Considerando que a brevidade do testemunho é um ato de caridade em favor daqueles que realmente podem se beneficiar do mesmo pelo seu sentido, dispensada a curiosidade frívola e o capricho da discussão;
Considerando que nada deve ser multiplicado para além da necessidade, e que a explicação mais simples tende a ser a mais verdadeira;
Considerando que a explicação de um princípio absoluto deveria submeter-se sempre ao império do mesmo, de modo que a apresentação da Monadofilia deveria ser simples como o seu objeto e dirigir-se ao uso do dom de Soberania da parte de qualquer audiência, evitando a multiplicação das razões que satisfazem o espírito gnóstico;
Considerando as reiteradas experiências de frustração com a necessidade de inúmeras ressalvas na apresentação dos estudos das passagens bíblicas e das idéias filosóficas de terceiros;
Considerando a baixa capacidade de retenção do público em geral, que só tende a diminuir mais com o passar do tempo, e que torna mais benéficas as repetições de súmulas, ao invés da produção de extensões e aprofundamentos que somente poucos conseguem acompanhar;
Considerando que a busca da amizade com o mundo na forma de um serviço apaziguador é uma ilusão, desde que este mesmo mundo estaria pronto para condenar sumariamente, a qualquer momento, e com grandes prejuízos, sem clemência alguma, o testemunho que realmente importa de liberdade contra a sua mentira;
Decido formular a presente SÚMULA MONADOFÍLICA, como testemunho da melhor hipótese da minha reflexão filosófica, sujeita à quaisquer revisões futuras que se fizerem necessárias, nos seguintes termos:
PRIMEIRO, a Mônada indeterminada é a forma do ser indiferenciado, e é definida como a Substância Simples, sem partes. As qualidades da Mônada, indiscerníveis da sua essência, são o Intelecto e a Vontade, que atuam como potência de Percepção e Apetição. Enquanto sujeito da Percepção, a Mônada experimenta como objeto o seu próprio ser refletido, pelo que realiza a sua causa formal, e enquanto sujeito da Apetição, a Mônada se satisfaz com o objeto da sua Percepção, pelo que realiza a sua causa final.
SEGUNDO, a Mônada Incriada é a Unidade do Ser Absoluto, qualificado pela sua infinitude e realizado no seu Ser de forma plena, de modo que não há diferença ou distância entre potência e atualidade em si, seja na Percepção ou na Apetição. Essa realidade pode ser compreendida como a Glória divina. Não existe, até onde alcança o nosso conhecimento presente, uma revelação mais plena da essência da Mônada Incriada do que aquela realizada por Jesus Cristo, o Filho de Deus, cujo testemunho declarou a plenitude e perfeição do Deus Uno e Trino por perceber e ser percebido em si mesmo, e por amar e ser amado em si mesmo, prescindindo totalmente de qualquer manifestação exterior à sua atualidade. Na Mônada Incriada o sujeito e o objeto do Intelecto e da Vontade se identificam e se realizam eternamente, de modo que todo ato criativo é perfeito por ser puramente gratuito e amoroso, totalmente analógico, posterior e externo à eterna satisfação que a Mônada Incriada possui em si mesma.
TERCEIRO, a mônada criada, embora exista como singularidade indeterminada enquanto substância simples, possui, em imagem e semelhança com a Mônada Incriada que lhe produziu, Intelecto e Vontade limitados, e as respectivas potências de Percepção e Apetição igualmente determinadas pela sua forma substancial limitada. Por si, ela não tem nenhuma luminosidade própria, isto é, nenhum poder de Percepção per se, mas apenas potência como reflexividade, isto é, a capacidade de receber a parte que lhe cabe, determinada por sua forma, daquela Glória total da Mônada Incriada. Por nunca possuir a plenitude da Percepção, e portanto também não possuir nunca a satisfação total da Apetição, a causa final da mônada criada se realiza no movimento de uma Percepção para a próxima, no sentido da satisfação da Apetição que deseja explorar a sua parte correspondente da Glória divina.
