com o Pecado Original e dá origem à Encarnação do Santo dos Santos. Encarnado, o Filho de Deus mostra a perfeição da obra divina, e revela como o mal foi trazido ao mundo apenas por um vício espiritual. Deus encarnado é a prova de que não há mal na materialidade ou na corporeidade. O mal é espiritual. Assim, embora Adão e Eva tivessem traído Deus e perpetuado o mal através das Obras da Carne, seu vício era espiritual, de maneira que Jesus e a Virgem Maria foram capazes, a partir da mesma realidade carnal, produzir as Obras do Espírito. É um grande testemunho anti-gnóstico; CAPÍTULO DOIS: A FÉ E OS MILAGRES — Jesus vive entre os homens pelo tempo necessário para que todos os que precisassem tivessem a oportunidade de experimentar a sua própria liberdade de acreditar no Amor de Deus, ou em seu Poder. Encontrando em poucos o desejo da fé, mas em muitos a busca pelos milagres, Jesus já sabia o que havia no coração dos homens, mas era preciso que eles também soubessem, e através deles, nós mesmos. É revelado o desprezo geral e comum do ser humano pela liberdade espiritual e pela vida na Presença, e a escravidão pela Maldição e pelo Poder. Deus sempre soube disso. Nós precisamos descobrir esta realidade e tomar a nossa decisão. Afinal, a ação mais importante de Jesus, para além dos milagres que o povo tanto ansiava, foi a aceitação do Decreto de Gen 3 e, através da sentença de morte que somente Adão e os Filhos de Adão mereceriam, Jesus revelou o caminho da verdadeira Salvação, que é a Ressurreição. Todos os que foram curados e abençoados não foram dispensados da solução final do Decreto divino de Gen 3, nem da participação na verdadeira Salvação, que é a Ressurreição. Mas enquanto a maioria aceita as Graças imediatas (e não erram ao fazê-lo, obviamente), a aceitação do chamado para a solução final é muito mais desprezada ou até mesmo repudiada; CAPÍTULO TRÊS: A CRUZ — Jesus aceita a sua injusta condenação para fazer da Cruz o instrumento da sua Revelação completa. Mostra o Amor do Pai, pronto a perdoar e salvar mesmo os participantes da maior das injustiças, contanto que estes queiram ser salvos, e mostra a maldade do Acusador que finge promover a Justiça mas é apenas um espírito mentiroso e assassino. O véu está rasgado, e Deus revela que quem estava no Templo era o pai dos religiosos, o diabo enganador, enquanto Ele mesmo, o próprio Deus verdadeiro, estava na Cruz, dando sua vida para revelar a Verdade de seu Amor. Até que Jesus fosse acusado, julgado e condenado, o Acusador sempre poderia ter razão de mover seus processos contra os seres humanos que nasceram do pecado, e este sempre foi o fundamento da força de todas as religiões do mundo: o poder vinculante do Pecado Original, o Pacto Ouroboros. Porém, a verdade é que o Acusador é um mentiroso e assassino. Ele engana e manipula, e não promove a Justiça (porque a verdadeira Justiça é divina, e se chama Misericórdia, a única realidade compatível com a santidade divina), mas acusa desejando o sofrimento, a tortura, a morte, e a dominação e escravização através da culpa inconfessada. A Religião, essa obra de arte demoníaca cheia de astúcia e malícia, mantém o ser humano na perpetuação do Pecado Original e na condenação deste mesmo pecado, porque este é o mal que afasta o homem do Deus verdadeiro. Jesus, porém, se tornou um alvo irresistível para essa malícia demoníaca, e quando foi