
Talvez só nas expressões de estilo espiritual que entramos nas Sagradas Escrituras possamos ter uma referência mais aproximada da justiça que Deus merece na referência ao seu Ser, embora ainda assim essa aproximação requer sempre a noção da sua limitação diante da absoluta transcendência do seu objeto.
O que Kant não diz, mas que podemos sem tanta dificuldade entender a partir do que ele observou, é que Deus só pode ser objeto de contemplação, ou de adoração.
O limite da Razão é o entendimento da Unidade da Substância Simples, cuja qualidade é a indeterminação da sua singularidade capaz de produzir representações fenomênicas ilimitadamente.
Mas o que é, em si mesma, a Unidade?
Aí “tudo afunda aqui sob nós”, como diz Kant. Mas isso só porque a Razão é muito pesada para essa jornada. A Razão, como propriedade operativa, sendo produzida pela Apercepção, não consegue subir ao nível que exige uma leveza de que não é capaz. Isto não quer dizer que o Intelecto por si, na sua pureza, não consiga. A Percepção como intuição pura, antes de qualquer reflexão, é capaz de seguir junto com a Apetição, produzida pela Vontade, até elevadas altitudes espirituais, pois ainda que o Sumo Bem nunca possa ser dominado pelos atributos gnósticos do nosso Intelecto, ele nunca pode ser negado como a forma essencial de todo ser possível.
A solução, portanto, é a de aceitar a leveza do chamado divino à sua pureza como condição da proximidade com a sua essência, isto é, o abandono de qualquer forma de Gnose, ou de vontade de poder.
O sublime em Deus repele, como um intransponível fogo sagrado, todo desejo de disputa com a sua absoluta majestade: por sua essência, Deus só pode ser amado, pois nenhum outro tipo de desejo senão o amoroso, possui o grau de pureza e de leveza que é digno de se aproximar da Glória do Altíssimo.
O “segredo”, se é que se pode dizer assim, para a nossa aquisição da correta disposição diante de Deus, é o de aprender aquela lição do Apóstolo João, a de que nisto consiste o Amor: em que não fomos nós que amamos a Deus, mas que foi Ele quem nos amou primeiro.
Quando entendemos, finalmente, que a felicidade que tanto procuramos é o Amor que Deus já tem por nós, daí podemos desarmar o nosso orgulho e nos render finalmente à alegria da Humildade, esse traje de leveza que nos permite amar livremente.