QUARTO, a qualidade da Percepção da mônada criada é definida pelos atributos de Nitidez e Cristalinidade, a primeira correspondendo ao grau de perfeição do objeto da Percepção, e a segunda correspondendo ao grau de perfeição do sujeito da Percepção. A perfeição da mônada criada é a realização da sua causa final enquanto satisfação da Apetição na sua forma limitada de ser, o que requer a capacidade de movimento sem fim entre as Percepções informadas pela Apetição, e a qualidade máxima das mesmas, ou seja, e melhor Nitidez combinada com a melhor Cristalinidade. Esse movimento sem fim, que também se entende como a “Vida Eterna”, se caracteriza pela imediata disposição dos objetos da Percepção de acordo com a Apetição da mônada, em perfeita Nitidez, bem como pela infalibilidade do sujeito enquanto capaz de perceber sem defeitos e com o melhor ânimo, em perfeita Cristalinidade, sem erro ou defeito. Isto se dá pela Comunhão com o Espírito Santo, isto é, pela participação na perfeição da subjetividade da Mônada Incriada. Também chamamos esse estado paradisíaco de Coruscância, isto é, a plena recepção da Luz divina no limite da forma da mônada criada, refletida tanto no objeto quanto no sujeito da Percepção (Metareflexividade).
QUINTO, como a singularidade indeterminada da mônada criada se realiza pelo arbítrio de sua vontade livre, é preciso que mesmo a Coruscância seja escolhida voluntariamente. Porém, o estado paradisíaco se define como perfeito, isto é, plenamente realizado e sem defeito ou falta de qualquer espécie no limite de suas possibilidades. Ora, uma mônada criada que recebesse imediatamente, num ato contínuo à sua geração, a plenitude paradisíaca da Coruscância, não poderia realizar a sua liberdade de escolha por esse estado, já que nenhuma alternativa lhe seria oferecida concomitantemente, e nem lhe seria concebível por si mesma. Isto quer dizer que, criada na perfeição da Coruscância, uma mônada não teria jamais experimentado a sua própria liberdade por esse estado, ou seja, não estaria plenamente realizada e, portanto, não estaria num estado perfeito, ou paradisíaco. A criação imediata da mônada no estado de Coruscância é, assim, impossível por definição.
SEXTO, para que realize a sua causa final, que é a experiência da vida (o movimento, motivado pela Apetição, entre Percepções diversas) na condição da Coruscância, a mônada criada precisa experimentar alguma Percepção anterior à paradisíaca, isto é, precisa testemunhar algum nível de mistura entre o que é bom e o que não é, isto é, entre aquilo que satisfaz a sua Apetição e aquilo que frustra (inclusive e especialmente enquanto Apercepção, ou conteúdo de consciência, ou seja, nas possibilidades de conhecimento da verdade, bem como de ignorância), de modo que possa optar, no âmbito dessa sua experiência, em virtude da sua ignorância constitutiva, entre a confiança no desejo do Bem que transcende esta condição inicial, ou a desconfiança. É necessário que a mônada criada deliberadamente deseje a Coruscância sem a garantia da sua satisfação que adviria do conhecimento da experiência prévia desse estado. Esse desejo pode ser formado pela autoconsciência reflexiva que reconhece o Sumo Bem como a forma do ser (Teleologia Metaracional do Sumo Bem – TMSB), e o Amor divino como única solução para a condição de qualquer criatura, ou “salvação”. A medida que cada mônada requer, individualmente, de mistura entre bem e mal, ou entre Luz e Trevas, é previamente conhecida pela Onisciência divina que arbitra, providencialmente, a combinação ótima de circunstâncias que permite a cada criatura experimentar o mínimo possível daquilo que não lhe convém. Esse nível mínimo de experiência de mistura também pode ser chamado de Cruz, ou Razão Singular de Mistura Mínima (RSMM). Apesar dessa noção exata da medida, Deus também já sabe que as criaturas experimentarão latitudes diferentes em relação às suas RSMMs, o que é permitido no limite do interesse da produção do maior bem possível. Considerada a necessidade do autoconhecimento, da parte de cada mônada criada, a partir da experiência da sua própria liberdade, para que o limite do engano permita o reconhecimento da única salvação na Coruscância que só a Mônada Incriada pode prover, a realidade do mal é temporariamente permitida em virtude da excelência do estado paradisíaco para o maior número de mônadas possível. Essa justificação do mal pela necessidade da experiência da liberdade para que o Amor seja enfim escolhido se chama Eleuteriodiceia.
