Penso que se algum tipo de preexistência fosse possível (no que aliás não acredito), eu escolheria a vida mais fácil possível em que, ao mesmo tempo, toda a dificuldade que eu tivesse que viver seria experimentada logo de uma vez no começo da vida, de modo que me bastasse aguentar a pior parte de início para daí viver um melhoramento contínuo até o momento de partir deste mundo.
Talvez essa seja a realidade dos Eunucos em geral, e aqui falo num sentido estritamente espiritual daqueles que não casam e não têm filhos por quaisquer razões imediatas e que relacionam providencialmente essa realidade ao desígnio do Amor divino.
Ou seja, Eunuco é aqui entendido como alguém que por qualquer razão não casou e não teve filhos e que decidiu relacionar esse fato com um desejo de Deus que tornou a sua vida diferenciada por esta razão especial, obedecendo àquela instrução divina que ensinou: em tudo e o tempo todo dai glória a Deus.
Ora, o cristão já é convidado por Jesus a viver sob um fardo leve, livre da taxação do diabo através da mentira das religiões que reproduzem o Culto do Ouroboros da Tradição Primordial.
O Eunuco, entre os cristãos, é assim convidado para um fardo mais leve ainda, imitando não só o próprio Filho de Deus quando este encarnou como Filho do Homem, mas também os mais excelentes entre os Profetas e Apóstolos, tornando assim a sua vida desembaraçada das várias formas de ônus carnal que obstruem a clareza de consciência e devoção da vida espiritual.
Um Eunuco, afinal, é alguém liberado da participação na perpetuação carnal do Pacto Ouroboros, que é o veículo da manutenção do poder da Antiga Serpente sobre este mundo.
Obviamente, não casar e não ter filhos não são fatos que constituem uma virtude por si mesmos, já que a participação no Pacto Ouroboros é sempre uma adesão espiritual a uma traição contra o Amor de Deus sob quaisquer formas. Já dei até, em outra oportunidade, o exemplo de um Padre ou Pastor que recomenda e celebra tanto o casamento quanto a reprodução e que assim, mesmo sendo solteiro, participa com grande profundidade no Pacto Ouroboros, atuando como o Bispo no Sistema da Besta.
Ser Eunuco não constitui virtude automática, mas facilita o caminho para quem busca o Amor de Deus, e por isso fiz alusão a um fardo mais leve ainda àqueles que decidirem viver na aceitação desse fato por motivos exclusivamente espirituais.
Temos evidências escriturais da preferência divina pela renúncia às Obras da Carne, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento.
Vejamos uma referência do AT:
“Aos Eunucos que viverem na minha Presença, que escolherem o que me é agradável e se afeiçoarem à minha Aliança, eu darei na minha casa e dentro de minhas muralhas um monumento e um nome de maior valor que filhos e filhas; eu lhes darei um nome que jamais perecerá.” (Isaías 56:4-5)
E uma do NT:
“Seus discípulos disseram-lhe: ‘Se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar!’ Respondeu Jesus: ‘Nem todos são capazes de compreender o sentido dessa palavra, mas somente aqueles a quem foi dado compreender. Porque há Eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há Eunucos tornados tais pelas mãos dos homens, e há Eunucos que a si mesmos se fizeram assim por amor ao Reino dos Céus. Quem puder compreender, compreenda.’ Foram-lhe, então, apresentadas algumas criancinhas para que pusesse as mãos sobre elas e orasse por elas. Os discípulos, porém, as afastavam. Disse-lhes Jesus: ‘Deixei vir a mim estas criancinhas e não as impeçais, porque o Reino dos Céus é para aqueles que se lhes assemelham.'” (Mateus 19:10-14)
Se eu precisasse deixar as coisas ainda mais claras depois de tudo isso, acho que não conseguiria.
O que nos importa é a clareza com tranquilidade e serenidade que se baseia na experiência humana que nós já temos das coisas do mundo e das coisas de Deus. Não é preciso muito misticismo, ao contrário do que alguns possam pensar, para concluir, com pura lógica amparada na confiança plena no Amor de Deus, que o homem cria para si todos os seus problemas, e que a nossa salvação consiste na renúncia às nossas mentiras e à uma entrega total ao amparo do Pai.
Ser Eunuco não garante nada, mas facilita certamente, e quem se viu nesta condição pelo império de forças maiores pode ter mais confiança ainda de que isto se dá por um recurso extraordinário da Misericórdia divina.