acusado injustamente, por ele ser verdadeiramente santo, restou revelada a verdade sobre a a natureza do Acusador, ao mesmo tempo em que Deus também é revelado como amante incondicional. O véu rasgado, no Templo, simboliza a destruição da mentira que impera sobre o mundo desde Adão. Ironicamente, a ação que causou o rasgo no véu do Templo e da mentira foi a própria decisão diabólica de acusação e condenação de Jesus. Quem presta atenção à natureza espiritual desses fatos está para sempre livre da mentira e da escravidão diabólica neste mundo, porque a Revelação da Cruz de Jesus Cristo liberta aqueles que a aceitam; CAPÍTULO QUATRO: A RESSURREIÇÃO — Jesus ressuscita na carne, com seu Corpo de Glória, para mostrar que o Paraíso desejado para o homem não consiste em nenhuma confusão espiritualista, mas na promessa fiel que todos os homens sempre puderam conhecer em seus corações. Parte deste mundo prometendo que tem muito ainda a ensinar, coisas que aqueles seus Apóstolos ainda não poderiam suportar, mas que com o tempo seu Espírito revelaria tudo para os verdadeiros buscadores. Enquanto a Ressurreição termina de destruir de vez as mentiras gnósticas a respeito da condenação do corpo e da materialidade, os tempos do Pentecostes revelam a diferença entre os mandatos particulares dos Apóstolos, e a administração divina da verdadeira Igreja, que é espiritual. Os fiéis atentos percebem que os Apóstolos não são santos e infalíveis in totum, como nenhum ser humano fora Jesus Cristo o poderia ser. E de imediato já compreendemos, desde os Atos dos Apóstolos, como a vontade divina e a Palavra de Deus transcendem o escopo de qualquer geração, inclusive a daqueles discípulos diretos, e depois dos sucessores no período da Patrística, etc. Isto é provado pelas interações de Jesus com seus Apóstolos nos Evangelhos, e também pelas declarações feitas no Pentecostes, especialmente o “agora não podeis suportar“. É óbvio que cada geração posterior tentou decifrar o significado de seu próprio mistério, mas o correto é desconfiar do homem e confiar em Deus, como sempre.
#162 Revelação Cristã: Exclusividade da revelação plena de quem Ele É, por Jesus se revelando o único Deus verdadeiro, Uno e Trino, sempre suficiente em si, não só eternamente conhecedor e amante, mas também eternamente conhecido e amado, e da Salvação pelo cumprimento do Decreto de Gênesis 3 e pela Ressurreição. Não há notícia do Deus único, Criador de todas as coisas, nem encarnado como Filho do Homem, e nem Ressuscitado também na condição corporal. As demais revelações falam de deuses inferiores e não suficientes. Apesar disso, a essência espiritual da Revelação Cristã não depende da materialidade do Evangelho, já que a Lei do Amor é escrita pelo Espírito Santo nos corações dos homens desde a primeira geração. É por isso que não existe condenação automática para os pagãos, bem como não existe participação na Salvação para aqueles que simplesmente viveram sob a condição do conhecimento histórico do Evangelho. Para quem possuísse a qualquer momento o desejo do bem, a Humildade, e a aceitação da vida na Presença, o Evangelho poderia ser recebido e endossado a qualquer momento. Para quem detesta o bem, vive em Presunção e pratica a Idolatria, o Evangelho pode ser tão conhecido quanto se queira, ou mesmo exteriormente exaltado como dentro de uma Religião, isto não muda o seu estado interior.
