Político, livro por PLATÃO

Gasta-se um tempo razoável na tentativa de definir o escopo da arte da realeza, ou o papel do político, através de diversas divisões e subdivisões mais ou menos enfadonhas. Aprecio, no entanto, a desmoralização do ser humano, mesmo que acidental, quando este é comparado ao gado. Existem dois tipos de antropologia: a naturalista e a idealista. A antropologia naturalista, embora perca toda a dimensão espiritual, possui aquele realismo que qualifica o ser humano médio mais apropriadamente, na sua escolha habitual, ou seja, no seu comportamento mais animalesco do que racional. Isso nunca é o que nós queremos, mas não é a nossa realidade a maior parte das vezes?

Eventualmente o Político de Platão escapa desse exercício lógico de categorização e entra na mais substancial parte da discussão de uma metafísica que explique a condição humana. Antes de entrarmos na especificidade desses mitos, porém, convém-nos observar uma referência interessante sobre uma era anterior à do reinado de Zeus, aquela do período tido como áureo, de seu pai Cronos:

Lembro-me de que certa vez respondi a questão sobre como seria a geração humana antes da Queda de Gênesis 3, e que cheguei a aventar exatamente esta possibilidade aqui mencionada por Platão. Também quando expliquei das quatro possíveis interpretações do mandamento “crescei e multiplicai-vos” (a natural, a preternatural, a irônica e a espiritual), mencionei esta hipótese de geração ex nihilo, ou “do pó”, como um ordenamento direto de materiais caóticos sem a intervenção de um processo natural, na explicação da interpretação preternaturalista. Que tudo isso pareça absurdo para a mentalidade de hoje em dia só nos prova que o ser humano médio atual já está totalmente escravizado pela sua cultura de cativeiro, pela idolatria naturalista, humanista, etc. Que inclusive e especialmente os nossos assim chamados “céticos” não tenham a liberdade de conceber as coisas de forma diversa, é só um motivo a mais para que sintamos vergonha de que esse ser seja chamado de inteligente, pois justamente se entende como mais esclarecido ou iluminado quanto menos possibilidades é capaz de considerar para o Ser em geral, o que seria uma marca da falta de inteligência e não o contrário. Como pode se considerar mais inteligente um intelecto que busca considerar menos possibilidades de ser? É uma proeza da nossa raça, e que só a torna mais odiosa.

Seja como for, Platão avança na consideração de uma cosmogonia gnóstica, onde a interferência de um artífice do universo (demiourgoû) altera a disposição originária dos elementos e gera uma nova realidade.

Ainda que Platão dê espaço para essa mitologia gnóstica, é notável que a pergunta sobre a origem perdida dessa condição humana é muito legítima, principalmente a consideração de um evento primordial que as diversas Tradições (inclusive a Gnose) passaram a ocultar, ou a modificar no seu sentido original. De qualquer modo a busca de um evento originário que teria sido a causa universal de toda a condição humana é uma idéia espiritualmente frutuosa, porque reconhece a interferência de algum fator numa ordem original, de modo que esta natureza que está aí não pode ser considerada divina, nem na sua essência, nem no seu sentido, como presume a doutrina da Lei Natural dos Tradicionalistas. Essa é a a parcela de razão dos gnósticos. Por outro lado, estes se equivocam na sua desconfiança maliciosa da bondade da divindade criadora, e da própria bondade do Ser. É difícil escapar da Dialética do Ouroboros. Somente um espírito livre, armado de uma mente treinada, é capaz de fazê-lo, e somente pela misericordiosa ação da Graça divina, pois de onde viria a liberdade e a inteligência senão de um dom divino?

Mas Platão não deixa de nos favorecer nos seus relatos registrados no Político. Embora tendencioso numa certa direção não conveniente, seu testemunho mostra como os antigos gregos possuíam uma certa noção do valor de uma era anterior à Queda. Estamos tão acostumados com o triunfalismo típico da mitologia bíblica, que nos esquecemos da importância daquele paraíso perdido do Éden. O filósofo nos recorda:

Há muito nesse pensamento que me faz lembrar o espírito do Eclesiastes. Diante da maior felicidade possível, é fácil observar como nossa condição atual é lamentável, e mais ainda é desprezível a vaidade e mesquinhez humana que tenta tornar a administração dessa miséria algo valoroso e nobre.

Platão se refere à essa precariedade como a um problema a ser vencido pela humanidade com o concurso dos “deuses”. É praticamente uma repetição da interpretação tradicional dos eventos de Gênesis 3 e 4:

E novamente vemos a omissão da hipótese da traição e da usurpação. Os deuses são os heróis e salvadores da humanidade, Zeus, Prometeu, etc., como se o processo da Queda da condição anterior não tivesse sido produzido por uma deliberação sábia e benéfica do verdadeiro megístoi daímoni (a “divindade suprema”) que governa acima de Zeus, de Cronos, e do próprio Céu, o Ser superuraniano.

