O tema deste diálogo é o juízo a respeito do que é a Religiosidade, uma investigação motivada pela justificação da condenação do que é considerado irreligioso (anosíoy) ou impiedoso (asebés).
Tudo começa quando Sócrates encontra, às portas do tribunal, Eutífron, e questiona o que este estava fazendo lá. Seu interlocutor responde que está processando seu pai pelo assassinato de um assassino de um servo dele. Defende que esta é uma ação religiosa, ou piedosa, e isto vai gerar então todo o questionamento de Sócrates a respeito do que é a Religiosidade.
O breve diálogo não tem solução, porque Eutífron volta por um caminho que já havia sido descartado antes (de que religioso é o que agrada aos deuses), e enfim afirma não ter mais tempo para tratar deste tema com Sócrates, que sai frustrado.
Mas nós mesmos não deixamos de lucrar alguma coisa quando Sócrates, no meio de seu trabalho, nos revela, por acidente, o que é a absurdidade da Religiosidade, ao menos de acordo com a mentalidade humana típica: um comércio entre homens e deuses.
Vejamos a citação:

Ora, a idéia desse escambo entre homens e deuses só pode ser absurda, pois nega a transcendência destes sobre aqueles, que é a premissa da sua diferença ontológica. Não obstante, é assim que o homem age, incapaz de reconhecer que a única relação pura que é digna da verdadeira divindade é justamente aquela que Sócrates questionou: a devoção amorosa ao poder divino de doar todas as coisas boas, sem nada precisar obter de nós.
Está implicitamente denunciado, assim, no Eutífron de Platão, a absurdidade da religiosidade em geral, na sua indignidade incompatível com a excelência da verdadeira santidade divina.
O homem colocou demônios no lugar do Deus verdadeiro, e com estes aprendeu a fazer o seu comércio justamente porque não pôde ser humilde o suficiente para se render à dependência de um Amor fora de seu controle.
Essa é a origem da Religião do Homem, da Tradição Primordial, do Culto do Ouroboros: a traição dos usurpadores contra a Graça divina.
Platão pode não ter dito tudo isso, mas também não desdisse, e nem nos recusou a oportunidade dessa reflexão. Que Sócrates estivesse prestes a desvendar isto a caminho da sua própria defesa num processo por impiedade (a rejeição dos deuses da cidade), é algo no mínimo simbólico.
Nota espiritual: 5,3 (Calaquendi)
| Humildade/Presunção | 5 |
| Presença/Idolatria | 5 |
| Louvor/Sedução-Pacto com a Morte | 5 |
| Paixão/Terror-Pacto com o Inferno | 5 |
| Soberania/Gnosticismo | 6 |
| Vigilância/Ingenuidade | 6 |
| Discernimento/Psiquismo | 5 |
| Nota final | 5,3 |