SÉTIMO, não podendo conhecer aquilo que se conhecesse lhe retiraria a plenitude da liberdade da escolha, isto é, a plenitude do Bem na forma da Coruscância, a mônada criada realiza a sua causa final ao escolher, por confiança sem garantias, esse destino de perfeição como provimento previamente determinado pelo Amor divino. O desejo do Bem é o Amor, que parte gratuitamente da sua fonte divina na atividade criativa e totalmente livre da Mônada Incriada, com o intuito da multiplicação da experiência do reflexo de sua Glória, e volta também gratuitamente do seu destino que é o arbítrio da mônada criada, quando se realiza a decisão de confiar no Amor divino. O amor à Deus, que é o Primeiro Mandamento cristão, consiste na Justiça de reconhecer que o Criador nos amou primeiro, e que seu Amor é a nossa salvação. Essa decisão deve ser real, ou seja, um conteúdo da vida espiritual, ou interior, que repercute nas ações humanas, não consistindo em nenhum sinal ou aparência que ateste a escolha para qualquer outra mônada além de Deus. Somente a Mônada Incriada possui o juízo da qualidade real da decisão de cada criatura até o último momento em que alguma deliberação pode ser produzida com efeito.
OITAVO, além das realidades interiores que atestam a integridade do amor da mônada criada na sua relação direta com o Criador (v. nono termo), é preciso que a escolha pelo Bem seja real também na experiência da relação que as mônadas criadas possuem entre si, já que a eminente presença do outro como imagem e semelhança da Mônada Incriada permite o mais completo autoconhecimento e autodomínio, bem como o juízo da falta dos mesmos. O amor ao próximo, que é o Segundo Mandamento cristão, consiste na Justiça de reconhecer o outro como criatura igualmente carente e destinada à perfeição da Coruscância, provisoriamente condicionada pela experiência da sua RSMM. Como as mônadas são “sem janelas”, isto é, só percebem o reflexo de si mesmas, evidentemente o outro, bem como qualquer substância ou predicado de tudo o que se considera exterior ao próprio Intelecto (inclusive o corpo), só pode ser compreendido como uma manifestação da representação da própria unidade do sujeito percipiente, porém isto não constitui engano ou ilusão no sentido moral das relações, como numa Simulação, já que a Mônada Incriada atualiza as manifestações recíprocas entre as mônadas para cada uma delas, assim como de todo o Universo percebido como o mesmo, de suas relações causais, etc. (Mútua Representação).