A afirmação de que “faltou o cuidado dos deuses aos seres humanos” é tão gnóstica quanto esta outra que diz que “estes foram obrigados a dirigir suas próprias vidas e cuidar de si mesmos”. Quem foi que disse que o perecimento de uma raça perversa não seria um tipo de cuidado, e talvez o único restante de uma série de opções, para ver se esse ser finalmente se arrepende de sua Pretensão? E como alguém pode se arrepender de um mal se não experimentar as consequências de sua escolha? Como seria justo o governo divino que, poupando a injustiça, impedisse os governados de entender o sentido de sua escolha? Platão não se coloca essas possibilidades.

Na sequência o filósofo expõe a idéia do idealismo político como a arte do governo voluntário, em oposição ao governo compulsório dos tiranos. Mas sua exposição não é linear, porque ele então interrompe a lógica do argumento para fazer algumas considerações científicas laterais. Sempre à procura da certeza contra a opinião, Platão nos cansa. O mesmo se pode afirmar do seu idealismo político. O ser humano que vive munido apenas de certezas pode ser encontrado no mesmo lugar que o ser humano que é governado por sua total adesão voluntária à bondade das leis de seu Estado: em lugar nenhum da face da Terra.

O idealismo platônico é como esses gigantes falhados, esses planetas gasosos que têm muita massa, mas não chegam a virar estrelas, porque essa grande massa não é suficiente para causar a explosão.

É claro que o problema do vai e vem dessas argumentações sem fim não passaria despercebido ao próprio filósofo, sendo ele tão inteligente. Nada econômico com o tempo alheio, Platão se justifica:

Poderíamos ignorar essa declaração, mas como diz o ditado, quem fala o que quer ouve o que não quer. Platão afirma que essa extensão não é prolixidade porque pode tornar as pessoas “melhores debatedoras”, e “mais ágeis na tarefa de descobrir como exibir as coisas que são via discurso racional”. Mas que evidência temos de que estas coisas são possíveis, que são boas, etc.? Não temos nada além da boa intenção filosófica. Simplesmente temos que acreditar nela, como quem confia num vendedor de carros usados que só tem isso a nos oferecer: suas palavras. Os outros gostam de coisas menos nobres, mas não o Filósofo. Quem é este? Onde pode ser achado? Eu falo e escrevo porque gosto de fazer isso. E ouço e leio pela mesma razão. Essas coisas devem ser boas por si mesmas, e buscadas gratuitamente, como dons puros. Porque se não forem, onde está a nossa vantagem? É óbvio que Platão e os demais discípulos de Sócrates gostavam de produzir e de apreciar discursos bem feitos. Mas eles não podem admitir a simplicidade disso, do seu gosto. Afinal, esse seu gosto os aproximaria perigosamente daqueles malditos publicanos, os sofistas. Então Platão precisa disfarçar o seu prazer na produção de discursos com a aparência de uma cientificidade. A história provará a sua mentira, quando a brevidade e a simplicidade se mostrarem mais adequadas tanto à busca quanto à expressão da verdade, embora até hoje há quem se confunda com isso, provavelmente com medo de admitir seus prazeres.

Finalmente, à certa altura o Político começa a tratar das formas de governo classificadas entre o de um, de poucos, ou de muitos. Não há ingenuidade no idealismo político de Platão, que tem as suas provisões para a falha humana nas hipóteses da tirania, da oligarquia e da democracia, mas quando este idealismo se torna imanentista perde-se a noção da realidade humana da vida na condição da Mistura. Isto é: este idealismo serviria mais se reconhecesse que apenas Deus pode governar com Justiça.

Já em outra parte muito valiosa, será enfatizada a transcendência da singularidade com relação à formalidade das Leis. Há necessidade de uma legislação que seja a mesma para toda uma coletividade, contando que por regra tenda a trazer maior benefício à maioria, mas sem que constitua uma perfeição que teria que abarcar indefinidamente a particularidade do singular, o que seria impossível por definição. Isto é excelente. Mostra a precariedade da autocracia dos governos humanos. Assim como a Lei Natural não determina o que é o Justo e o que é o Verdadeiro, também não o faz a Lei dos Homens. A Verdade e a Justiça transcendem infinitamente a Natureza e o Homem. Platão o reconhece:

Dito isso, é claro que a arte de governar e de legislar, exigindo, dentro do que é humanamente possível, um conhecimento excelente daquilo que é justo, não pode ser posse de uma maioria. Por isso a democracia é comparável à tirania e à oligarquia. Porém, bem entendidas as coisas, o melhor governo possível só pode ser o de Deus. A Política deve encontrar a Teologia, como o profeta Samuel alertou o povo de Israel: o Senhor é o vosso Rei. Como a realidade humana é condicionada por uma desobediência ancestral e constitutiva que dá a forma da organização das questões públicas, há que se ter governantes, uma legislação, etc. E a forma de governo mais distante da ideal, isto é, a democracia em oposição à monarquia do melhor Rei, é a melhor disposição política possível dada a condição decadencial da humanidade, de modo que a injustiça seja limitada através da limitação do poder.