#163 Felicidade: Causa final da mônada, convergência entre Percepção e Apetição. Na Glória divina, constitui o estado de plenitude e bem-aventurança imperturbável da Mônada Incriada. Na condição da experiência da Mônada Criada, constitui a sua participação na plenitude da Mônada Incriada, desde a experiência prévia na condição da Mistura por ato voluntário da parte da criatura, e então do modo mais perfeito na condição da Coruscância por toda a Eternidade. Ser feliz é querer tudo o que se deve e ter tudo o que se quer, como diria Agostinho. No estágio final do progresso da criatura em direção ao aceite do Amor divino, é a vida na comunhão com o Espírito Santo na posse do Corpo de Glória, com Nitidez e Cristalinidade perfeitas, a vida paradisíaca, na Coruscância, com a plenitude da infalibilidade divina. De modo contingente, é a vida na Presença no proveito das primícias da Eternidade e na esperança da Glória eterna. Enquanto na Coruscância a comunhão com Deus garante a perfeição dessa felicidade, atualmente a criatura experimenta a felicidade de modo condicionado ao seu aceite dessa comunhão, através de variados dons. Poucas coisas são tão danosas, porém, quanto a idéia geral de que é possível, ou até mesmo necessário, se obter a felicidade sem Deus. Os espíritos mais prejudiciais para a vida humana são os que sugerem justamente esse engano: a Presunção que engana o sujeito com a falsa noção de suas qualidades, a Idolatria que apresenta bens separados de sua origem fundamental, que é a Graça divina, a Sedução, ou Pacto com a Morte, que escraviza pela pressão da escassez de oportunidade no usufruto dos bens da vida, e sobretudo o Psiquismo que faz crer falsamente que os estados interiores da alma são gerados por consequência de fatores externos controláveis. Neste sentido, além da Humildade, da Presença, e do Louvor, de modo especial o Discernimento é um grande aliado daquele que busca a felicidade, pois revela que este estado interior é gerado pelo Espírito Santo de Deus que nos agracia independentemente dos estados externos ao nosso ser. A felicidade é uma concessão divina.
#164 Antinatalismo Finalístico: Não há criatura gerada pelo Pecado Original que não pudesse ser criada diretamente pela vontade divina em outro mundo ou dimensão análogo a esta Terra com muito maior e mais excelente perfeição. O ser humano não possui, assim, o poder de gerar mônadas, mas somente de desejar uma prole que pode ser concedida ou não pela vontade divina, vontade essa que sempre criaria estas mônadas em condições melhores e ideais. A procriação humana, portanto, não só é inconveniente pela sua utilidade, moralidade e papel evolucionário, mas também pela sua violação do ideal Transcendente onde só o Pai é um Criador de pleno direito. O argumento antinatalista mais infalível possível é, porém, ao mesmo tempo o menos empregável, pois requer a admissão da justificação da permissão divina para a procriação. Eis o argumento: na arbitragem da discricionaridade da liberdade divina de criar jamais convirá mais a proposição de que esta preferiria prescindir da sua ação direta em face de outra vontade mais falível, senão quando isto for mais produtivo no cálculo final do benefício de todos os envolvidos. Sem um ordenamento espiritual transcendente, todas as decisões a respeito da procriação são ad hoc, derivadas de qualquer visão humanista, naturalista, cacolatrista ou niilista que já não provê justificação com universalidade suficiente. Para que a crença antinatalista seja impecável na sua proposta, ela requer o contraste da decisão humana de procriar com uma vontade divina de rejeição dessa decisão. Porém, como nunca seria impossível a um Deus verdadeiro impedir a consecução dessa má vontade das criaturas, se esta é permitida, é porque convém por alguma razão tão boa que compense muito (e na verdade infinitamente) os efeitos da vontade humana. O Antinatalismo mais poderoso, assim, não é ainda o Transcendental, que já é superior aos demais (Utilitarista Marginal, Moral-Absolutista e Evolucionário), porque este ainda condena a procriação humana por esta sempre gerar um resultado pior do que o que seria derivado somente de uma vontade divina: é o Finalístico que submete-se ao império de uma Providência que se permitiu um resultado supostamente pior, momentâneo e insignificante na ordem maior das coisas, tem razões melhores do que as que justificariam a interdição e o extermínio de uma humanidade simplesmente decaída e perdida para sempre. De fato, pelas profecias, entende-se que em algum momento o Cálice da Ira irá se completar com as últimas consequências do Pecado Original, de modo que a Providência nunca deixou de governar o tempo deste mundo, e aguarda apenas que todos os giros e voltas necessárias se completem para a consumação de seu plano.