NONO, para a bem sucedida consecução da vida espiritual da mônada criada, convém à mesma que se digne a receber todos os dons concedidos pela Mônada Incriada para essa finalidade, entre os quais se incluem, mas não somente, os dons de: Humildade na admissão de sua própria maldade, fraqueza e ignorância, na esperança de salvação pela ação da bondade, força e sabedoria divinas, contra o espírito de Presunção de salvação por sua própria conta; Presença no reconhecimento da experiência da vida exclusivamente diante do Criador, contra o espírito de Idolatria que atribui substância ao que não convém, especialmente na forma das idolatrias do Caos e do Nada, do Naturalismo, e dos Humanismos antropocentristas nos idealismos imanentistas do passado e do futuro; Louvor para confiar na preservação do prazer da experiência da Beleza divina na Eternidade, contra o espírito de Sedução ou Pacto com a Morte que gera o impulso fracassado de domínio de um bem contingente e passageiro; Paixão na aceitação dos sofrimentos passageiros em virtude da permissão da Providência divina, contra o espírito de Terror ou Pacto com o Inferno que toma o mal como permanente ou fatal; Soberania no arbítrio sobre as crenças contra o espírito de Gnosticismo que cria a falsa alienação da responsabilidade pessoal pela produção da aparência da imagem da verdade; Vigilância para não tomar a condição provisória da experiência da Mistura como benéfica, contra o espírito de Ingenuidade que legitima todo tipo de engano, como entende-se na denúncia do Pacto Ouroboros, da Dialética Gnóstica, e da atuação de forma geral do Acusador que já foi revelado por Jesus Cristo na sua verdadeira natureza de mentiroso e assassino; e o Discernimento para identificar a essência espiritual dos processos anímicos pela sua origem e finalidade, contra o espírito de Psiquismo que camufla a origem espiritual das experiências sob o manto da causalidade natural que a psique humana anseia dominar.
DÉCIMO, sendo o Amor reconhecido como o caminho da Salvação, Santificação, ou Separação da Mistura (de Luz e Trevas, Trigo e Joio, Ovelhas e Bodes, Inquilinos e Moradores, e Amorosos e Furiosos), e sendo a Substância Simples a verdadeira realidade que fundamenta todo tipo de manifestação, entendemos que a Monadofilia é a melhor filosofia cristã, isto é, a sabedoria do amor pela substância simples. A experiência dessa sabedoria se inicia pela Monadofilia Primeira, através do amor-próprio que é a busca do bem para si mesmo na medida correta (sem injustiça), que é a primeira conveniência gerada pela aceitação da forma substancial tal como criada por Deus. Isto permite, então, o reconhecimento da conveniência da Monadofilia Maior, que é o Primeiro Mandamento, o amor pela Mônada Incriada, desde que o bem que a mônada criada deseja para si mesma não pode ser produzido per se, mas carece da completude que só o Criador pode conceder por participação em sua Glória. E então se permite o reconhecimento da Monadofilia Menor, que é a conveniência do amor pelas outras mônadas criadas enquanto capazes da mesma felicidade de participação na Glória divina. Sendo o amor o desejo que o amante tem pelo bem do amado, e sendo a substância simples caracterizada por sua singularidade indeterminada, a Monadofilia, que é o desejo do bem da substância simples, requer eminentemente que a sua liberdade seja preservada e realizada. Isto significa, para si própria, que a mônada criada aceita o seu limite como a forma do seu bem próprio, ou seja, ama a liberdade de realizar-se no seu limite, e ama seu próprio limite como razão da sua felicidade; significa, para a Mônada Incriada, o aceite do arbítrio divino que produz providencialmente todas as condições necessárias para a mais direta realização da salvação, santificação ou separação, isto é, ama a liberdade divina de criação e governo de todas as coisas; e significa, para as demais mônadas criadas, o aceite do seu próprio arbítrio permitido para o autoconhecimento e autodomínio, como amor pela sua liberdade de se autodeterminar diante do Criador. As ações que correspondem melhor ao entendimento do sentido da Monadofilia são as de: a) esperar o bem próprio com sinceridade, sem mentiras; b) refletir, se aprofundar e testemunhar a partir dos dons espirituais (v. nono termo); e c) o hábito do realismo responsável na obediência aos deveres de estado, no cumprimento de votos, da prática do perdão generalizado e irrestrito, e do testemunho da salvação pelo Amor divino, que é a Boa Notícia (ou Evangelho).
Era o que me cabia formular em testemunho.
Aos 21 de Novembro do Ano de Nosso Senhor de 2024.
RODRIGO SEVILHA