Isto é o que Platão conclui por enquanto, mas nós sabemos melhor: a democracia é um sistema de anuência da tirania, é a legitimação da escravidão da espécie humana àqueles que fazem pacto com o governante maior deste mundo.

O Político termina por definir a arte régia como aquela que sabe entrelaçar as virtudes de autocontrole e de coragem, de modo que o governo do Estado esteja sempre pronto para lidar tanto com a paz quanto com a guerra. Assim como ocorre com outros diálogos, temos a impressão de que isto se trata de um mero esboço, e de fato Platão poderá desenvolver mais profundamente as suas idéias sobre este tema mais tarde, em outras ocasiões.

Nota espiritual: 4,1 (Moriquendi)

Humildade/Presunção4
Presença/Idolatria3
Louvor/Sedução-Pacto com a Morte5
Paixão/Terror-Pacto com o Inferno5
Soberania/Gnosticismo4
Vigilância/Ingenuidade3
Discernimento/Psiquismo5
Nota final4,1

Um comentário em “Político, livro por PLATÃO

  1. How do you judge and weigh post sealing of the Talmud secondary commentators like Saadia Gaon, Ibn Ezra, and the Rambam as famous luminaries among Geonim and Reshonim Talmudic scholarship?

    The lights of Hanukkah, as a mitzva דאורייתא, separates substance from shadows. Gaonim and Reshonim scholarship which embraces Greek and Roman statute law and ancient Greek philosophies of logic, best represents the perverted tuma middot interests of the resurrected from the dead – Tzeddukim.

    Before their defeat during the Hanukkah Civil War, these רשעים encouraged Israel to abandon & forget the Oral Torah revelation at Horev, forty days after the sin of the Golden Calf; a portion of Israel attempted to translate the רוח הקודש שם השם to the word אלהים. The revelation of the Oral Torah 13 tohor middot spirits, as explained through the much later kabbala chiddush of rabbi Akiva’s פרדס logic system, the Tzeddukim, Karaites, and Goyim Xtian churches to this very day absolutely and categorically denies the revelation of the Oral Torah at Horev. Similar the Arabs states which abhor the idea that Jews have equal rights to achieve self determination in the Middle East; hence Arab enemies refer to Israel as the Zionist Entity.

    The disgraceful history of Xtian substitutional theology, long antedated by the ancient Tzeddukim equal abomination, their attempts to cause Israel to forget the Oral Torah. Hence all post Talmudic scholarship which relies heavily, or primarily upon the structure and organization of Jewish religious Law “converted” into frumkeit religious legalism categories. Turned to the re-discovered ancient Greek philosophers, which organizational logical thought, as their primary tools to interpret and understand the Torah.

    Such post Talmudic commentaries qualify as self-hating Jews within the “camp” of the Tzeddukim counter-revolutionaries, in the days of the Hashmonaim. Saadia Gaon, despite his authorship of “The Book of Beliefs and Opinions,” his repeated attempts to address the challenges from pre-נידוי Karaite Jews likewise floated. He blended Torah topics together with Greek philosophy, but failed to teach the Torah as a common law judicial legal system. Herein serves as key evidence to the contention that g’lut Jewry even by the tail end of the Gaonim scholarship had lost the wisdom to obey and observe the Torah commandments לשמה.

    Ibn Ezra throughout his Chumash commentary introduced Greek philosophical ideas. The Rambam relied upon Aristotelian logic as his main tool by which he organized halacha into Greek and Roman codes of statute law. The obtuse assimilation of the “Golden Age” Spanish rabbis, who uprooted T’NaCH & Talmudic common law, based upon the kabbala of rabbi Akiva’s פרדס logic system, in their rush to express their glee approval of the rediscovered ancient Greek philosophical works. As such these assimilated rabbis undermined Jewish legal traditions of common law, which their scholarship replaced with Greek philosophies and box thinking, rigid statute law models.

    Absurd, the notion that embracing hostile foreign cultures and customs as a key strategy to reinforce Jewish identity and intellectual resilience. These assimilated Jewish heretics served as the forerunners of the Reform abomination of the early 19th Century. The contributions of Saadia Gaon, Ibn Ezra, and Rambam, while viewed critically in this context, without any doubt part of broader context of Jewish attempts to address the challenges faced by g’lut Jewish communities, such as the collapse of the Roman road network.