#165 Nulla persuasio, solum testimonium: Desde que a fé verdadeira é um dom divino recebido pela vontade livre, e que só esta capacidade permite a confiança amorosa na bondade da Providência de modo suficiente para a realização da causa final do paciente, ou sua Coruscância, restam vazios de valor soteriológico os procedimentos que movem antes a psique do que a vontade, de modo que a pregação que visa um bom termo nunca deve ser persuasiva, mas somente um testemunho fidedigno. A verdade não pertence ao agente que presta testemunho. A persuasão pode falhar de acordo com o juízo do paciente, que opera como um árbitro psíquico, enquanto o testemunho não pode falhar quando for verdadeiro, já que se este reflete a verdade a sua recusa constitui responsabilidade automática, e o testemunho vence à revelia do juízo do paciente. O papel de cada um é o de ser uma testemunha fiel à sua experiência e ao seu conhecimento, com a boa vontade ordenada pela Fé, mas sem a oferta impossível de garantias a respeito do Amor divino que a própria testemunha jamais poderia garantir para si. O prazer e a honra do fiel é o de ser avalista do Amor divino por seu próprio risco, de modo que não há vantagem em transmitir o testemunho sobre o Bem divino senão para que o outro seja partícipe no mesmo prazer e na mesma honra. Quem quer persuadir o outro a respeito da razão da bondade divina presta um desserviço. Como poderá tomar o gosto pelo que é Bom quem não tiver a noção de como este lhe transcende infinitamente, para além de qualquer controle ou garantia?
#166 Pecado Original: Também chamado de Pacto Primordial, ou Pacto Ouroboros, identifica a origem da série temporal que qualifica a experiência atual do homem, na sua experiência de Mistura de Luz e Trevas, ou seja, de divergência entre Percepção e Apetição das mônadas criadas sob essa condição. Sem esse mito de origem, alguma outra explicação seria necessária para manter a integridade da bondade divina que requereria apenas o mínimo grau de Mistura, o da liberdade pela ignorância sobre a essência do Amor divino, já que a experiência presente mostra claramente o fenômeno da Arbitragem do Excesso de Mistura (AEM). Se há excesso, esse foi provisionado pela Providência, mas teve de ser também atualizado pela vontade inferior das mônadas criadas. O Pecado Original explica esse fenômeno na forma de um mito. Ainda, porém, que algumas religiões possam indicar essa origem para a ação maligna sobre o mundo, com frequência incorrem no erro da atribuição de sua influência sobre fenômenos não morais, como um vício perpetuado naturalmente, por exemplo geneticamente. Isto viola a Justiça divina que jamais permitiria tal perpetuidade do mal arbitrado pelo homem sobre vítimas sem culpa, sem que isso fosse permitido para a realização da agência moral deste ser humano que decidiu arbitrar este excesso. Na Teologia chega-se ao problema de se ter que decretar, também por uma certa vontade de cultuar a Virgem Maria, que esta teria nascido sem o Pecado Original, que seria, na visão genética, a única forma do próprio Jesus Cristo nascer sem pecado ele próprio, tendo uma mãe carnal. Ora, esse dogma da Imaculada Concepção de Maria jamais precisaria ser decretado se o Pecado Original fosse reconhecido na sua essência como um ato voluntário que pode ser sempre repetido ou rejeitado por cada nova geração. Assim, mesmo que Maria tivesse nascido do pecado original, ela não teria praticado o pecado original, e isto revelaria a sua maior virtude. Como o barro da terra nua usado por Deus para produzir o primeiro corpo, de Adão, Maria foi obediente e aceitou sobre si uma vontade divina perfeita contrária ao Pecado Original. E o Espírito Santo agiu no lugar da vontade seminal do homem que costuma informar a sua vontade de trair e usurpar o Trono do Criador, o que mostra que a mulher, ainda que possa servir (e querer servir) como veículo para o Pecado Original, por ter essa potência, não é tão culpável quanto o homem cuja ação se converte em princípio ativo que realiza a traição contra Deus de fato.