    This assimilation took Orthodox Jews off the path, just as did secularism did and does to post American and French revolution Jewry today. Saadia Gaon addressed the sudden rediscovery of the four Centuries concealed, ancient Greek writings, entombed by Xtian church fathers.

    Rambam, like his Tzeddukim forefathers, sought to impose a sort of Greek polis city state(s) upon Jews through his statute law “ghetto halachic walls”. Through systematic order & classification of Talmudic subjects into easily assessable standardized religious judicial common law courts.,

    The Rambam caused Jews to forget the Oral Torah revelation at Horev of משנה תורה common law. The revelation of the Torah at Sinai, contained amazingly within the first two Sinai commandments. Only after the revelation of Oral Torah common law did Israel receive the rest of the Torah. The famous 10 Commandments serves as a precedent to remember the 10 plagues of Egypt wherein HaShem judged the Gods of Par’o, according to Moshe’s Torah common law.

    Ibn Ezra’s son converted to Islam. His Chumash commentary proves that he too, just like his fellow Spanish peer, made a deep assimilated study of ancient Greek philosophical thought. Torah common law, a judicial system by which the courts make fair compensations for damages inflicted; this judicial common law shares nothing, has absolutely no common ground, with theological religious belief systems, imported from non-Jewish cultures and alien sources.

    The Torah, fundamentally a legal and ethical guide whose faith seeks judicial righteous justice within the borders of the Torah oath sworn lands, the eternal inheritance of the chosen Cohen people. Goyim reject the revelation of the Written and Oral Torah at Sinai and Horev. Hence their counterfeit wisdom lack the power to transform Goyim into the chosen Cohen people.

    Torah common law serves as the basis for a comprehensive judicial system that emphasizes justice, fairness, and compensatory lateral sanhedrin judicial rulings, as the definition of faith. The Torah’s Talmudic focus, stands solely upon precedents which shape and determine Mishnaic common law. This legal system, simply distinct from any philosophical or theological systems imported from non-Jewish cultures. Like Cohonim separated from Goyim, something like the difference between t’rumah vs. chol first fruits.

    The importance of maintaining the tohor purity of Torah-based common law, (rooted in the Oral Torah and the kabbala of Rabbi Akiva’s פרדס logic system), functions as the basis of Mishnaic and Gemara common law. This approach emphasizes the unique and self-contained nature of the Jewish legal tradition – without reliance on external philosophies, or religious false messiah beliefs.

    Hence the k’vanna of lighting the Hanukkah lights contains the dedication to never rely upon foreign cultures, customs, philosophies, or cathedral grand structures to serve as any kind replacement basis to interpret the k’vanna Will of the Written Torah Constitution of the Torah Cohen Republic.

    The k’vanna (מלך tohor middot dedications) of lighting the Hanukkah lights serves as a powerful reminder of the dedication to preserve Jewish tradition and identity. The lights symbolize the triumph of the P’rushim over the assimilated Tzeddukim רשעים who embraced Greek culture and customs. The k’vanna of lighting the Hanukkah lights serves as a powerful reminder of the dedication to preserve Jewish tradition and identity through the dedication of tohor middot as instructed through prophetic mussar (Aggada). The lights symbolize the triumph of the P’rushim over the assimilated Tzeddukim רשעים who embraced Greek culture and customs.

    The challenge of the new testament notions of Messiah represents a similar assimilationist trend that compares to the plagues in the days of Paró and Moshe. Goyim declare themselves ‘not under the Law’, yet Goyim assume they possess the lock and keys to the Oral Torah mitzva of Moshiach.

    Torah common law stands upon the foundation by which prophetic mussar defines the k’vanna of mitzvot time oriented Av commandments. Never once does the new testament forgery ever attempt to learn the prophets through Common Law precedents. Why? Statute law does not depend upon, nor does it require precedents.

    For 2000+ years g’lut Jewry has felt the cursed whip and wincing pain of Jewish assimilation and inter-marriage. Goyim cultures and customs which do not accept the revelation of the chosen Cohen people consequent to our acceptance of the Torah at Sinai and Horev. These alien cultures and logic formats have dominated the Jewish people, just as similarly have Goyim barbarians. Jews survived the furnaces of the Shoah based upon the אלהינו Name within the קריא שמע tefillah דאורייתא, which remembers the oath sworn by Yitzak at the Akadah; as the chosen Cohen son of Avraham, save my future born seed, my Olam Ha’Ba, from Shoah and I dedicate to walk in justice before you, as did my father. Hence HaShem replaced Yitzak as a korban with a ram dedication to have this k’vanna.

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