#167 Simbolismo dos Elementos Primordiais: Os quatro elementos naturais clássicos são representados na mitologia do Capítulo 1 do livro do Gênesis de modo que se pode associar, simbolicamente, os seus significados com as atuações das propriedades monádicas do Criador em si e também na sua relação com as criaturas. Quando se afirma que “um sopro de Deus agitava a superfície das águas“, isto designa a relação entre o Uno e o Múltiplo no próprio ser divino: por um lado o “sopro”, ou o elemento Ar, representa o Espírito Santo enquanto Unidade do aspecto ativo e subjetivo da ação do Criador, enquanto as “águas”, ou o elemento Água como um todo, representa o que se chama de Possibilidade Universal, ou a Multiplicidade que contém todas as formas possíveis de ser. Ambos úmidos, estes elementos representam adaptabilidade ou flexibilidade. No primeiro caso, o úmido quente (Ar) de modo ativo representa a Vontade divina, que por ser perfeita é justamente chamada de Espírito Santo. Os elementos Fogo e Terra, por seu turno, são simbolizados pela criação da luz e pela “terra vazia e vaga“, respectivamente. Por serem ambos secos, representam aquilo que mantém rigidez formal no objeto da criatividade divina: o seco quente (Fogo), simbolizado pela luz, significa a atualização das formas pela ação divina de iluminação dos intelectos criados, o que pode inclusive representar as substâncias separadas (anjos); por outro lado, o seco e frio (Terra), representa as mônadas criadas que possuem seu próprio dispositivo interno e singular de atuação, mas que não podem atualizar nenhuma forma sem receber o movimento da Mônada Incriada, assim como a Lua não pode brilhar sem o Sol.
#168 Obra de Deus: Obra de Separação, ou Santificação, consiste em introduzir na condição da Mútua Representação as mônadas criadas que devem experimentar algum grau de Mistura do Bem com o Mal para que estas escolham livremente a vida na Presença e a aceitação do Amor divino, de modo que possam entrar na Coruscância. O simbolismo da obra divina pode assumir formas diversas, com ênfases diferentes em cada tipo de oposição e separação: “Luz x Trevas” significa a separação das almas com capacidade refletora boa o suficiente para que brilhe nelas a luz da bondade divina, por serem pessoas que aceitam a vida da Graça, na Presença, em contraste com as almas opacas e obscuras que rejeitam a luz da Graça e da Presença, preferindo as trevas do seu próprio ser, ou seja, o Nada; “Trigo vs. Joio” significa a separação das almas que produzem fruto, ou seja, que fazem da sua vida um testemunho da aceitação da Graça divina, por ações e palavras que anunciam o efeito da bondade de Deus em suas vidas, em contraste com as almas espiritualmente estéreis e improdutivas que convertem os benefícios obtidos em méritos próprios, ou que desdenham da Graça através da Idolatria; “Ovelhas vs. Bodes” significa a separação das almas obedientes a Deus, humildes e mansas, que aceitam tanto o cajado quanto a vara (ou seja, aceitam o caminho indicado por Deus, que é a Cruz, ou aceitam a correção da disciplina divina quando se desviam) por confiarem no Pastor, em contraste com as almas desobedientes, obstinadas e teimosas que rejeitam o caminho da Cruz, que preferem fazer a sua própria vontade na vida, que não ouvem nem o chamado e nem a disciplina do Pastor; “Inquilinos vs. Moradores” significa a separação das almas daqueles que conduzem a sua vida neste mundo como uma experiência passageira, sem desejar nem perpetuar a sua condição, e nem perder a Graça maior dos bens eternos prometidos por Deus, de modo que não se comprometem excessivamente com nenhum plano mundano e não esperam por uma felicidade mundana senão na caminhada com Deus em direção à Eternidade, em contraste com aqueles que deitam raízes e querem fazer do mundo a sua estadia final, ambicionando inclusive a perpetuação da sua condição se isto fosse possível, e fazendo grandes planos para si mesmos e para a sua descendência, senão mesmo para a Humanidade, como no messianismo que deseja criar um suposto Reino de Deus na Terra, um falso paraíso terrestre; e “Amorosos vs. Furiosos” significa a separação das almas daqueles que escolhem o amor a Deus e ao próximo com a confiança de que isto é o que os levará à máxima felicidade tanto agora quanto na Eternidade, em contraste com as almas daqueles que se obstinam com a realização das suas vontades atuais, tornando-se idólatras, inclementes, cruéis, obcecados, caçadores e construtores, e finalmente frustrados por nunca poder conquistar o suficiente e nunca alcançar uma felicidade verdadeira porque, como está escrito no Eclesiastes, “o que está faltando não se pode contar”.
#169 Idealismo Transcendental: Ao contrário dos idealismos imanentistas ligados à idolatria humanista do passado ou do futuro, o Idealismo Transcendental busca enxergar a potência divina que transcende toda a Criação, isto é, tanto a Natureza quanto o Homem. Não se deve confundir a limitação do intelecto humano com supostos limites na criatividade divina. A bondade de Deus deve ser capaz de superar sempre as melhores expectativas da nossa estimativa, assim como o poder divino. Só limitado ao impossível, o poder divino possui capacidades que são inexplicáveis e incompreensíveis ao intelecto humano. Sobretudo o ser humano não deve errar na medição do maior pelo menor, especialmente quando a razão entre essas duas grandezas é incomensurável, por se tratar da relação entre o Infinito e o finito. A Natureza e mesmo o Homem são somente sinais, como amostras, do poder divino. Devem servir para glorificar o Criador, e não para estimar limites absurdos à Sua infinitude.
#170 Pacto Sadomasoquista, ou Sistema da Besta : Pacto social de distribuição das tarefas entre sádicos e masoquistas, a minoria dos primeiros competindo pela ocupação das posições de Poder no Sistema da Besta, e a maioria dos segundos aceitando a submissão aos primeiros em troca de ordem social e algumas garantias. No Sistema da Besta as castas superiores, dos sádicos, por serem malevolentes, comandam a sociedade como as peças de hierarquia mais alta num Xadrez do Diabo: Torres administram riquezas econômicas e financeiras; Cavalos administram os governos, os sistemas políticos, de legislação, justiça, exércitos e polícia; Bispos administram a cultura, o sistema educacional, as religiões, a grande mídia, o show business, etc.; Rainhas representam o poder mundano na função de celebridades e influenciadores que são idolatrados pelas massas e que servem de bodes expiatórios quando é necessário reestabelecer a confiança no Sistema com uma representação teatral no lugar da Justiça; e os Reis possuem o poder centralizado sobre todas as outras funções no Sistema, através de pactos com entidades demoníacas por diversos meios, mantendo-se secreta ou discretamente nos bastidores, compartimentalizando funções e informações, e se aproveitando da máxima de que “o segredo do poder é o poder do segredo”. Já as castas inferiores, dos masoquistas, equivalem aos Peões no Xadrez do Diabo: sua função, como escravos análogos aos animais, é de: trabalhar e gerar produto econômico para as Torres; pagar impostos, participar de eleições e servir nas guerras para os Cavalos; legitimar a autoridade cultural do Bispo como representante da verdade institucional; idolatrar e se submeter ao prestígio da Rainha; e principalmente deve reproduzir novos descendentes para manter e perpetuar a estrutura de poder do Rei. O livre é aquele que ama o bem, que escolhe viver pela Graça. O escravo é aquele que rejeita o Amor e que se submete à Maldição (no que tende à Rejeição do Limite) ou ao Poder (no que tende à Legitimação da Mistura). Essa é a Dialética da Escravidão: de um lado escravos da Maldição que rejeitam a Graça e trocam sua liberdade por migalhas no Sistema da Besta, e de outro lado escravos do Poder que também rejeitam a Graça e trocam sua liberdade por uma falsa ilusão de felicidade sem a paz de Deus.
#171 Pseudoeuergesia: Falsa beneficência, metodologia luciferiana-adâmica